Vladimir Putin estará neste domingo (15) no encerramento da Copa do Mundo, realizada pela primeira vez em seu país. Mas a verdadeira final para a qual se prepara ocorrerá no dia seguinte.
Em Helsinque (Finlândia), o presidente russo se encontrará com o colega americano, Donald Trump, em uma cúpula bilateral pela primeira vez.
Para Putin, é a maior oportunidade para a Rússia começar a deixar o isolamento diplomático iniciado em 2014.
Já Trump busca colher alguma concessão que permita polir sua imagem, embaçada quando olhada com atenção, de negociador —e ele tem motivos para isso: eleições legislativas nos EUA em novembro.
Está longe de ser fácil, contudo. “Não se pode esperar muito, ninguém parece disposto a fazer concessões”, diz Alexander Gabuev, do Centro Carnegie de Moscou.
O atual estágio das relações EUA-Rússia, o pior desde a Guerra Fria nas palavras do próprio Putin, decorre de uma espiral de eventos.
Após o fim da União Soviética, em 1991, a Rússia caiu em anarquia. O Ocidente aproveitou e atraiu países ex-comunistas à sua esfera de instituições, em especial a Otan, sua aliança militar.
Putin estreou na Presidência em 2000 e, com métodos autoritários, pôs ordem na casa. É criticado, mas goza de ampla popularidade. Foi reeleito para um quarto mandato com 77% em março.
Sem sucesso na relação com o Ocidente, resolveu em 2008 deter o avanço da Otan, guerreando na Geórgia em favor da minoria russa do país.
A crise econômica daquele ano debilitou os adversários, e Putin usou o ciclo de alta do preço do petróleo para modernizar suas forças —cerca de 60% delas estão no século 21.
Sob Barack Obama, os EUA tentaram isolar Putin. Quando um golpe tirou do poder o governo pró-Moscou na Ucrânia, o russo foi rápido e desestabilizou o vizinho para evitar que caísse no arcabouço institucional do Ocidente. Anexou a Crimeia, de maioria russa, e estimulou secessionistas no leste do país. Sofreu sanções e partiu para o ataque.
Interveio na guerra civil síria em 2015 e aproveitou a tibieza americana para voltar a dar cartas no Oriente Médio.
Salvou a ditadura de Bashar al-Assad, forjou uma aliança com Irã e Turquia e associou-se à Arábia Saudita para tentar controlar os preços mundiais do petróleo, que ancora suas exportações com o gás.
Quando Trump assumiu, em 2017, havia expectativa de uma détente por uma suposta simpatia mútua dos líderes —que se encontraram no G20 e se falam por telefone.
Mas as acusações de que o Kremlin ajudou a campanha do republicano, negadas por Putin e investigadas em Washington, deixaram-no de mãos amarradas.
Na sexta (13), o governo dos EUA denunciou 12 agentes de inteligência russos por invadirem computadores do Partido Democrata na campanha de Hillary Clinton à Presidência.
“Trump precisa de uma jogada ousada se quiser colher algum resultado”, sustenta George Friedman, da consultoria Geopolitical Futures. Para ele, o republicano tem vantagem porque Putin ainda é visto no exterior como um pária.
O americano pode exigir uma concessão midiática em troca de amaciar as sanções econômicas. Isso daria a Putin espaço para fazer o país crescer e trabalhar sua fraqueza, a renda dos cidadãos.
Com efeito, a proposta de reformar a Previdência, um meio de lidar com os nós fiscais russos, derrubou pela primeira vez em quatro anos sua popularidade.
O ponto é em que o russo cederia. A Crimeia está fora de cogitação. A Síria poderia entrar no jogo, se se considerar que a mídia estatal russa tem destacado a “retirada de forças” do país, embora a base estabelecida vá ficar onde está.
E o Kremlin já se disse favorável a retirar tropas estrangeiras. Pode estar falando de forças especiais americanas, mas sobretudo iranianas, cuja presença desagrada Trump.
Outro ponto em que pode haver avanço é numa eventual extensão do Novo Start, acordo que limita as armas nucleares dos dois países e expira em 2021. Putin já acenou com a extensão, embora os “falcões” do gabinete de Trump sejam contra.
O fato de os EUA terem aderido à guerra diplomática liderada pelo Reino Unido após o envenenamento de um ex-espião russo na Inglaterra também ajuda a turvar o clima.
Uma eventual reaproximação entre Washington e Moscou gera ansiedade na Europa, que percebe as movimentações nas fronteiras russas como uma ameaça.
Na semana passada, a passagem de Trump pela cúpula da Otan, onde fez críticas duras e exigências inviáveis aos aliados, causou mal-estar.
Ao fim, os entraves russo-americanos não irão sumir em um aperto de mãos, mas canais podem ser abertos.
Em termos de segurança internacional, pode ser boa notícia, independentemente de ganhos pontuais de lado a lado. Só pela realização da cúpula, Putin já sai ganhando de 1 a 0. Resta saber como Trump tentará virar o jogo.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.