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Governo Bolsonaro

Escolha de Eduardo Bolsonaro condiz com objetivos do governo brasileiro

Deputado tem credenciais políticas e boa entrada em Washington, mas precisará ouvir diplomatas

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São Paulo

​A despeito das acusações de nepotismo, a escolha do presidente Jair Bolsonaro por seu filho Eduardo para ocupar o posto de embaixador do Brasil em Washington é pertinente, consideradas as ambições do governo e como a capital americana funciona. 

Mais do que isso, pode se provar acertada se o deputado mantiver o sangue frio na nova função e se entrosar com a futura equipe, deixando conselheiros voluntaristas em segundo (ou décimo) plano.

A espera por seu 35º aniversário, que o coloca no limite mínimo de idade para o cargo, é indício de que ele sempre foi a opção do presidente.

Não haveria outro motivo para Jair Bolsonaro ter deixado um cargo crucial para sua política externa vago desde abril.

O deputado federal Eduardo Bolsonaro em Washington, em março
O deputado federal Eduardo Bolsonaro em Washington, em março - Joshua Roberts - 16.mar.19/Reuters

O posto de embaixador nos EUA é o mais importante no exterior para o Brasil, ao lado de Buenos Aires. É  natural, portanto, que ter ali alguém que não seja diplomata de carreira cause estranheza à primeira vista. Mas Bolsonaro, Donald Trump e seus respectivos governos funcionam pela lógica da disrupção.

Esperar deles apego a tradições institucionais é inócuo, e, no caso em questão, não há em princípio desrespeito a regras. Pelo contrário: os EUA são um país que gosta de dinastias (Adams, Kennedys, Clintons e Bushes são prova). E o atual presidente, que já cogitou mais de uma vez nomear a filha Ivanka embaixadora na ONU e por fim a tornou sua assessora especial ao lado do genro, aprecia mais ainda.

Além disso, é comum nos EUA a indicação de políticos para o cargo de embaixador. O que ressoaria mal na Europa será visto como reverência e prestígio na Casa Branca trumpista. Eduardo Bolsonaro, aliás, já é conhecido por lá, tendo construído pontes com e sem o pai. Poucos diplomatas poderiam se gabar disso.

Ademais, Washington é uma cidade de lobbies e troca de interesses. A principal função do embaixador brasileiro lá, além de representar o país ante a Casa Branca, é tratar com o Congresso dos EUA. 

Eduardo Bolsonaro, além de ser um deputado muito bem votado, preside a Comissão de Relações Exteriores da Câmara brasileira. Como lembrou uma diplomata brasileira de alto escalão que já serviu em Washington, são credenciais que impressionam os congressistas americanos, que enxergarão nele não só acesso rápido a decisões do governo em Brasília como também validação popular e entrada no tema. 

É algo que eliminará parte do périplo de apresentações a que ocupantes do cargo são submetidos, mesmo quando são tarimbados.

Eduardo esteve com o pai em suas principais viagens, funcionando como preposto para política externa muito mais do que o chanceler Ernesto Araújo. Até agora, se comportou de forma adequada, sem arroubos —quem o viu nesse papel não se surpreendeu com a escolha.

Isso faz com que tenha a confiança e a atenção do presidente, qualidades úteis ao posto, para além da questão de sangue. Ao contrário do irmão Carlos, ele parece entender melhor o espaço que ocupa e não causa embaraços no governo.

No Fórum Econômico de Davos, por exemplo, manteve-se próximo ao presidente e o aconselhou em diversos temas, sem contudo impor sua opinião, causar ruído de comunicação e se meter a contradizer ninguém do governo, mesmo nas vezes em que sua visão não prevaleceu.

A exceção a esse protocolo foi a vez que envergou um boné trumpista em viagem aos EUA, comportando-se como fã —e este é o maior motivo de preocupação com seu nome, que precisará ainda ser avalizada pelo Senado.

Um embaixador, antes de tudo, precisa defender os interesses de seu país, não os interesses do governo de turno apenas, muito menos os interesses do governo americano.

Entrada e trânsito em Washington são trunfos; alinhamento cego, contudo, seria um desastre.

Se tem credenciais políticas para o posto, o deputado carece ainda de credenciais de negociador. “Falar bem inglês e espanhol”, como apontou o presidente ao justificar sua decisão, não é qualificação para o cargo, é pressuposto tão óbvio como ser alfabetizado.

Por isso, ele precisará de uma equipe experiente, com ministros e conselheiros que dominem a história das relações entre os dois países, a geopolítica dos acordos internacionais, a história da região e a própria tradição da diplomacia brasileira. 

E precisará ouvir essas pessoas. Inventar um posto para o assessor especial da presidência Filipe Martins —não há cargo diplomático existente na embaixada que ele possa ocupar— é algo que criaria ruído; dar atenção às ideias de Olavo de Carvalho sobre relações internacionais também.

Terá, ainda, que ser comedido em suas ideias militaristas (o deputado já defendeu, por exemplo, uma intervenção militar na Venezuela) e conter impulsos de intervir na representação brasileira na ONU.

O sobrenome pode tê-lo ajudado a chegar ao posto, mas, uma vez no cargo, Eduardo Bolsonaro terá que ser um pouco menos Bolsonaro e um pouco mais político e diplomata. 

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