Rússia prepara teste do 'torpedo do Juízo Final' no mar do Ártico

Drone Poseidon preocupa especialistas por ser furtivo e ter suposto alto poder de destruição

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São Paulo

A Rússia se prepara para fazer o primeiro teste operacional de seu “torpedo do Juízo Final”, o drone submarino Poseidon.

A arma vem sendo desenvolvida desde 2015 e agora está em fase final de ensaios no mar, devendo ter um lançamento a partir de submarino feito entre setembro e dezembro.

Putin a bordo de um cruzador durante exercício naval no mar Negro
Putin a bordo de um cruzador durante exercício naval no mar Negro - Alexei Drujinin - 9.jan.20/Sputnik/Reuters

A informação começou a circular na imprensa russa na semana passada, e não há comentário oficial ainda do Ministério da Defesa, mas analistas dizem que ela é real.

Segundo Ivan Barabanov, especialista em sistemas navais em Moscou, o Poseidon já passou pelos testes mais críticos de seu sistema de propulsão nuclear. O cronograma não foi afetado pela pandemia do novo coronavírus, que tem na Rússia o terceiro maior foco de casos no mundo.

Na forma de um grande torpedo de 24 metros de comprimento, o Poseidon é uma das “armas invencíveis” anunciadas pelo presidente Vladimir Putin em 2018.

Ele é movido por um pequeno reator nuclear e, segundo o próprio Putin, teria alcance de 10 mil km.

A arma tem uma velocidade máxima especulada de cerca de 70 nós (130 km/h), o dobro do que submarinos nucleares desenvolvem. Poderia se deslocar mais devagar perto do alvo, para reduzir a assinatura acústica para sonares inimigos.

Mas é sua carga e modo de emprego que preocupa observadores militares. O Poseidon é desenhado para poder levar silenciosamente uma ogiva nuclear de 2 megatons, algo que poucos mísseis fazem hoje.

Mais: Barabanov e outros analistas acham que ele poderia levar inacreditáveis 100 megatons para, digamos, Nova York. Isso equivale a 100 milhões de toneladas de dinamite, ou 6.600 artefatos iguais à primeira bomba atômica usada pelos americanos contra o Japão, em Hiroshima em 1945.

A bomba mais potente já testada pelo homem foi explodida pelos soviéticos em 1961, e tinha 50 megatons.

Além da destruição em si num ataque direto, se uma detonação dessas ocorresse a alguns quilômetros da costa, geraria um tsunami que simuladores estimam com dezenas de metros de altura.

E, viajando silenciosamente debaixo d'água, a arma é de detecção e interceptação bastante mais difíceis do que um míssil convencional.

A existência do Poseidon foi conhecida no Ocidente quando o russo permitiu um vazamento proposital da imagem de um croqui da arma pelo canal de TV estatal NTV, há cinco anos.

No ano passado, foi divulgado um vídeo simplório sobre seu funcionamento, além de imagens de sua produção.

Os torpedos são tão grandes, 30 vezes maiores do que modelos pesados atuais, que precisam ser levados no dorso de enormes submarinos adaptados. Dois estão em uso, o Belgorod e o Khabarovsk.

Eles operam no mar Branco, um braço do de águas territoriais russas que deverá ser o local do teste do Poseidon, para tentar evitar espionagem.

O programa de armas de Putin foi ridicularizado como propaganda, mas aos poucos tomou forma.

Duas armas hipersônicas estão operacionais: o míssil Kinjal e o planador Avangard, que é transportado por um míssil intercontinental.

Interceptadores MiG-31 carregam mísseis hipersônicos Kinjal em desfile militar em Moscou
Interceptadores MiG-31 carregam mísseis hipersônicos Kinjal em desfile militar em Moscou - Kirill Kudriavtsev - 9.mai.2018/AFP

Ambas as armas podem carregar ogivas nucleares ou convencionais. O míssil intercontinental pesado Sarmat está em testes e, supostamente, entra em serviço em 2021.

Já o míssil de cruzeiro com propulsão nuclear Burevestnik tem uma carreira mais complicada. Após vários testes relatados na mídia especializada como fracassados, um motor dele explodiu em junho do ano passado.

A Rússia tentou esconder a informação, mas morreram cinco técnicos da agência de energia nuclear e foi detectado um pico de radiação na região do teste, a mesma onde o Poseidon será testado.

O país vem trabalhando em novas armas estratégicas desde os anos 2000, quando os EUA divulgaram seus planos para criar um escudo antimíssil na Europa.

O processo foi acelerado desde que Donald Trump chegou ao poder, em 2017. No ano seguinte, os americanos revisaram sua política de emprego da bomba atômica, na prática facilitando o uso de artefatos menos potentes.

Um deles entrou em operação neste ano, gerando a ameaça do Kremlin de que qualquer lançamento de míssil por submarino americano seria visto como o começo de uma guerra nuclear.

Paralelamente, Washington abandonou mecanismos de controle de armas. Saiu de um tratado simbólico sobre mísseis na Europa e do programa de voos mútuos de reconhecimento com a Rússia e outros países.

Trump e Putin têm até o ano que vem para negociar uma renovação do principal acordo de controle de ogivas nucleares, o Novo Start, mas o americano já deu indicações de que deverá deixá-lo caducar, elevando assim o risco de uma corrida armamentista atômica.

O americano quer que a China faça parte de novas negociações, o que é rejeitado por Pequim —a rival asiática tem 320 ogivas nucleares operacionais, ante 1.750 dos EUA e 1.572 da Rússia.

O Kremlin, por sua vez, estabelece um morde e assopra. Nas águas do Ártico, irá fazer no fim da semana um exercício militar com 30 navios e 20 aviões ao longo da costa norueguesa, uma resposta à primeira incursão de navios da Otan (aliança militar liderada pelos EUA) desde os anos 1980 no mar de Barents.

Por outro lado, querendo evidenciar que a Otan age de forma agressiva com simulações perto de suas fronteiras e voos de bombardeiros junto a seu espaço aéreo, o Estado-Maior russo informou nesta terça (2) que não fará mais exercícios perto da Europa neste ano.

O grande treinamento do ano, o Kavkaz-2020 (Cáucaso-2020) será "empurrado" para áreas mais centrais do país, na esperança de demover os ocidentais de fazerem os seus em regiões próximas ao território russo.

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