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'Surpresa de outubro' dos EUA em Taiwan e reunião no Japão preocupam China

Eventual ida de Pompeo a Taiwan após cúpula com adversários de Pequim assusta militares, diz analista

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São Paulo

Os Estados Unidos farão uma demonstração de força nesta semana contra a China que está causando preocupação nos meios diplomáticos de Pequim.

Na terça (6), o secretário de Estado e principal proponente da Guerra Fria 2.0 de Donald Trump contra os chineses, Mike Pompeo, chega a Tóquio.

Pompeo com um mapa italiano mostrando a China antiga e região, durante visita a Roma na quinta (1º)
Pompeo com um mapa italiano mostrando a China antiga e região, durante visita a Roma na quinta - Guglielmo Mangiapane - 1º.out.2020/AFP

Ele irá se reunir com os chanceleres de Japão, Austrália e Índia na mais importante reunião do chamado Quad desde sua refundação, em novembro de 2017.

Quad é abreviação inglesa de Diálogo de Segurança Quadrilateral. Basta apontar seus integrantes no mapa para entender que é uma frente anti-China, cercando todas as saídas para o mar da grande nação continental.

Eles irão discutir a integração da Austrália nos exercícios navais anuais do grupo, em novembro. Mas isso é só um dos incômodos para a ditadura comunista.

“E se ele [Pompeo] for louco e der uma parada depois em Taiwan?”, questionou o influente analista chinês Xiang Langxin, do Instituto de Estudos Internacionais e de Desenvolvimento, de Genebra.

Em um webinário da Fundação Fernando Henrique Cardoso (disponível no YouTube), na quinta (1º), ele citou a hipótese como algo que “apavora os militares chineses” devido ao momento.

A eleição americana é em novembro, e Trump está atrás de Joe Biden nas pesquisas. Analistas adoram especular sobre a “surpresa de outubro” que tradicionalmente visa influenciar o resultado do pleito.

Com o diagnóstico de infecção pelo novo coronavírus de Trump, 74, o cenário fica ainda mais nebuloso.

“A China vai morder a isca”, disse, se tal afronta diplomática, aos olhos de Pequim, acontecer. Xiang tem bastante trânsito nos meios diplomáticos e militares chineses.

Há precedentes. Desde agosto, os americanos já enviaram seu secretário de Saúde e um dos adjuntos de Pompeo à ilha que a China considera uma província rebelde.

Nas duas ocasiões, a China fez ameaças militares diretas a Taiwan, exercitando navios no estreito entre os dois territórios e enviando aviões rumo ao espaço aéreo de Taipé. Sistemas antiaéreos e caças da ilha foram acionados.

O problema para Pequim é a hipótese de Pompeo ser a mais alta autoridade a pisar na ilha desde que os EUA e a China estabeleceram relações diplomáticas, em 1979.

A partir daquele ano, os EUA pararam de reconhecer Taiwan como independente de direito, mas mantêm a relação de fato e são o principal parceiro militar da ilha.

Para Xiang, uma reação das Forças Armadas chinesas seria inevitável, e sempre pode haver uma escalada.

Ele já concorda com a avaliação corrente de que a disputa sobre o mar do Sul da China, que Pequim considera 85% seu território e os EUA reconhecem como área livre, trazia riscos “muito perigosos” de um conflito acidental.

Até aqui, Taiwan era visto como um teatro de confronto improvável, porque poderia opor diretamente Washington a Pequim.

Mas os gestos de Trump com seus enviados à ilha mostram que um embate pode ocorrer. Xiang crê que uma invasão chinesa da ilha, embora não impossível, só ocorreria se ela se declarasse independente.

Mesmo se nada disso ocorrer, a reunião do Quad já é espinhosa para a China. O grupo foi criado em 2007, mas dissolveu-se na prática um ano depois com a saída da Austrália.

Com a chegada de Trump ao poder, em 2017, foi refeito e revigorado. Agora, deixou de ser um encontro protocolar de segundo escalão e fará uma cúpula de chanceleres.

Muita coisa mudou ante a antiga encarnação do Quad, além da beligerância de Trump. A Austrália tinha receio de confrontar a China, até por questões comerciais. Agora, reforça seu poder aeronaval e adota retórica de confronto.

A Índia, parceira da China no grupo Brics, também se afastou de Pequim e se aproximou dos EUA.

Neste ano, os dois países protagonizam um tenso impasse na área de fronteira que disputam no Himalaia —que gerou um embate com dezenas de mortos em junho e ainda está inconcluso.

O Japão vem se rearmando. Esse será o primeiro grande evento político no país após a renúncia de Shinzo Abe, o premiê que definiu uma política mais agressiva do arquipélago.

Mas os nipônicos mordem e assopram. Neste mês, o chanceler chinês, Wang Yi, também visitará Tóquio. Em entrevista recente, ele qualificou o Quad de “ideia para agarrar umas manchetes”.

Na visão de Xiang, a China vê este outubro como o zênite das tensões do ano.

Que não são poucas, além das já citadas: guerra comercial e disputa tecnológica, diferenças sobre a repressão em Hong Kong e o manejo do coronavírus, fechamento de consulados.

Passada a eleição, acredita, as coisas podem se acalmar, seja Biden ou Trump o vencedor. No caso do republicano, ele diz que o problema são os “falcões” de sua equipe. Pompeo é o homem que diz que o mundo tem de escolher entre chineses e americanos.

“Trump não quer saber de ideologia, mas Pompeo se aproveita de um presidente idiossincrático”, afirmou.

Se além disso o secretário de Estado também será “louco”, como definiu Xiang, deve ficar claro nesta semana.

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