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Por que o resgate das vítimas de desabamento em Miami é tão lento e difícil

A cada minuto que passa, esperança de encontrar sobreviventes diminui; número de mortos deve aumentar significativamente

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Um incêndio dentro do monte de escombros do prédio que desabou na quinta-feira (24) na cidade de Surfside, ao lado de Miami, nos Estados Unidos, dificulta o complexo processo de resgate das vítimas.

O número de mortos atualmente está em nove pessoas, e ainda há dezenas de desaparecidos.

Equipes de resgate trabalham em meio a escombros
Um incêndio sob os escombros dificulta o resgate - Getty Images

"Nossas equipes de resgate encontraram outro corpo nos escombros", disse no sábado Daniella Levine Cava, prefeita do condado de Miami-Dade, onde fica a cidade de Surfside.

A lenta contagem de mortos está gerando desespero em familiares das vítimas, angustiados por não saberem o paradeiro de seus entes queridos.

Veículos de imprensa americanos incluem uma criança brasileira na lista de desaparecidos. Lorenzo Leone, de 5 anos, estaria na unidade 512 das Chaplain Towers junto com seu pai, Alfredo Leone, quando o edifício veio abaixo. A informação foi publicada pelos jornais The New York Times e Miami Herald, além da rede de notícias CBS News. Lorenzo é filho da brasileira Raquel Oliveira.

Na sexta, Raquel postou em seu perfil nas redes sociais que "as buscas não param e vão continuar por dias". "Essa noite deixei meu DNA para compararem com os das crianças não identificadas, conforme forem achando." A BBC News Brasil entrou em contato com familiares de Raquel e Lorenzo, mas não obteve retorno. Pelo menos outros 18 latino-americanos estão entre os desaparecidos.

Equipes de resgate trabalham em meio a escombros
Equipe de resgate busca sobreviventes nos escombros - Getty Images

Correndo contra o tempo

Nas primeiras horas após o colapso, os bombeiros resgataram 35 pessoas com vida.

Mas a cada minuto que passa, a esperança de encontrar sobreviventes diminui. O número de mortos deve aumentar significativamente. "Estamos enfrentando dificuldades enormes com este incêndio", disse Levine Cava na manhã de sábado.

A prefeita explicou que uma trincheira foi cavada nos escombros para controlar um incêndio localizado "muito fundo" sob os restos do prédio de 12 andares.

À tarde, o chefe dos bombeiros de Miami-Dade, Alan Cominsky, disse que finalmente conseguiram controlar o fogo, mas as chamas não foram totalmente extintas.

A chuva dos últimos dias também dificultou todo o processo. O complexo possui mais de 130 apartamentos, 80 dos quais estavam ocupados. Cerca de 55 deles desabaram.

As equipes de resgate usaram infravermelho, sonar e tecnologia de vídeo para detectar de onde vinha o fogo. Máquinas pesadas também estão sendo usadas para mover entulhos, e cães especializados em encontrar pessoas farejam entre os escombros.

Cartaz com foto de casal e flor cor de rosa ao lado
Parentes de desaparecidos procuram por seus entes queridos - Getty Images

Risco para a equipe

Levine Cava afirmou que os socorristas correm "risco extremo" ao andar pelos destroços.

O incêndio sob a montanha de concreto, metal e outros materiais criou problemas de fumaça e qualidade do ar, aumentando a dificuldade que um resgate desse tipo já apresenta.

"O fedor é muito forte", disse o governador da Flórida, Ron DeSantis, na manhã de sábado.

"À medida que movemos os destroços, a fumaça aumenta. Não encontramos nenhum sinal de vida ainda", admitiu o chefe dos bombeiros, Cominsky, no sábado, acrescentando que as equipes de resgate continuarão a busca. "É uma situação muito difícil, mas esperamos encontrar alguém vivo."

"Temos engenheiros estruturais especializados no local para garantir que ninguém se machuque", afirmou Levine Cava. "Ainda temos esperança. Continuaremos procurando. Procuramos pessoas vivas, essa é a nossa prioridade, e nossas equipes não pararam", disse a prefeita.

Em uma rua próxima, foi montado um memorial com velas, flores e mensagens de apoio, além de dezenas de fotos de desaparecidos.

"Eu quero respostas"

Longe da zona de colapso, a frustração dos familiares aumenta.

"Não está sendo feito o suficiente", disse o americano Mike Salberg à agência de notícias AFP.

Ele foi de Nova York para Miami para acompanhar as buscas porque tem cinco familiares, incluindo seus pais, entre os desaparecidos. "Eu quero respostas", disse ele.

"É impossível que em quatro dias eles não tenham encontrado ninguém", disse uma mãe visivelmente irritada em uma reunião com autoridades, segundo um vídeo publicado pelo canal de televisão CNN.

"Sei que estão fazendo tudo o que podem, mas nos fizeram uma promessa que não estão cumprindo, que não podem cumprir", diz a mulher, cuja filha está entre os desaparecidos.

Apesar de já terem se passado muitas horas desde o colapso da manhã de quinta-feira, as autoridades tentam incentivar os familiares a não perder a esperança.

"Nossa experiência nos diz que, pelo menos nas primeiras 72 horas, há uma grande probabilidade de encontrar pessoas vivas", disse Danny Cardeso, do corpo de bombeiro, à CBS News.

Equipes de engenheiros e especialistas em resgate de Israel e do México estão a caminho de Miami para ajudar nas buscas. O prefeito de Surfside, Charles Burkett, disse que o principal obstáculo não é falta de recursos. "Temos um problema de sorte. Precisamos de um pouco mais de sorte", afirmou.

O edifício

As Chaplain Towers formam um condomínio de 12 andares e 130 apartamentos à beira-mar ao norte de Miami Beach.

Segundo levantamento da BBC News Mundo em sites imobiliários da cidade, os apartamentos tinham valor de mercado entre US$ 600 mil a US$ 700 mil (de R$ 3 milhões a R$ 3,5 milhões). Mas havia um apartamento no último andar com três quartos e piso de mármore que estava à venda em maio por quase US$ 3 milhões (cerca de R$ 15 milhões).

Informações veiculadas pela mídia local apontam que entre os moradores havia artistas, familiares de políticos, médicos renomados e membros da comunidade judaica da Flórida.

A construção do edifício foi concluída em 1981, segundo dados oficiais da cidade.

Como a regulamentação em vigor estabelece que as construções desse tipo devem passar por fiscalização aos 40 anos para garantir sua habitabilidade, o prédio estava em obras para poder ser fiscalizado por especialistas e obter sua recertificação, segundo autoridades locais.

"O trabalho estava sendo feito no prédio para atender ao padrão de 40 anos. Isso é algo que foi implementado não apenas para o condado, mas para todos os municípios, e temos um código de construção rígido desde o furacão Andrew para atualizações e melhorias", afirmou Sally Heyman, inspetora do condado de Miami-Dade.

Segundo o prefeito de Surfside, o prédio estava passando por manutenção no telhado, mas não aponta a eventual relação entre essas obras e o desabamento.

Ele afirmou não conseguir imaginar nenhum motivo para a tragédia, mas aventou a possibilidade de uma cratera embaixo do edifício ou algum problema na fundação.

Um corretor de imóveis que vende propriedades no prédio disse ao jornal Miami Herald que o complexo Chaplain Towers estava "em boas condições" e que "os reparos estavam apenas começando" para a nova certificação.

Segundo o jornal, a associação de moradores contratou recentemente um engenheiro para fazer as mudanças estruturais e no sistema elétrico necessárias para obter a nova licença, mas as obras ainda estavam por começar.

Peter Dyga, presidente e CEO da Associação de Construtores e Empreiteiros da Costa Leste da Flórida, disse à afiliada local da emissora CBS que provavelmente há uma conjunção de "múltiplos fatores" por trás do que aconteceu e que levará anos para determinar as causas da tragédia.

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