Chanceler de Bolsonaro quer que países da América Central recebam imigrantes haitianos

Carlos França diz ter tratado do tema com secretário de Estado dos EUA durante viagem a Nova York

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São Paulo

O Brasil defendeu junto aos EUA que a crise dos migrantes haitianos tenha uma solução regional e mencionou como possibilidade a fixação das pessoas em países da América Central.

Esse cenário foi discutido entre o chanceler brasileiro, Carlos França, e o secretário de Estado americano, Antony Blinken, que se reuniram em Nova York (EUA) no dia 21 de setembro.

Migrantes haitianos que chegaram ao Texas entram em van para serem deportados pelo governo dos EUA
Migrantes haitianos que chegaram ao Texas entram em van para serem deportados pelo governo dos EUA - Nick Wagner - 24.set.21/Xinhua

“Defendi que tenhamos uma abordagem regional, para tentar fixar esse pessoal de repente no meio do caminho e ver como se pode criar oportunidade de empregos para eles”, afirmou França à Folha.

O governo de Joe Biden enfrenta uma emergência migratória na cidade de Del Rio, no estado do Texas, onde milhares de haitianos se concentraram em condições insalubres, tentando fixar-se nos EUA.

Diante do problema, o democrata autorizou a deportação em massa dos haitianos por via aérea, seja para seu país de origem ou para outros destinos. Na conversa, Blinken pediu ao chefe do Itamaraty que o Brasil aceite receber algumas dessas pessoas, uma vez que muitos deles partiram daqui para os EUA.

Após o terremoto de 2010 que devastou o país caribenho, milhares de haitianos procuraram refúgio no Brasil e em outros países sul-americanos, como o Chile, mas mais recentemente decidiram buscar outros destinos, em razão da crise econômica e da escassez de empregos.

“A gente só pode receber, de acordo com a nossa legislação, se for por questão de reunião familiar. Na verdade, tem que ver se eles querem vir. Muitos preferem ficar lá [no Texas], aguardando uma espécie de anistia, alguma coisa assim”, afirmou o ministro.

Na costura por uma solução regional, França menciona países como Panamá e os do chamado Triângulo Norte (El Salvador, Guatemala e Honduras) como exemplos de nações que poderiam abrigar parte dos haitianos. “Por exemplo, estão passando pelo Panamá, como faz ali? Tem o Triângulo Norte, pode até fixar ali, dando oportunidade às crianças”, afirma.

A necessidade de uma solução regional, diz o chanceler, impõe-se pela dificuldade de um país resolver o problema individualmente. “Não adianta eu [Brasil] fechar [o acesso aos EUA]. Se eu fecho, o cara entra pela Guiana. Se fecho a Guiana, vai pela Nicarágua. Se fecha a Nicarágua, vai pela Guatemala.”

Um exemplo típico, acrescenta França, foi o da Costa Rica. “Conversei com o chanceler da Costa Rica, e ele me contou que começou a ter um fluxo muito grande de imigrantes que estavam chegando e saindo de lá como se fossem fazer turismo. Aí foram vendo que eram muitos voos fretados. As pessoas diziam que iam fazer turismo, mas estavam no fundo migrando para os EUA.”

Segundo ele, o tema não será resolvido sem que se solucionem as questões de fundo que fazem os haitianos deixarem o país. Isso pode ocorrer inclusive com apoio da sociedade civil brasileira, afirma.

“Temos que ter a grandeza de entender que a ajuda das Nações Unidas, com a maior boa vontade e o profissionalismo que têm, não gerou um resultado capaz de reforçar a institucionalidade naquele país. Temos de criar uma solução sustentável de educação para aquelas crianças haitianas, de modo que daqui a uma geração elas fiquem no Haiti”, disse França.

Outro item na pauta imigratória do Itamaraty é a concessão de refúgio para afegãos que se sentem ameaçados após a tomada de poder pelo Talibã, em agosto. O Brasil foi criticado por ter imposto exigências draconianas para afegãos que pleiteiam os vistos, como provar que serão mantidos durante ao menos seis meses por alguma organização que banque uma longa lista de despesas.

Entre as demandas, feitas por embaixadas do Brasil na região da Ásia Central —o país não tem representação diplomática no Afeganistão—, estão plano de saúde e odontológico, renda mensal, hospedagem, alimentação, transporte, teste PCR para Covid-19 e custos para revalidação de diplomas, por exemplo.

Segundo França, essa lista de exigências é “normal”, mas já está sendo flexibilizada. “Temos uma preocupação com a criação de uma rede de apoio, estamos falando de gente que precisa de cuidados. O sujeito chega, tem que ver se é o SUS [Sistema Único de Saúde] que cuida, tem a questão da língua.”

Embora o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tenha dito em discurso na Assembleia-Geral da ONU que daria refúgio para cristãos afegãos, o benefício não será restrito a esse grupo, afirma o chanceler.

Para França, a referência foi apenas a uma comunidade que está em situação de risco evidente e que teve sua situação evidenciada logo após a chegada do Talibã ao poder por grupos evangélicos brasileiros.

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