Presidente de Portugal veta lei da eutanásia pela segunda vez

Parlamento, prestes a ser dissolvido, havia apressado aprovação antes de eleição; análise de veto ficará para nova legislatura

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Lisboa

O presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, voltou a vetar a descriminalização da eutanásia no país. O chefe de Estado devolveu a lei, aprovada em 5 de novembro, ao Parlamento e pediu esclarecimentos adicionais sobre o texto.

O movimento de Rebelo de Sousa, católico praticante, empurra a decisão sobre a morte medicamente assistida para a próxima legislatura. Dependendo da composição da Assembleia da República após as eleições antecipadas de 30 de janeiro, há a possibilidade de que a eutanásia não volte a ser aprovada.

Esta é a segunda vez que o presidente português veta a implementação da eutanásia. Na primeira ocasião, Rebelo de Sousa enviou a lei, aprovada em janeiro de 2021, para uma análise do Tribunal Constitucional, a mais alta corte do país.

O presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, em evento em Málaga, na Espanha - Jorge Guerrero - 17.nov.21/AFP

Os magistrados declararam que alguns trechos da lei eram inconstitucionais, mas deixaram o caminho aberto para que o Parlamento fizesse alterações que corrigissem os pontos problemáticos.

A declaração explícita de que a morte medicamente assistida não violava a Constituição de Portugal foi interpretada como um aceno da corte à viabilidade da lei.

Os deputados então apresentaram um texto que alterava a lei original. Após a convocação de eleições antecipadas, feita pelo presidente após o fracasso na aprovação do Orçamento para 2022, os parlamentares correram para aprovar a eutanásia antes do fim da legislatura.

A nova redação da descriminalização da eutanásia foi aprovada por ampla maioria em 5 de novembro.

Rebelo de Sousa, agora, optou pelo chamado veto político, devolvendo o texto aos deputados com questionamentos sobre "o que parecem ser contradições na lei quanto a uma das causas do recurso à morte medicamente assistida". Na decisão, o presidente diz que foi motivado por "inesperadas perplexidades" introduzidas na nova versão da legislação.

A jornalistas, na tarde desta terça (30), o chefe de Estado negou que sua decisão tenha sido motivada por questões religiosas. "A minha convicção pessoal religiosa, ética, seria muito mais crítica em relação à lei, mas o presidente não está lá para impor a sua convicção ética, religiosa ou política."

Rebelo de Sousa afirma que a nova versão da lei da eutanásia corrigiu os pontos indicados pelo Tribunal Constitucional, mas criou outras situações problemáticas que inviabilizariam sua implementação.

"Na primeira lei, mandei para o Tribunal Constitucional porque tinha dúvidas em pontos que não respeitavam a Constituição. A Assembleia da República corrigiu, e por isso não enviei para o Constitucional. Só que, ao corrigir os pontos, mexeu noutros e mudou a lei", disse.

Para o presidente, o texto mantém, numa norma, a exigência de "doença fatal" para a permissão de antecipação da morte, um ponto que vinha da primeira versão da proposta. "Mas alarga-a, numa outra norma, a ‘doença incurável’, mesmo se não fatal, e, noutra ainda, a ‘doença grave'", afirmou.

O novo veto presidencial foi criticado por diversos parlamentares.

Uma das redatoras da lei, a deputada Isabel Moreira, do Partido Socialista, disse que o presidente tentou dar uma aparência jurídica a uma decisão política. "O presidente da República faz um veto absolutamente atípico, porque utiliza formalmente o veto político e, no entanto, envereda-se por considerações jurídicas que deveriam caber ao Tribunal Constitucional", afirmou, em declarações à rede SIC Notícias.

Em 2018, em um Parlamento com menos representantes de esquerda, um projeto de lei sobre o tema foi rejeitado com apenas cinco votos de diferença.

O veto político do presidente ainda pode ser derrubado pelos deputados. Pelo regimento da Assembleia da República, no entanto, a apreciação de um diploma vetado só pode ser feita após pelo menos 15 dias do recebimento da decisão.

Como o Parlamento precisa ser dissolvido até 6 de dezembro —data limite para permitir a realização das eleições—, a decisão final fica, na prática, nas mãos da futura composição da assembleia.

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