Descrição de chapéu refugiados

No Chipre, papa Francisco volta a pedir que Europa acolha refugiados

País banhado pelo Mediterrâneo é porta de entrada para imigrantes vindos do Oriente Médio

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Belo Horizonte

O papa Francisco voltou a pedir nesta quinta-feira (2) a união dos povos e soluções para a crise migratória que afeta a Europa há anos. O local escolhido para proferir as declarações é simbólico: a ilha mediterrânea de Chipre, dividida em duas partes desde 1974 e porta de entrada para milhares de refugiados que tentam chegar às grandes potências do continente.

Francisco chegou à ilha por volta das 10h, no horário de Brasília, e foi recebido na cidade de Larnaca, no sul do país, sob gritos de crianças da região. "Te amamos, papa Francisco", diziam. Os cristãos representam 78% da população cipriota, a grande maioria seguidora da Igreja Ortodoxa. Segundo a União Europeia, 18% do país é muçulmano e os outros 4% se dividem entre hindus, judeus e outras religiões.

O presidente cipriota, Nicos Anastasiades, recebe o Papa Francisco no Palácio Presidencial, em Nicósia
O presidente cipriota, Nicos Anastasiades, recebe o Papa Francisco no Palácio Presidencial, em Nicósia - Amir Cohen/Reuters

O pontífice foi à Catedral Maronita de Nossa Senhora da Graça, na capital Nicósia. Lá, encontrou-se com Béchara Rai, patriarca da igreja, que tem laços com o Vaticano e representa menos de 1% da população da ilha, mas é bastante presente no Líbano e na Síria –origem de muitos dos que tentam chegar à Europa.

Na catedral, o papa pediu a união dos povos e disse que, "para construir um futuro digno para o ser humano, é preciso trabalhar juntos, superar divisões, acabar com muros e cultivar o sonho da unidade".

O Chipre é dividido em dois há quase 50 anos. Dois terços do país, na parte sul, são conhecidos como República do Chipre, um membro da União Europeia. O outro terço, originado após conflitos na década de 1970, é a autoproclamada República Turca do Norte do Chipre (RTNC), reconhecida apenas pela Turquia.

Em meio ao conflito que segue até hoje, a capital Nicósia é a única do mundo ainda dividida por um muro.

Bandeira turca hasteada no lado ocupado pelos turcos, na área desmilitarizada da Zona Tampão das Nações Unidas em Chipre, em um trecho de Nicósia, a única capital murada do mundo
Bandeira turca hasteada no lado ocupado pelos turcos, na área desmilitarizada da Zona Tampão das Nações Unidas em Chipre, em um trecho de Nicósia, a única capital murada do mundo - Amir Makar - 22.nov.21/AFP

O papa ainda comentou a crise enfrentada há anos pela Europa em relação a imigrantes de África e Ásia que fogem da pobreza ou conflitos políticos e militares em busca de vida melhor no continente europeu.

"Precisamos acolher e nos integrar, caminhar juntos", acrescentou, dizendo que o Mediterrâneo —um dos principais caminhos utilizados pelos refugiados— é "um mar que foi berço de tantas civilizações e é onde ainda desembarcam pessoas, povos e culturas de todo o mundo".

O Chipre é o país da UE mais próximo ao Oriente Médio e, assim como outros localizados no Mediterrâneo, como Grécia, Malta e Itália, sente as consequências da chegada dos milhões de refugiados ao continente.

Em novembro, a ilha anunciou que, nos dez primeiros meses do ano, 10.868 imigrantes entraram no país —mais de 9.000 deles chegaram após atravessar a fronteira desmilitarizada entre as duas repúblicas.

Segundo o governo cipriota, estão em curso negociações com o Vaticano para a transferência de famílias de imigrantes à Itália, como aconteceu em 2016, durante visita do papa à ilha grega de Lesbos, quando ele levou três famílias sírias para Roma. Dessa vez, espera-se que Francisco consiga levar 50 pessoas.

Além disso, nesta quinta-feira, 36 ONGs de defesa dos direitos humanos pediram a Francisco que ele atue para impedir expulsões de imigrantes na fronteira entre Grécia e Turquia.

A poucos metros da catedral, pessoas se reuniam para ver o discurso do papa pela televisão. "Vim para escutar o coração dele. Um coração que está cheio de respeito, dignidade, direitos humanos e que busca abordar os problemas dos imigrantes", disse a cristã Avril Fortuin, 57, à agência de notícias AFP.

O papa também comentou a crise econômica e social enfrentada pelo Líbano, país vizinho ao Chipre –estima-se que mais de mil libaneses viajaram para acompanhar o discurso do pontífice na ilha. "Sinto a dor do povo, cansado e afetado pela violência e pelo sofrimento" disse Francisco.

Mais tarde, o papa se reuniu com o presidente Nicos Anastasiades, com quem falou sobre o conflito na ilha. "O caminho da paz, que sana os conflitos e regenera a beleza da fraternidade, está marcado com uma palavra: diálogo", disse Francisco.

O presidente da área ligada aos turcos, Ersin Tatar, porém, acusou as autoridades do país de usar a visita para "objetivos políticos contra Turquia e RTNC". A grande maioria da população turca é muçulmana.

Essa é a segunda vez que um papa vai à ilha; a primeira foi em 2010, quando Bento 16 ainda era o chefe da Igreja Católica. A visita faz parte de uma viagem de cinco dias, que também contará com a ida de Francisco à Grécia. Na sexta (3), o papa celebrará uma missa em um estádio de Nicósia, onde são esperados cerca de 7.000 fiéis, e realizará uma oração com imigrantes em local próximo à região desmilitarizada entre as duas partes da ilha. Mais de 500 policiais acompanharão o evento.

Desde que se tornou papa, Francisco faz questão de trazer para o debate os conflitos envolvendo os refugiados. Em setembro, em viagem à Eslováquia e à Hungria, criticou o individualismo e o egoísmo da sociedade, deixando claro o apoio da Igreja Católica à acolhida de imigrantes em países europeus.

"Que este país reafirme a mensagem de integração e paz e que a Europa se distinga por uma solidariedade que, atravessando fronteiras, possa levá-la de volta ao centro da história", disse na Bratislava.

Dias antes, em Budapeste –cidade sede do governo de Viktor Orbán, premiê húngaro anti-imigração–, o papa também havia defendido a abertura do continente.

"A cruz, conectada ao chão, não só nos convida a estar enraizados, mas também estende seus braços a todos", disse. "Meu desejo é que vocês sejam assim: ancorados e abertos, enraizados e respeitosos."

Com Reuters e AFP

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.