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Por que os EUA começaram a deportar venezuelanos para a Colômbia

Medida se sustenta em política da gestão Trump mantida por Joe Biden; diplomacia colombiana diz que não houve acordo

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BBC News Brasil

Os Estados Unidos começaram a deportar para a Colômbia venezuelanos que viviam no país antes de tentarem cruzar ilegalmente para o território americano. Os primeiros deportados foram dois imigrantes venezuelanos que estavam sob custódia e que residiam anteriormente na Colômbia.

Eles foram deportados em 27 de janeiro, confirmou o Departamento de Segurança Interna dos EUA (DHS, na sigla em inglês) na terça (1º) num comunicado para a BBC News Mundo (serviço em espanhol da BBC).

Migrante venezuelano fala com a esposa por chamada de vídeo após conseguir cruzar a fronteira do México com os Estados Unidos na cidade de Yuma, no Arizona
Migrante venezuelano fala com a esposa por chamada de vídeo após conseguir cruzar a fronteira do México com os Estados Unidos na cidade de Yuma, no Arizona - John Moore - 10.dez.21/Getty Images/AFP

O DHS especificou que a deportação ocorreu com base no Título 42, uma política estabelecida pela administração de Donald Trump (2017-2021) e mantida pela de Joe Biden, que permite que os migrantes sejam rapidamente expulsos devido à pandemia de Covid-19.

No comunicado, o governo afirma que os voos com venezuelanos que antes residiam na Colômbia devem ser realizados "de forma regular", operados pelo Serviço de Fiscalização de Imigração e Alfândega (ICE).

A agência "está comprometida em garantir que cada migrante encontrado seja tratado de maneira segura, ordenada e humana", afirma o comunicado. A nota lembra que o DHS expulsou imigrantes para outros países da região onde residiam anteriormente, como Guatemala, Honduras, El Salvador ou Brasil.

Sem acordo

O governo colombiano, por meio do Escritório de Migração, confirmou a chegada dos venezuelanos. "Esses estrangeiros, que chegaram com a documentação em ordem, deixaram o território nacional em direção ao México e depois cruzaram irregularmente para os EUA", disse um porta-voz à agência AFP.

Em seu comunicado, o Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos destacou que a decisão de deportar venezuelanos para o território colombiano foi tomada após "conversar com a Colômbia".

A imprensa colombiana informou que em dezembro ambos os governos se reuniram para explorar essa possibilidade, mas que a chanceler colombiana e vice-presidente, Marta Lucía Ramírez, alegou na terça não ter havido acordo sobre o assunto com os EUA. "Não assinamos nenhum acordo com os EUA para receber 6.000 venezuelanos deportados, como indicam alguns meios de comunicação", disse à Blu Radio.

"Os EUA levantaram a possibilidade de que alguns venezuelanos, que chegaram irregularmente com colombianos, sejam deportados. Se são colombianos, que sejam deportados. Se são venezuelanos que fazem parte do Estatuto de Proteção Temporária e não querem mais viver na Colômbia, vamos analisar."

A BBC News Mundo entrou em contato com o Ministério das Relações Exteriores da Colômbia, mas até o momento da publicação desta reportagem não obteve resposta.

A Colômbia tem sido a grande receptora de imigrantes venezuelanos devido à crise econômica que atingiu o país vizinho na última década. O país abriga mais de 1,7 milhão de venezuelanos.

Mas o crescente fluxo de imigração de venezuelanos também tem outros destinos. Em dezembro, as autoridades dos EUA encontraram venezuelanos cruzando a fronteira mexicana ilegalmente quase 25 mil vezes —a segunda nacionalidade mais recorrente depois dos mexicanos. O número foi mais que o dobro registrado apenas três meses antes e muito maior do que os quase 200 do ano anterior.

Desde que os EUA romperam relações diplomáticas com o governo de Nicolás Maduro, as autoridades de imigração americanas não têm como processar deportações de venezuelanos para seu país de origem.

A embaixada da Venezuela nos EUA, sob poder do grupo de oposição do líder Juan Guaidó (reconhecido por Washington como "presidente interino"), fez um apelo ao governo dos EUA em comunicado na terça para que migrantes venezuelanos possam pedir asilo. A embaixada afirma que a imposição de restrições "só aprofundará a crise e aumentará os negócios ilegais, como tráfico de pessoas e contrabando".

Título 42

Como o DHS aponta em seu comunicado, as deportações estão sendo realizadas seguindo as indicações do chamado Título 42. Trata-se de uma exceção à lei sanitária do país, que permite restringir a entrada de estrangeiros por via terrestre por motivos de saúde (mesmo para quem tem visto).

A regra foi criada na década de 1940 e afirmava que, se algum médico certificado pelo governo determinasse que uma pessoa apresentava risco de introduzir uma doença contagiosa no país, essa pessoa deveria ser expulsa imediatamente. Essa decisão mais tarde passou a ser de responsabilidade exclusiva dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) e raramente foi colocada em prática ao longo das décadas. Mas, em março de 2020, o então presidente Donald Trump reativou a norma no contexto da pandemia, gerando polêmica, porque a medida restringe o direito de se buscar asilo no país.

Em setembro do ano passado, a rádio americana NPR informou que o governo Biden havia pedido na Justiça que o Título 42 fosse mantido para questões de imigração, a fim de "retardar a expansão da Covid-19 no país". Olga Byrne, diretora de assuntos migratórios do Comitê Internacional de Resgate, critica a medida. "Apesar dos compromissos anunciados pelo governo dos EUA nos primeiros 100 dias, políticas prejudiciais como o Título 42 permanecem em vigor mais de um ano após a posse", diz ela.

"As remoções devido ao Título 42 privam os requerentes de asilo e, em vez disso, os enviam de volta a condições perigosas semelhantes, se não piores, àquelas das quais escaparam. Em certos casos, eles são enviados para países terceiros como a Colômbia."

Mais imigrantes na fronteira sul

Os venezuelanos se tornaram a segunda nacionalidade, atrás dos mexicanos, que mais busca cruzar a fronteira sul dos EUA, de acordo com dados das autoridades americanas.

Segundo os relatórios da patrulha de fronteira, os cruzamentos onde mais imigrantes foram identificados foram os de Yuma, no Arizona, e Del Río, no Texas. Os venezuelanos costumam viajar para Mexicali, no México, e de lá tentam atravessar a passagem de Yuma. Em setembro passado, a ONU confirmou que quase 6 milhões de venezuelanos deixaram o país nos últimos anos. Muitos deles apontaram que emigraram em razão da crise econômica que o país sul-americano atravessa.

A Colômbia, principal receptora dessa migração, ativou um ambicioso plano de naturalização de venezuelanos, que se estima representarem uma população de cerca de um milhão e meio de pessoas.

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