Descrição de chapéu Guerra da Ucrânia Rússia

Rússia indica nova meta de território e pressiona fronteiras da Guerra da Ucrânia

General fala em tomar sul e leste da Ucrânia, em rota para porção separatista da Moldova, e Kiev acusa imperialismo

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Bauru e São Paulo

Um general russo afirmou nesta sexta-feira (22) que Moscou quer tomar todo o sul e o leste da Ucrânia, objetivos de guerra muito mais amplos do que havia reconhecido anteriormente.

Rustam Minnekaiev, vice-comandante do Distrito Militar Central da Rússia, foi citado por agências de notícias estatais dizendo que Moscou pretende tomar toda a região do Donbass (leste), conectá-la com a península da Crimeia e capturar inteiramente o sul da Ucrânia, até a fronteira com Moldova.

Isso significaria avançar centenas de quilômetros além das linhas atuais, passando pelas grandes cidades de Mikolaiv e Odessa. Na prática, a ofensiva russa também poderia extrapolar o território da Ucrânia ao chegar à Transdnístria, enclave separatista em Moldova cuja maior parte da população é russa étnica.

Mulher olha para mercado destruído após bombardeio em Kharkiv - Sergey Bobok/AFP

Para justificar a expansão da "operação militar especial" —eufemismo usado pelo Kremlin para se referir à guerra—, Minnekaiev parafraseou argumentos para a ofensiva no Donbass. Segundo ele, a população pró-Rússia na Transdnístria tem sido vítima de opressão. Assim, as forças russas estariam em uma espécie de missão de salvamento.

"Aparentemente, estamos agora em guerra com o mundo inteiro, como estávamos na Grande Guerra Patriótica", disse o general, segundo a agência TASS, referindo-se à Segunda Guerra Mundial. "Todos da Europa, o mundo inteiro estava contra nós. E agora a mesma coisa: eles nunca gostaram da Rússia."

O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, não comentou as declarações.

A Ucrânia reagiu, afirmando que os comentários desmentem falas de que não havia ambições territoriais em jogo. "Eles pararam de esconder", escreveu o Ministério da Defesa da Ucrânia no Twitter. Segundo o texto, a Rússia "reconheceu que o objetivo da 'segunda fase' da guerra não é uma vitória sobre os míticos nazistas, mas simplesmente a ocupação do leste e do sul da Ucrânia. O imperialismo como ele é".

O presidente Volodimir Zelenski, em pronunciamento, repisou a tese de que o conflito seria uma preparação para invasões de Moscou a outros países. "O território em que a Rússia deveria cuidar de russófonos é a própria Rússia. Lá não há liberdade de expressão ou de escolha, não há direito ao dissenso."

A chancelaria de Moldova anunciou que que convocou o embaixador de Moscou para expressar preocupação com as falas do general sobre a opressão na Transdnístria. "A declaração é infundada. Moldova é um Estado neutro, e esse princípio deve ser respeitado por todos os atores internacionais, inclusive a Federação Russa", disse o órgão em comunicado.

O país pleiteia a adesão na União Europeia.

Minnekaiev também procurou ressaltar a superioridade militar da Rússia, embora analistas e observadores internacionais tenham concluído que Moscou subestimou a capacidade de resistência dos ucranianos. "Nós não começamos essa guerra, mas vamos terminá-la."

Kiev disse que as forças russas aumentaram os ataques no leste e estão tentando montar uma ofensiva na região de Kharkiv. A artilharia russa atingiu o principal mercado dessa cidade no norte do Donbass. Os serviços de ambulância disseram que houve vítimas, sem dar detalhes. Um salão de casamentos e um prédio residencial também foram atingidos.

Putin diz que Kiev impede rendição de militares em ​Mariupol

O Exército russo afirmou nesta sexta-feira que está pronto para oferecer uma trégua humanitária em "toda ou em parte" da zona industrial de Azovstal, último bastião das forças ucranianas em Mariupol, para permitir a retirada de civis e a rendição de combatentes.

O presidente Vladimir Putin reivindicou na quinta-feira a tomada da cidade portuária crucial para a invasão, mas Kiev e os EUA contestam a narrativa de vitória. Ele havia ordenado cercar a usina, onde há cerca de 2.000 soldados, segundo Moscou, mas sem dar a ordem de invasão.

"O ponto de partida dessa trégua humanitária seria as tropas ucranianas levantarem uma bandeira branca em parte ou em todo o [complexo de] Azovstal", disse o Ministério da Defesa russo em comunicado, acrescentando que os civis que partirem poderão escolher entre serem levados para territórios sob controle russo ou ucraniano.

Putin, por sua vez, acusou as autoridades ucranianas de impedirem a rendição dos últimos soldados entrincheirados. "A vida de todos os militares ucranianos, combatentes nacionalistas e mercenários estrangeiros é garantida se eles depuserem suas armas. Mas Kiev não autoriza essa possibilidade", disse o presidente, em comunicado do Kremlin que resumia a versão russa da conversa com o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel.

O russo ainda acusou os "líderes da maioria dos países da União Europeia de apoiarem ações claramente russofóbicas", referindo-se à exclusão de cidadãos russos de eventos culturais e esportivos.

Em uma parte de Mariupol, moradores atordoados se aventuraram nas ruas em um cenário de prédios carbonizados e carros destruídos. Alguns carregavam malas. Voluntários em trajes de proteção e máscaras brancas percorreram as ruínas, coletando corpos de dentro dos apartamentos e carregando-os em um caminhão marcado com a letra "Z", símbolo da invasão russa.

A Ucrânia estima que dezenas de milhares de civis tenham morrido na cidade durante o bombardeio e o cerco da Rússia. A Maxar, uma empresa comercial de satélites, disse que imagens espaciais mostram valas comuns recém-cavadas em Manhuch, nos arredores de Mariupol.

Imagem de satélite desta sexta-feira (22) mostra uma vala comum em Manhuch, nos arredores de Mariupol, Ucrânia - Satellite image ©2022 Maxar Technologies / AFP

Kiev diz que 100 mil moradores ainda estão no local e precisam ser retirados. As Nações Unidas e a Cruz Vermelha afirmam que o número de civis ainda é desconhecido, mas que está ao menos na casa dos milhares.

Nenhuma nova operação de retirada de pessoas foi realizada nesta sexta-feira, mas autoridades ucranianas citaram a possibilidade de corredores humanitários neste sábado (23). Moscou diz que levou 140 mil moradores de Mariupol para a Rússia, mas Kiev alega que muitos foram deportados à força, o que poderia configurar um crime de guerra.

Em seu pronunciamento na noite de sexta, Zelenski afirmou que seus aliados ocidentais finalmente começaram a entregar o armamento solicitado —o Canadá confirmou ter enviado artilharia pesada a Kiev, dias depois de os EUA anunciarem novo pacote de ajuda de US$ 800 milhões.

Crimes de guerra

Reforçando acusações, o Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos afirmou nesta sexta que há evidências crescentes de crimes de guerra cometidos pela Rússia na Ucrânia, incluindo sinais de bombardeios indiscriminados e execuções sumárias. O comunicado da entidade diz, ainda, que a Ucrânia também parece ter usado armas proibidas na região controlada por Moscou no leste do país.

"As Forças Armadas russas bombardearam indiscriminadamente áreas povoadas, matando civis e destruindo hospitais, escolas e outras infraestruturas civis, ações que podem equivaler a crimes de guerra", disse a comissária Michelle Bachelet.

"A escala de execuções sumárias de civis em áreas anteriormente ocupadas por forças russas também está surgindo. A preservação das evidências e o tratamento digno dos restos mortais devem ser garantidos, bem como o alívio psicológico para as vítimas e seus familiares."

A Rússia nega ter civis como alvo e refuta as acusações de crimes de guerra.

A ONU disse que desde o início do conflito, em 24 de fevereiro, até 20 de abril, monitores na Ucrânia verificaram 5.264 vítimas civis —2.345 mortos e 2.919 feridos. Destes, 92,3% foram registrados em território controlado pelo governo e 7,7% nas regiões de Donetsk e Lugansk, controladas pelas Forças Armadas russas e por grupos afiliados.

Papa desiste de encontro com patriarca ortodoxo russo

O papa Francisco anunciou nesta sexta que desistiu dos planos de se encontrar, em junho, com o patriarca ortodoxo russo Cirilo, aliado de Putin que apoiou a Guerra da Ucrânia.

Francisco, que várias vezes criticou implicitamente a Rússia e Putin desde a invasão do país vizinho, disse ao jornal argentino La Nación que lamenta que o plano tenha que ser "suspenso" porque diplomatas do Vaticano aconselharam que tal reunião "poderia gerar muita confusão nesse momento".

Em Moscou, a agência de notícias RIA citou um alto funcionário da Igreja Ortodoxa Russa dizendo que a reunião foi adiada porque "os eventos dos últimos dois meses" teriam criado muitas dificuldades para sua preparação.

O patriarca Cirilo em serviço religioso na Catedral de Moscou - Igor Palkin - 27.fev.22/Divulgação Igreja Ortodoxa Russa/AFP

Cirilo, 75, deu sua bênção total à invasão da Ucrânia pela Rússia desde seu início. O posicionamento fragmentou a Igreja Ortodoxa mundial e desencadeou uma rebelião interna que teólogos e acadêmicos dizem ser sem precedentes.

Francisco, 85, usou termos como "agressão injustificada" e "invasão" em seus comentários públicos sobre a guerra e lamentou as atrocidades contra civis. Questionado na entrevista sobre por que nunca nomeou a Rússia ou Putin especificamente, Francisco disse, segundo o La Nación: "Um papa nunca nomeia um chefe de Estado, muito menos um país, que é superior ao seu chefe de Estado".

Uma fonte do Vaticano familiarizada com o planejamento da ida de Francisco a Jerusalém disse nesta sexta que a preparação estava em um estágio avançado e que até o local do encontro com Cirilo havia sido escolhido.

Francisco disse no início deste mês que estava considerando uma viagem a Kiev, dizendo a repórteres em um voo para Malta, em 2 de abril, que a possibilidade estava "sobre a mesa". Ele foi convidado por líderes políticos e religiosos ucranianos.

"Não posso fazer nada que comprometa objetivos maiores, que são o fim da guerra, uma trégua ou pelo menos um corredor humanitário. De que adiantaria o papa ir a Kiev se a guerra continuar no dia seguinte?", disse o pontífice à imprensa argentina.

Putin vai se encontrar com secretário-geral da ONU em Moscou

O secretário-geral da ONU, António Guterres, visitará Moscou na terça-feira (26) e vai se reunir com Putin, disse um porta-voz.

Guterres também terá uma reunião de trabalho e almoço com o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov, informou Eri Kaneko, porta-voz associado de Guterres, em uma entrevista coletiva em Nova York, nesta sexta (22).

"Ele espera conversar sobre o que pode ser feito para trazer a paz à Ucrânia com urgência", afirmou Kaneko.

O gabinete do secretário-geral também está trabalhando com o governo da Ucrânia no agendamento e nos preparativos para uma visita ao país, informou o porta-voz. A ida se daria logo após a viagem a Moscou.

Com AFP e Reuters

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