Descrição de chapéu Guerra da Ucrânia Rússia

Rússia faz alerta aos EUA sobre envio de armas após visita de secretários a Kiev

Blinken e Austin se encontram com Zelenski e anunciam nova ajuda militar; dois lados se desentendem sobre cessar-fogo em Mariupol

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Kiev e Londres | Reuters e AFP

A Rússia fez nesta segunda-feira (25) um novo alerta sobre o fornecimento de armas do Ocidente para a Ucrânia. Por meio de uma nota diplomática e uma entrevista de seu embaixador em Washington, Moscou afirmou que grandes envios de armamento estão inflamando o conflito.

Em paralelo, os Estados Unidos anunciaram um novo pacote de ajuda militar a Kiev, elevando o total desde o início da guerra a US$ 3,7 bilhões. A informação foi confirmada pouco depois de uma visita dos secretários de Estado e Defesa, Antony Blinken e Lloyd Austin, ao presidente ucraniano, Volodimir Zelenski.

O encontro, envolvendo os funcionários americanos de mais alto nível na Ucrânia desde o início da invasão russa, há dois meses, só foi confirmado pela Casa Branca depois que os dois chegaram à Polônia —auxiliares de Zelenski, porém, já tinham confirmado a reunião.

O presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, cumprimenta o secretário de Estado americano, Antony Blinken, em encontro em Kiev - Divulgação Presidência da Ucrânia/Reuters

O embaixador russo Anatoli Antonov, que serve em Washington desde 2017, criticou o envio de armas pelo Ocidente sem fazer menção à visita. "O que os americanos estão fazendo é jogar gasolina no fogo. Vejo uma tentativa de dobrar apostas, o que agrava a situação e pode levar a mais perdas", disse ao canal de TV Rússia 24. Ele acrescentou que não teve resposta à nota diplomática que enviou.

"Enfatizamos que é inaceitável que os EUA despejem armas na Ucrânia e exigimos o fim dessa prática."

Blinken e Austin se reuniram com Zelenski por três horas, mais que o dobro do tempo previsto, segundo autoridades americanas. "Em termos de objetivos de guerra, a Rússia falhou e a Ucrânia teve sucesso", disse o secretário de Estado em uma entrevista já na Polônia, após deixar Kiev de trem, adotando retórica típica da guerra de narrativas que se desenrola no Leste Europeu.

Os dois destacaram, na conversa com o ucraniano, a resistência das forças do país ao longo do conflito, que chega nesta segunda ao 61º dia. "O que vocês fizeram para repelir os russos de Kiev é extraordinário e inspirador", afirmou Austin a Zelenski, segundo a agência de notícias Reuters.

A jornalistas na Polônia o secretário de Defesa buscou mostrar confiança numa possível vitória ucraniana ao final do conflito. "O primeiro passo para vencer é acreditar. E eles acreditam que podem vencer e nós também acreditamos, se eles tiverem o equipamento certo, o apoio adequado", disse.

"Queremos ver a Rússia enfraquecida a ponto de não poder fazer o tipo de coisa que fez ao invadir a Ucrânia. Moscou já perdeu muita capacidade militar, muitos soldados, e francamente queremos que eles não tenham a capacidade de reconstitui-la rapidamente."

Austin e Blinken ainda prometeram reabrir a embaixada americana na capital ucraniana em breve —movimento já realizado por alguns países europeus. O retorno do corpo diplomático, hoje baseado na Polônia, será gradual, com funcionários inicialmente voltando a Lviv, no oeste do país, e mais tarde reativando o escritório em Kiev.

Horas depois do anúncio, o presidente Joe Biden oficializou a indicação da diplomata Bridget Brink, hoje embaixadora na Eslováquia, para o posto na capital ucraniana —que estava vago havia três anos, mesmo antes do início da guerra. A nomeação da profissional, há 25 anos na carreira, ainda precisa ser chancelada pelo Senado americano.

Uma autoridade militar disse sob condição de anonimato à agência de notícias Reuters que o novo pacote de auxílio financeiro visa a fornecer suporte para batalhas na região do Donbass, ajudando ainda na transição para armas e sistemas de defesa aérea mais avançados.

O território no leste ucraniano é dominado em parte por separatistas pró-Moscou desde antes da invasão e é hoje um dos epicentros do combate, após uma reorganização das forças de Vladimir Putin: um dos objetivos que a Rússia admitiu ter para sua "operação militar especial", eufemismo usado para se referir à guerra, é conquistar todo o Donbass, conectá-lo com a península já anexada da Crimeia e capturar inteiramente o sul da Ucrânia, até a fronteira com a Moldova.

O líder da maioria democrata no Senado, Chuck Schumer, pronunciou-se nesta segunda sobre o pacote, dizendo esperar uma aprovação rápida e com apoio dos dois partidos. "Precisamos continuar ajudando a população da Ucrânia na sua luta contra a agressão Rússia", afirmou, sem detalhar o tamanho da ajuda.

Outro ponto sensível do conflito também foi foco de atenção nesta segunda. A Rússia primeiro anunciou um cessar-fogo unilateral na região do complexo siderúrgico de Azovstal, ao sul de Mariupol, para a retirada de civis abrigados no local, considerado o último bastião da resistência ucraniana na cidade portuária sitiada há semanas.

O Ministério da Defesa de Moscou informou, em comunicado, que qualquer civil poderia deixar o local, para qualquer direção que desejasse. Pouco depois, porém, a vice-primeira-ministra ucraniana, Irina Vereschuk, disse que "infelizmente não há nenhum acordo para um corredor humanitário em Azovstal" e, na sequência, um assessor de Zelenski alegou que ações militares russas continuavam a ocorrer no local.

"O inimigo continua a agredir nossas defesas na região, com ataques aéreos e de artilharia, atirando com tanques e tentando avançar com tropas, violando a ordem do próprio comandante", disse Oleksi Arestovitch. Ele fez referência a declarações de Putin no final da semana passada.

Ao declarar vitória em Mariupol, numa narrativa contestada por Kiev e Washington, o presidente orientou o Exército a não atacar combatentes ucranianos cercados em Azovstal: em reunião transmitida pela TV, disse ao ministro Serguei Choigu que bloqueasse a usina "para que nem mesmo uma mosca pudesse passar", em vez de tentar invadi-la.

Nesta segunda, a agência russa RIA ainda noticiou que a situação de Mariupol está entre os temas que serão debatidos por Putin em encontro com o secretário-geral da ONU, António Guterres, programado para esta terça na capital.

O desencontro sobre a pausa nas hostilidades em Azovstal teve reflexos nos esforços para negociações de paz. Diplomata russo nas Nações Unidas, Dmitri Polianski disse à agência russa RIA que um cessar-fogo geral "não seria uma boa opção agora". Segundo ele, isso seria apenas uma "oportunidade para as forças ucranianas se reagruparem e montarem mais provocações".

Mais tarde nesta segunda, o chanceler russo, Serguei Lavrov, falou sobre as negociações de paz com a Ucrânia e o futuro do conflito. Segundo o ministro, que garantiu que manterá o diálogo com Kiev, a crise irá terminar com um acordo, mas seu conteúdo dependerá da situação militar.

Lavrov criticou os ucranianos por apenas imitar negociações. "A boa vontade tem limites. E se não for recíproca, não contribui para o processo de negociação", disparou, de acordo com agências de notícias russas. "Mas continuaremos negociando com a equipe enviada por Zelenski, e os contatos continuarão."

Em uma entrevista à TV estatal russa, o chanceler trouxe de volta a ameaça nuclear, afirmando que Moscou quer descartar esse tipo de conflito apesar dos altos riscos que diz haver neste momento. "Não gostaria de elevar esses riscos artificialmente. Muitos gostariam disso. O perigo é sério, real e não devemos subestimá-lo."

Kiev acusou ataques de Moscou também em outras partes do país. Segundo a empresa ferroviária estatal, no espaço de uma hora cinco estações de trem foram alvo de ações, no oeste e no centro da Ucrânia, deixando vítimas —de acordo com a agência AFP, a alegação seria de cinco mortos e 18 feridos, mas a informação não pôde ser verificada de forma independente.

A alegação de Moscou é que as linhas eram usadas para o fornecimento de armas ocidentais para as tropas de Kiev no Donbass.

Avisos de ataques aéreos soaram por todo o país na manhã, por um período mais longo do que o usual nos tempos recentes.

O próprio Ministério da Defesa russo anunciou que realizou ataques com mísseis de longo alcance mirando a refinaria de petróleo de Krementchuk, na região do rio Dnipro, e ao menos 56 instalações militares não especificadas. No primeiro caso, o governo local reportou que uma pessoa morreu e sete ficaram feridas. A administração de Vinnitsia também relatou vítimas após foguetes atingirem duas cidades da região central.

Em Donestk, o governador Pavlo Kirilenko relatou que quatro pessoas, incluindo duas crianças, foram mortas na região em meio à ofensiva russa.

O boletim da inteligência britânica desta segunda apontou que Moscou teve poucos avanços expressivos nos últimos dias. Do outro lado da fronteira, na região de Briansk, um depósito de combustível foi atingido por um incêndio. Nenhum dos lados vinculou publicamente o episódio à guerra, mas a Rússia acusou a Ucrânia de um ataque de helicóptero na região na semana passada —Kiev já se recusou a comentar ou negou acusações de ataques transfronteiriços.​

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