Falhas na segurança de Cristina Kirchner facilitaram ataque na Argentina

Mesmo com mais policiais, não havia cordão de isolamento na hora do ataque, diz imprensa local

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São Paulo e Santiago

A tentativa de um brasileiro de disparar uma arma contra a vice-presidente argentina na noite desta quinta-feira (1º) colocou em evidência o que a imprensa local chamou de "graves falhas da Polícia Federal", que teriam permitido que o agressor ficasse a poucos centímetros de Cristina Kirchner.

Embora o número de seguranças da dirigente tivesse sido aumentado nos últimos dias, não havia um cordão de contenção que impusesse uma distância entre o público e a vice-presidente, medida que poderia ter deixado o atirador mais longe de seu alvo.

Segundo o jornal La Nación, a operação de segurança de um presidente ou chefe de Estado consiste em anéis ou perímetros vigiados por seguranças, mas Cristina estava bem próxima de uma multidão de apoiadores —seu prédio virou ponto de peregrinação e atos pró e contra a ex-mandatária desde um pedido de prisão ser apresentado pelo Ministério Público em uma ação na Justiça.

Reprodução da TV pública mostra momento em que homem se aproxima da vice-presidente Cristina Kirchner com arma em Buenos Aires - TV Pública/AFP

Outra falha apontada por analistas foi a ação dos policiais federais que faziam a segurança de Cristina. À paisana, em vez de monitorar o ambiente para procurar possíveis ameaças, eles se dedicaram a olhar para a vice-presidente, em atitude passiva e apenas para conter os manifestantes, segundo La Nación. "Nenhum dos agentes levou a ameaça em consideração", escreveu o veículo.

Como é possível ver nas imagens publicadas nas redes sociais e captadas pelas TVs, os policiais não protegeram a vice nos momentos após a tentativa de disparo nem montaram um corredor de fuga que a permitisse sair dali —desconsiderando a possibilidade de, por exemplo, haver um segundo atirador.

Segundo La Nación, a segurança de Cristina é feita por quase cem policiais. Nos últimos dias, com a movimentação em torno da residência dela em Buenos Aires, houve um acréscimo de 20 agentes. Só o presidente Alberto Fernández conta com um efetivo maior no país.

O órgão responsável pela proteção da vice é uma divisão comandada pela Polícia Federal, cujo chefe político é o ministro da Segurança, Aníbal Fernández —foi ele quem reforçou a proteção de Cristina recentemente. A movimentação dela e de sua equipe de segurança é supervisionada por Diego Carbone, delegado inspetor aposentado da Polícia Federal.

O atirador usou uma arma da marca Bersa de calibre 32. Caso ela não tivesse falhado, "certamente resultaria num disparo mortal, dada a curta distância que estava da vice-presidente", disse ao jornal Clarín Raúl Torre, professor de criminalística.

O atirador apertou o gatilho, mas a arma não disparou, provavelmente porque não havia bala na câmara de disparo, embora o revólver estivesse carregado. Essa é a hipótese principal com a qual trabalha a Polícia Federal.

Para que esse modelo de revólver funcione, é necessário engatilhá-lo, com a primeira bala sendo alocada na câmara de disparo puxando uma espécie de alavanca na parte traseira. As balas seguintes, então, se carregam automaticamente. O revólver comporta oito projéteis. O problema pode ter ocorrido também por imperícia ou falha na munição.

A pistola foi fabricada nos anos 1970 pela Bersa, empresa argentina que hoje é a principal fornecedora para as forças de segurança do país e se destinava ao mercado civil.

A Justiça classificou o atentado, cometido pelo brasileiro Fernando Andrés Sabag Montiel, como tentativa de homicídio qualificado, e afirmou que ele está em condições de depor, o que pode acontecer ainda nesta sexta (2).

Em sua casa foram encontradas cem balas, sua identidade e documentos de sua namorada —a polícia chegou ao local, na cidade-satélite de Buenos Aires San Martín, após receber informações de uma pessoa que foi à delegacia de madrugada.

A juíza responsável pelo caso, María Eugenia Capuchetti, ordenou que se comece a perícia da arma com a qual Sabag tentou atirar na vice-presidente. O atirador já tinha antecedente na polícia, por porte de arma branca em março do ano passado.

Capuchetti foi à sede da Polícia Federal argentina para colher o depoimento de Sabag por volta das 21h desta sexta (2), mas ele se recusou a ser interrogado, segundo a imprensa local. A vice-presidente contou sua versão do caso pela manhã, em sua casa, que ela transformou numa espécie de quartel-general nas horas após o crime. Segundo o jornal argentino La Nación, ela relatou não ter se dado conta de que uma arma havia sido apontada perto de seu rosto, só percebendo o que acontecera ao chegar em casa.

O presidente Alberto Fernández fez um pronunciamento logo após o atentado no qual atribuiu o caso a discursos de ódio, dizendo que eles engendram violência. "Esse caso tem gravidade institucional. Atentou-se contra nossa vice-presidente e nossa paz social foi alterada. Afeta nossa democracia, nossa convivência sofre as consequências dos discursos de ódio", afirmou.

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