Descrição de chapéu Guerra da Ucrânia Rússia

Rússia retoma ataques contra Ucrânia após países renovarem acordo de grãos

Em dia de 1ª nevasca, Kiev diz que rival mira produção de gás e relata 10 milhões sem energia

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Kiev | Reuters

Rússia e Ucrânia concordaram em estender por mais quatro meses a validade do acordo que assegura a exportação de grãos pelo mar Negro, anunciou a ONU nesta quinta-feira (17). O mecanismo cria um corredor marítimo seguro para que os produtos sejam escoados e é visto como central para aliviar a crise de alimentos que tem como um de seus fatores a própria guerra no Leste Europeu.

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, disse que a organização está comprometida a remover obstáculos à exportação de alimentos e fertilizantes russos, parte do acordo considerada crucial por Moscou. Não foram estabelecidos prazos, no entanto.

Navio com bandeira do Panamá chega ao porto de Foynes, na Irlanda, com 33 mil toneladas de milho ucraniano após partir de Odessa - Clodagh Kilcoyne - 20.ago.22/Reuters

A ONU e Kiev pleiteavam que o acordo, estabelecido inicialmente em julho, fosse estendido por mais um ano. O prazo final de quatro meses se deu após negociação com o governo russo, que chegou a ameaçar a suspensão do mecanismo no início de novembro.

Até aqui, cerca de 11 milhões de toneladas de produtos agrícolas que estavam parados em portos ucranianos desde o estopim da guerra, em fevereiro, foram embarcados sob o acordo de grãos, que conta também com apoio do governo da Turquia. O número inclui 4,5 milhões de toneladas de milho e 3,2 milhões de toneladas de trigo.

Kiev também tentou, sem sucesso, alargar o acordo para que, além dos três portos contemplados —Odessa, Tchornomorsl e Pivdenni, com capacidade para embarcar cerca de 3 milhões de toneladas por mês—, fossem incluídos portos de Mikolaiv, responsáveis por 35% das exportações de alimentos do país antes da invasão russa.

O secretário de Estado americano, Antony Blinken, falando em Bancoc, aonde viajou para o fórum da Apec (Foro de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico), sugeriu que Moscou só aceitou renovar o acordo porque o mundo não aceitaria uma recusa no assunto.

"Enquanto a Rússia parece ter ouvido a mensagem do G20 sobre o acordo de grãos, o presidente [Vladimir] Putin continua ignorando apelos para a desescalada do conflito e opta por lançar dezenas de mísseis na infraestrutura ucraniana", disse Blinken.

Já o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, sugeriu que exportações russas de grãos sejam enviadas inicialmente para a Turquia, onde seriam transformadas em farinha e enviadas a países da África, continente afetado pela escassez de alimentos.

Moscou reclama que as garantias para assegurar que suas exportações sejam retomadas são insuficientes. Os produtos agrícolas não estão sujeitos à série de sanções econômicas contra Moscou aplicadas pelo Ocidente, mas os riscos de conflitos no mar Negro fazem com que poucas empresas e cargueiros aceitem bancar o transporte.

Com o aumento dos preços do gás —também consequência da guerra—, a Europa suspendeu 70% de sua produção de fertilizantes. Somado às restrições ao produto russo, o fator levou a um aumento de 250% no preço em comparação com os valores pré-pandemia de Covid, estima a ONU.

O anúncio da extensão do acordo se deu em meio a novos ataques russos em território ucraniano, dois dias depois da maior operação de lançamento de mísseis vista até aqui na guerra. Na terça (15), um artefato chegou a atingir um vilarejo na Polônia, matando duas pessoas e gerando temores de um ataque de Moscou a um país-membro da Otan —no dia seguinte a aliança militar e Varsóvia distensionaram o cenário citando a possibilidade maior de a explosão resultar de um acidente com um míssil de Kiev,

Nesta quinta, uma missão ucraniana chegou ao país vizinho, e o presidente Andzrej Duda disse, em Przewodow, que não se opõe a uma análise do local pela delegação de Kiev, citando apenas a anuência dos EUA, que também investigam a explosão.

Volodimir Zelenski nega responsabilidade de seu país no episódio e mantém rara dissidência da tônica de seus aliados ocidentais. "Não sabemos ao certo o que aconteceu, o mundo não sabe, mas tenho certeza que foi um míssil russo", disse, mordendo e assoprando ao relativizar a questão.

No front, explosões foram relatadas durante a manhã desta quinta perto do porto de Odessa, no sul, na capital, Kiev, e na cidade de Dnipro, segundo a agência Reuters. Autoridades de Zaporíjia disseram que duas pessoas morreram em um ataque com mísseis durante a noite. Em Kharkiv, três teriam ficado feridas.

"Eles [os russos] estão bombardeando nossa produção de gás e nossas fábricas de mísseis em Dnipro e Iujmach", disse o premiê ucraniano, Denis Chmihal.

A empresa estatal de energia Naftogaz confirmou que instalações de produção no leste foram parcialmente destruídas, e o braço da ONU para a Coordenação de Assuntos Humanitários alertou para uma possível crise humanitária na Ucrânia neste inverno —Kiev registrou sua primeira nevasca da temporada.

Segundo o órgão, cortes de energia têm afetado também o bombeamento de água. Autoridades da capital dizem que a próxima semana "será difícil", com temperaturas caindo a até -10°C. Segundo o Kremlin, o sofrimento dos civis na Ucrânia é consequência da recusa de Kiev em negociar.

"Locais civis são os alvos [de Moscou]. A Rússia está em guerra contra a eletricidade e calefação do povo", afirmou Zelenski, que disse que 10 milhões de ucranianos estão sem energia, principalmente em Odessa, Vinnitsia, Sumi e Kiev.

Rua na cidade de Odessa, na Ucrânia, fica no escuro após ataque da Rússia à malha de distribuição energética - Oleksandr Gimanov - 17.nov.22/AFP

O cenário fez com que a União Europeia anunciasse o fornecimento de geradores e kits de reparo da rede elétrica para a Ucrânia como nova prioridade da ajuda humanitária. O chefe da diplomacia do bloco, Josep Borrell, disse nesta quinta que um acordo de paz na Ucrânia é improvável até que a Rússia retire suas tropas, mas que Moscou não mostrou indicações nesse sentido.

"Temo que a Rússia não esteja pronta para se retirar e, se não se retirar, a paz não será possível", disse o espanhol em Samarcanda, no Uzbequistão. "É a Rússia que tem que tornar a paz possível, o agressor tem que se retirar se quiser uma paz."

Moscou, que reiteradamente nega mirar alvos civis, ainda nesta quinta negou que cogite usar armas nucleares no conflito. "Ninguém do lado russo está discutindo isso", disse o porta-voz Dmitri Peskov, culpando países europeus por trazerem o tema à tona. "Isso aumenta as tensões a um ponto inaceitável."

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.