Ucraniana da cidade de Zelenski se apega à fé durante refúgio no Brasil

Olena Zibrova, 66, fugiu da guerra para Belo Horizonte e ora pelo fim do conflito que já dura 10 meses

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Belo Horizonte

A vida de Olena Zibrova, 65, é marcada pela devoção a Jesus Cristo. Desde que se curou de um câncer há 30 anos, a pastora carrega a Bíblia em praticamente todos os lugares aonde vai. Não foi diferente quando ela se encontrou com a Folha no restaurante de um supermercado em Belo Horizonte. Antes de falar sobre sua vida na capital mineira, após meses fugindo da Guerra da Ucrânia, ela abriu o livro cristão e rezou o pai-nosso em português.

"Conheço algumas passagens da Bíblia de cor, mas em português não sei muito bem", explicou. Olena chegou a Belo Horizonte no final de abril, quando deixou seus três filhos e quatro netos na Ucrânia em decorrência da invasão russa. Seu marido, com quem viveu por 47 anos, tinha acabado de morrer devido às complicações de um AVC.

Olena Zibrova, 65, refugiada ucraniana que fugiu para o Brasil em abril; hoje, ela mora em Belo Horizonte
Olena Zibrova, 65, refugiada ucraniana que fugiu para o Brasil em abril; hoje, ela mora em Belo Horizonte - Pedro Lovisi -23.set.22/Folhapress

A escolha pelo Brasil, segundo ela, foi fruto da vontade de Deus. Antes da guerra, ela mal conhecia o país e, muito menos, a língua portuguesa –Olena fala ucraniano e russo. Seus filhos, porém, insistiram, e ela buscou apoio na GKPN (Global Kingdom Partnership Network), organização de missionários e empresários cristãos presente em mais de cem nações.

"Meus filhos estavam muito preocupados comigo. Meu marido faleceu no dia 19 e, no dia 20, eles pediram para eu me mudar para o Brasil", afirma. Aqui, ela e outros 12 refugiados foram acolhidos pela Igreja Batista Central, em uma região nobre de BH, onde acompanham os cultos semanalmente. As pregações são traduzidas para o ucraniano por Uliana Labiak —que também auxiliou na entrevista com Olena. A igreja fornece tratamentos de saúde e de beleza, dinheiro para despesas diárias e escola para crianças.

Antes de fugir da guerra, a ucraniana trabalhava como missionária de sua própria igreja, fundada há três décadas em Krivii Rih, cidade do presidente Volodimir Zelenski. Hoje, ela tenta manter a função, conversando semanalmente com os pastores distribuídos por várias regiões da Ucrânia, além de Alemanha, República Tcheca e Polônia –as três nações abrigaram os religiosos durante a guerra.

Mas a distância dificulta o contato com os fiéis, e as tarefas diárias foram designadas ao seu filho, Andrei, 46, que hoje mora sozinho em uma cidade do centro da Ucrânia após organizar a ida dos filhos e da esposa para a Alemanha. Ele é responsável por cuidar de pessoas que fogem de regiões muito afetadas pela guerra. A casa onde Olena morava também foi transformada em abrigo para refugiados.

Suas filhas, de 36 e 22 anos, também tiveram que sair de casa. A mais velha cogitou vir ao Brasil, mas foi convencida pelo marido a se mudar para uma cidade em território ucraniano mesmo. Dias antes da escolha, os russos bombardearam sua residência em Energodar –onde fica a usina nuclear de Zaporíjia, alvo de bombardeios e de constantes alertas da ONU.

"Talvez meus filhos venham ao Brasil; eles estão com medo de um ataque nuclear", diz Olena, em referência às ameaças do presidente Vladimir Putin de usar armas de destruição em massa na guerra se necessário.

A ucraniana se diz, na medida do possível, adaptada ao Brasil. Diariamente, ela participa de atividades oferecidas pela igreja, como fabricação de sabonetes e cursos de costura e português. O idioma ainda é um obstáculo, mas Olena decorou frases como "Deus te abençoe" e "Deus abençoe a sua família". Para ela, o maior entrave é reconhecer os sons das letras do alfabeto —no cirílico, por exemplo, a letra P tem som de R e a H, de N.

A culinária mineira, por outro lado, não é um problema. Ela diz ter gostado do pão de queijo, ainda que considere o pirojki (pãozinho assado com diferentes recheios) mais gostoso. O feijão está reprovado: "Para os ucranianos, nossa comida é sempre a melhor."

Naturalmente, Olena sente falta de sua terra natal e ainda sonha que o conflito acabe em breve. "Antes orávamos para ganhar a guerra contra os russos, mas agora oramos como Jesus Cristo: 'Pai, perdoa-lhes, pois eles não sabem o que fazem'."

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