Rússia ordena 1º cessar-fogo da guerra; Ucrânia rejeita e vê hipocrisia

Kremlin faz pausa para o Natal ortodoxo; EUA, Alemanha e França vão enviar blindados de combate

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São Paulo

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, ordenou o primeiro cessar-fogo desde que suas forças invadiram a Ucrânia, em fevereiro de 2022, e sugeriu o mesmo a Kiev —que rejeitou a proposta, considerada hipócrita.

Segundo o Kremlin, os ataques ao longo das frentes de batalha serão suspensos por 36 horas, a partir do meio-dia (6h em Brasília) desta sexta (6), visando facilitar a celebração do Natal ortodoxo, no sábado (7).

Igreja ortodoxa destruída em Bohoroditchne, vila na região de Donetsk, um dos pontos focais da guerra
Igreja ortodoxa destruída em Bohoroditchne, vila na região de Donetsk, um dos pontos focais da guerra - Dimitar Dilkoff - 4.jan.23/AFP

Putin afirma ter seguido orientação do patriarca da Igreja Ortodoxa russa, Cirilo, seu aliado político que sofreu diversas críticas por apoiar a ação militar contra os ucranianos.

"A partir do fato de que um grande número de cidadãos de fé ortodoxa mora nas áreas das hostilidades, pedimos ao lado ucraniano para declarar um cessar-fogo e permitir a eles participar dos serviços na véspera e no dia do Natal", disse Putin, de acordo com o comunicado.

Tanto Rússia quanto Ucrânia são países majoritariamente cristãos ortodoxos, embora Kiev tenha deixado de aceitar a autoridade de Cirilo em 2019, no maior cisma do cristianismo desde a reforma protestante do século 16. O Natal é celebrado em janeiro porque as denominações ortodoxas mantiveram o calendário juliano, que deixou de ser usado no Ocidente a partir de 1582 em favor do gregoriano.

O assessor presidencial da Ucrânia Mikhailo Podoliak afirmou no Twitter que a proposta de Cirilo era "uma armadilha cínica e elemento de propaganda". Depois, ante o comunicado de Putin, escreveu: "A Federação Russa deve sair dos territórios ocupados, e só aí haverá trégua temporária. Guarde a hipocrisia para si".

Mais tarde, o presidente Volodimir Zelenski afirmou que a trégua serviria para "parar nossos avanços no Donbass (leste do país)" e para que os russos tivessem tempo para trazer mais armamentos à região.

"Eu reluto em responder a qualquer coisa que Putin diga. Achei interessante: ele estava pronto para bombardear hospitais, maternidades e igrejas no dia 25 [Natal ocidental] e no Ano-Novo. Acho que ele está tentando achar um pouco de oxigênio", disse a repórteres o presidente americano, Joe Biden.

Outras autoridades ocidentais repetiram a alegação de que veem a proposta com ceticismo, chamando-a de fraudulenta e hipócrita.

O movimento de Putin parece jogar para a plateia, no mesmo dia em que voltou a dizer que aceita negociar a paz com a Ucrânia se o governo de Zelenski "levar em conta as novas realidades territoriais", segundo relato do Kremlin de uma conversa do russo com o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, que busca mediar conversas entre os beligerantes.

O termo implica que a Rússia se daria por satisfeita se Kiev aceitasse a cessão das quatro regiões anexadas por Putin em 30 de setembro, apesar de os russos não as controlarem integralmente. Além disso, Moscou absorveu a Crimeia em 2014, este um fato político consumado para a grande parte da comunidade internacional, ainda que não reconhecido.

Kiev não aceita a excisão de quase 20% de seu território e promete lutar até expulsar a Rússia. Ambos os países já estiveram unidos no passado, sob o império dos Románov (1613-1917) e na União Soviética (1922-1991), e Putin já deixou claro que considera a Ucrânia parte da Rússia. Essa é outra trava: os ucranianos afirmam que, cedendo território, nada impedirá Moscou de voltar a atacar no futuro.

Há alternativas, como a do ex-secretário de Estado dos EUA Henry Kissinger, de que Kiev aceite perder a Crimeia e as áreas controladas por separatistas no Donbass de 2014 até a véspera da invasão de 2022.

Enquanto isso, os combates seguem, em especial na região de Donetsk, uma das áreas anexadas e em que o controle russo é de pouco mais de 50% do território. Zelenski queixou-se na quarta (4) de que o Ocidente deveria lhe enviar novos tanques para operar na região.

Só há disposição, a priori, para o fornecimento de blindados menos potentes, como os AMX-10 usados que o presidente Emmanuel Macron (França) prometeu enviar na quarta.

Após um telefonema entre Biden e o premiê alemão, Olaf Scholz, a Casa Branca informou que os EUA fornecerão até 50 blindados de infantaria Bradley, enquanto o país europeu cederá modelos Marder. Junto com o AMX-10, são os mais potentes armamentos do tipo enviados pelo Ocidente para a guerra até aqui, mas não são tanques de guerra ocidentais como quer Zelenski —que até aqui recebeu cerca de 230 tanques soviéticos T-72 da Polônia.

Os russos seguiram com ataques de artilharia e, na Belarus, novas unidades de Moscou chegam a cada dia. Segundo o Ministério da Defesa da ditadura aliada ao Kremlin, haverá novos exercícios militares da força conjunta dos dois países, o que aumenta a suspeita de que uma nova ofensiva poderá envolver elementos belarussos em algum momento deste ano.

Até aqui, Minsk só permitiu o uso de seu território por forças russas, mas não se envolveu diretamente na guerra. O ditador Aleksandr Lukachenko, que esteve recentemente com Putin, nega que irá participar do conflito, mas de forma cada vez menos convincente.

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