Descrição de chapéu Guerra da Ucrânia Rússia

Fatura do apoio turco à Suécia na Otan começa a aparecer

EUA dizem que vão liberar venda de caças F-16, e Ancara espera apoio para entrar na União Europeia

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São Paulo

Um dia depois da surpreendente mudança de posição turca e da aprovação da entrada da Suécia na Otan, a Turquia começou a apresentar nesta terça-feira (11) sua fatura pelo ato, que pode salvar a imagem da cúpula da aliança militar ocidental em Vilnius, na Lituânia.

Segundo o conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Jake Sullivan, o governo americano encaminhará com o Congresso a autorização para a exportação de novos caças F-16 a Ancara. O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, apressou-se em dizer que isso nada tem a ver com a decisão de Recep Tayyip Erdogan.

Um caça F-16 turco decola durante exercício da Otan em Jagel, no norte da Alemanha, em junho
Um caça F-16 turco decola durante exercício da Otan em Jagel, no norte da Alemanha, em junho - Axel Heimken/AFP

Não é fato, claro. Os EUA têm segurado o pedido turco de revitalizar sua frota de 252 F-16 desde que Ancara apresentou obstáculos ao pleito sueco, feito em conjunto com a Finlândia em maio de 2022.

Também resta a ver se os suecos apertarão o cerco a exilados curdos, opositores de Erdogan tachados de terroristas na Turquia, algo que, somado a protestos que incluíram queimas do Alcorão na Suécia, foi ponto central das objeções. Mais difícil, contudo, é ver a demanda apresentada publicamente nesta segunda (10) por Erdogan, para que a União Europeia reabra negociações, suspensas desde a tentativa de golpe contra o turco, em 2016, para que o país faça parte do bloco.

Historicamente, nações como a França resistem à entrada turca por considerar que o país, muçulmano, mais pobre e de viés autoritário, pode acabar por gerar um fluxo migratório indesejado. Ancara vê apenas xenofobia nisso. E há outros problemas, como a rixa histórica com a Grécia, de resto parceira na Otan.

A relação turca com a Otan, que precisa de sua posição geográfica ligando Europa ao Oriente Médio e ameaçando o sul russo, foi turbulenta desde sua adesão, em 1952, justamente com a rival Grécia.

Ambos os países se enfrentaram na partilha do Chipre, e hoje disputam áreas petrolíferas em volta da ilha no Mediterrâneo. Com efeito, Paris fez um acordo militar para armar Atenas com caças modernos, entre outros equipamentos, o que piorou ainda mais a relação com Erdogan.

Mas o nó sempre foram os EUA, fornecedores primários de armamentos aos turcos. Após o golpe fracassado de 2016, Erdogan exigiu a extradição de um clérigo acusado de chefiar o movimento, o que o então presidente Donald Trump negou.

O turco então se aproximou mais do russo Vladimir Putin, com quem tem boa relação e negócios. Comprou baterias antiaéreas S-400, o que irritou os EUA, temerosos com o risco de vazamento de segredos sobre o desempenho de seu caça furtivo F-35 —construído por um consórcio multinacional integrado pela Turquia.

Resultado, expulsaram Ancara do programa do F-35, o que levou a maior cooperação militar entre os rivais históricos russos e turcos, que apoiam lados distintos nas guerras civis da Síria e da Líbia. O processo só foi interrompido pela Guerra da Ucrânia, na qual, até por ser da Otan, Erdogan ficou do lado ucraniano.

Mas é um apoio equilibrado, já que a boa relação com Putin prossegue, ainda que com ruídos como a libertação de comandantes de uma unidade neonazista ucraniana que estavam exilados na Turquia. Eles foram de volta a Kiev com Zelenski, que visitou Erdogan no fim de semana, irritando Moscou.

Ao mesmo tempo, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, afirmou "compreender" a posição turca na Otan. Acrescentou, contudo, que Erdogan não deve ter ilusões quanto à admissão na UE. "Ninguém quer ver a Turquia na Europa, digo, os europeus. E sobre isso nossos parceiros turcos não devem usar lentes róseas."

Ambos os países nórdicos deixaram a histórica neutralidade —200 anos no caso sueco, 70 no finlandês— devido à invasão da Ucrânia, que fez a dupla crer estar sob risco de ataque por Moscou. Para entrar no clube, todos os países têm de aprovar a adesão no Parlamento, e é o que Erdogan prometeu fazer. A seu reboque, assim como no caso finlandês, está a iliberal Hungria, que já disse que seguirá Ancara.

A confirmação da Suécia por turcos e húngaros criará uma situação estratégica nova para a Rússia. O mar Báltico será todo margeado por adversários de Moscou, virando assim um "lago da Otan", como diplomatas gostam de dizer. A Rússia tem uma saída histórica para a região pelo golfo da Finlândia e detém o encrave de Kaliningrado, base de sua Frota do Báltico.

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