Eleição presidencial na Argentina tem 2ª participação mais baixa em 40 anos

Apenas 77,7% dos eleitores votaram em pleito disputado pelas três principais forças do país

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Buenos Aires

As urnas se fecharam às 18h deste domingo (22) na Argentina e registraram a segunda participação mais baixa para uma eleição geral em primeiro turno desde 1983, de acordo com a Direção Nacional Eleitoral.

Entre os mais de 35 milhões de eleitores habilitados a votar, 77,7% compareceram às urnas, contra 80% no pleito de 2019. O número, porém, foi mais alto do que nas primárias de agosto, quando o índice ficou em 70%.

Desde a redemocratização na Argentina, somente a eleição presidencial de 2007 teve participação inferior no primeiro turno, com presença de 76,2% dos eleitores.

Sergio Massa, Javier Milei e Patricia Bullrich
Os candidatos à Presidência da Argentina Sergio Massa, Javier Milei e Patricia Bullrich - AFP, Reuters e Xinhua

A princípio, a Direção Nacional Eleitoral havia classificado a atual disputa com o número mais baixo: às 18h, a taxa de participação tinha ficado em 74%. Mas, como ainda havia pessoas nas filas esperando a sua vez, esse percentual subiu, e a informação foi atualizada.

Ainda assim, foi um patamar baixo dada a grande expectativa quanto ao desfecho, com a possibilidade de haver segundo turno em 19 de novembro ou de um dos três candidatos a presidente ser eleito já no primeiro. Os resultados oficiais devem ser publicados por volta das 22h.

Além do presidente, os argentinos elegerão neste domingo metade da Câmara de Deputados, um terço do Senado e alguns governadores importantes, como o da Província e o da cidade de Buenos Aires. O voto é obrigatório para quem tem de 18 a 70 anos e opcional para quem tem de 16 a 18.

Na disputa presidencial, o deputado ultraliberal Javier Milei, vencedor das primárias e favorito de acordo com as pesquisas, tenta alcançar os 45% dos votos válidos ou 40% mais 10 pontos de diferença para vencer já no primeiro turno. Líder do A Liberdade Avança, ele se apresenta como uma rara terceira via na Argentina.

Do lado de fora do Hotel Libertador no centro da capital, de onde o candidato acompanhará os resultados, centenas de apoiadores com bandeiras, bonés e instrumentos entoam gritos criados durante a campanha, como "a casta tem medo", "que se vão todos [os políticos], que não fique nenhum" e "viva a liberdade, caralho".

Contra ele concorrem Sergio Massa, que é ministro da Economia e cabeça de chapa da coalizão peronista União pela Pátria, e Patricia Bullrich, ex-presidente do partido de Mauricio Macri (PRO), da oposição republicana Juntos pela Mudança. Ambas as campanhas se dizem otimistas pela possibilidade de um segundo turno.

Apesar do clima de incertezas, a votação deste domingo se deu de forma tranquila, sem grandes incidentes e com menos tensão do que nas eleições primárias de agosto. Naquela ocasião, uma regra que impôs o voto eletrônico para candidatos ao governo da cidade de Buenos Aires causou longas filas e brigas em diversos locais.

O voto de Milei em uma universidade de Buenos Aires, porém, teve empurra-empurra, pessoas passando mal e bate-boca com jornalistas, além de cantos de torcida e "Parabéns para Você". O candidato completa 53 anos no mesmo dia em que pode, eventualmente, ser eleito.

Ao votar, Milei repetiu frases que costuma dizer: "Hoje estamos concorrendo às eleições mais importantes das últimas décadas. Decidiremos se queremos voltar a construir uma Argentina potência ou nos converter na maior favela do mundo".

O peronista Sergio Massa, principal cotado para disputar um eventual segundo turno com Milei, votou em Tigre, cidade nos arredores de Buenos Aires da qual foi prefeito.

Ele lembrou os 40 anos de democracia no país e afirmou: "Temos a enorme tarefa a partir de 10 de dezembro [data da posse do próximo presidente] de, governe quem governe, resolver os inúmeros problemas da Argentina".

A macrista Patricia Bullrich, terceira colocada nas pesquisas, exerceu o direito no centro de convenções La Rural, no bairro turístico de Palermo, e disse que já se imagina festejando. "É uma sensação muito impressionante ser candidata da [coalizão] Juntos pela Mudança. Estou feliz com o que temos feito", declarou.

Com o governo pressionado pela crise econômica, a atual vice-presidente da Argentina, Cristina Kirchner, aproveitou a votação para criticar o presidente Alberto Fernández e disse que, após o resultado, espera encontrar um país mais sensato, em que exista consenso e diálogo, segundo o jornal Clarín.

O presidente da Argentina, Alberto Fernández, e sua vice, Cristina Kirchner, durante evento em Buenos Aires no ano passado - Agustin Marcarian - 3.jun.22/Reuters

Quando Fernández votou pela manhã em Porto Madero, foi questionado por jornalistas sobre o legado de sua gestão. Ele disse que aguardaria o resultado para fazer qualquer tipo de autocrítica.

Em uma escola pública no bairro de Belgrano, em Buenos Aires, o zelador Roberto Verón, 58, pedia união. "Só quero que o país tenha um pouco de unidade, sou cristão. Se estamos sempre brigando, não podemos seguir adiante", disse ele, que não quis declarar seu voto.

Homem de cabelos brancos
O zelador Roberto Verón, 58, vota em Belgrano, bairro de classe média-alta em Buenos Aires - Júlia Barbon/Folhapress

Assim como muitos argentinos, ele foi às urnas sem saber o que vai acontecer com suas economias em pesos nesta segunda (23). "Estamos todos esperando."

O clima no país vizinho é de profunda incerteza diante de uma eleição que pode mudar drasticamente, ou não, o dia a dia da população. O pleito ocorre depois de meses de uma aflitiva espera vendo o dólar e os preços subirem, enquanto o governo tenta segurar as pontas até que se defina quem será presidente a partir de 10 de dezembro, no lugar do ausente Fernández.

O temor, quase uma certeza, é de que o dólar dispare com a divulgação dos resultados, num país em que os preços sobem junto com a moeda americana —movimento que é comum pré-eleições, mas se intensificou nos últimos meses.

A desilusão com a situação atual faz uma parte dos eleitores se inclinarem a Milei, que promete dolarizar a economia, fechar o Banco Central e cortar radicalmente os gastos públicos.

É o caso do representante comercial Julio González, 56. "O que as pessoas pensam é: todos já me ferraram, que venha um diferente", afirma ele, enfatizando que é de direita, não de extrema direita.

Já a estudante Sol Pisetta, 23, que trabalha como passeadora de cachorros e é fiscal eleitoral da aliança União pela Pátria, diz acreditar que as pessoas estejam votando em Milei apenas por raiva e pelo fato de ele nunca ter ocupado um cargo no Executivo (ele é deputado desde 2021), mas não por suas propostas.

Jovem de cabelos castanhos compridos e bolsa a tiracolo
A estudante Sol Pisetta, 23, vota em Belgrano, bairro de classe média-alta em Buenos Aires - Júlia Barbon/Folhapress

"Muita gente diz que vai votar no Milei, mas, quando você diz que ele vai tirar o 13º salário, os benefícios sociais das pessoas, dizem ‘ah é?’. Ou seja, não sabem direito em quem estão votando", afirma Sol.

"Muita gente acha que o salário em pesos será automaticamente transformado em dólares, e não que vai diminuir muito quando for convertido", afirma.

Erramos: o texto foi alterado

Versão anterior deste texto havia sustentado, com base na Direção Nacional Eleitoral, que a eleição deste ano tinha tido a taxa de participação mais baixa para um primeiro turno em 40 anos. O dado foi atualizado posteriormente pela DNE.

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