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Por que visita de secretário de Estado dos EUA à China não passou de uma cortesia

Encontro de Xi Jinping e Antony Blinken não alcançou acordos significativos; leia edição da newsletter China, terra do meio

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Igor Patrick
Washington

Esta é a edição da newsletter China, terra do meio desta terça-feira (30). Quer recebê-la toda semana no seu email? Inscreva-se abaixo.

Pela segunda vez em menos de um ano, Xi Jinping recebeu, na sexta-feira (26), o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, em Pequim. O objetivo do encontro seria manter os canais de comunicação abertos, embora os dois lados não tenham alcançado nenhum acordo significativo em nenhuma das dezenas de questões que ainda afastam americanos e chineses.

Xi ateve-se à linha narrativa que o Partido Comunista vem usando desde o encontro entre ele e Joe Biden em San Francisco, no final de 2023.

  • Disse que EUA e China devem ser "parceiros, não adversários" e que o mundo "é grande o suficiente para acomodar o desenvolvimento e a prosperidade" dos dois países;

  • Afirmou também esperar de Washington uma "visão positiva e construtiva" no trato com Pequim.

Blinken também não saiu muito do script, embora tenha mandado sinais de discordância em relação a pontos das relações econômicas com os chineses.

  • Declarou que os EUA não querem "frear o desenvolvimento da China", mas completou dizendo que "a maneira como a China cresce importa";

  • Pediu uma relação em que empresas americanas sejam tratadas de "forma justa e igual" e voltou a citar os riscos de excesso de capacidade industrial chinesa em setores como veículos elétricos e painéis solares.

O líder chinês Xi Jinping conversa com Antony Blinken, secretário de Estado dos EUA, no Grande Salão do Povo, em Pequim - Mark Schiefelbein - 26.abr.24/AFP

Como expliquei na semana passada, o excesso de capacidade tem sido um dos pontos mais recorrentes nas celeumas americanas com os chineses.

Washington teme que, para escapar da desaceleração econômica, Xi turbine a capacidade industrial chinesa além da medida, o que pode levar a uma inundação de produtos a preços muito abaixo do mercado em todo o mundo.

Isso poderia levar vários negócios à falência, de forma semelhante ao fenômeno do "choque chinês" que se seguiu após a entrada da China na OMC em 2001.

Além de temas diplomáticos, o secretário de Estado se esforçou para trazer um tom mais ameno à visita. Se no ano passado, a viagem a Pequim centrava-se quase exclusivamente em reabrir os canais de comunicação militar bloqueados após a visita de Nancy Pelosi a Taiwan, desta vez Blinken fez questão de visitar restaurantes locais, se engajar com atletas chineses e até promover Taylor Swift como um "produto de exportação de sucesso" com o poder de aproximar os dois países. A cantora é bastante popular na China.

Por que importa: é difícil vender a viagem como qualquer coisa além de "uma visita de cortesia", já que os pontos contenciosos não tiveram nenhum avanço. Blinken esperava ouvir dos chineses algum tipo de compromisso em relação à guerra na Ucrânia. Ele pediu abertamente que Pequim parasse de fornecer ferramentas e microeletrônicos a Moscou, dizendo que sem este apoio, os russos "dificilmente conseguiriam sustentar seu ataque à Ucrânia". Nenhuma alteração aqui.

Xi e seu ministro das Relações Exteriores, Wang Yi, se mostraram pouco dispostos a discutir outros tópicos como as recentes rusgas entre chineses e filipinos no mar do Sul da China, o programa nuclear norte-coreano e a guerra entre Israel e Hamas. Os dois lados também evitaram a todo custo tocar publicamente no espinhoso banimento do TikTok nos Estados Unidos.

Pare para ver

Pintura do artista chinês Liu Zhong, fundador da Panda Art Development Foundation
Reprodução

Pintura do artista chinês Liu Zhong, fundador da Panda Art Development Foundation. Liu é famoso por retratar a fauna chinesa nos seus trabalhos e se tornou um notório defensor dos pandas no país. Conheça mais sobre ele aqui. (em inglês)

O que também importa

★ O zoológico de San Diego, na Califórnia, vai receber dois novos pandas. Emprestados pela China, Yun Chuan e Xin Bao serão os primeiros a chegar após Pequim se recusar a renovar a parceria que permitia a permanência de outros exemplares da espécie em zoológicos americanos. Em 2023, a despedida dos animais que estavam em Washington causou comoção local. O tema chegou a ser pauta do encontro entre Xi e Biden. Desde os anos 1970, a China empresta pandas a países amigos, um sinal de boa-vontade que ficou conhecida pelo termo "diplomacia do panda".

★ Empresa testadora de semicondutores vai abandonar a China continental. A taiwanesa KYEC, uma das principais testadoras de semicondutores do mundo, anunciou que vendeu integralmente sua participação em uma fábrica em Suzhou. A operação foi adquirida por um consórcio que inclui investidores da China continental e de Hong Kong. A KYEC afirmou que o acordo deve ser concluído até o terceiro trimestre. A decisão tenta atender a sanções americanas à indústria de semicondutores chinesa, implementadas pelo governo Biden desde 2022.

★ A Agência Mundial Antidoping (ou Wada, na sigla em inglês) admitiu saber de doping de nadadores chineses. Eles tiveram testes positivos para trimetazidina meses antes das Olimpíadas de Tóquio, em 2021. Usada para tratar condições cardíacas como a angina, a substância é banida do esporte por aumentar o fluxo sanguíneo e dar vantagem competitiva a atletas de intensidade. A China teria alegado à época que a cozinha do hotel onde sua delegação ficou hospedada tinha sido contaminada, justificativa que a Wada aceitou. A delegação venceu seis medalhas de ouro. O caso foi revelado por uma reportagem do The New York Times na semana passada e levou atletas do Reino Unido, Austrália e EUA a pedirem que a China seja banida dos jogos em Paris neste ano. A Wada informou que contratou um painel de investigação independente para reanalisar as provas do caso.

Fique de olho

O polêmico bilionário Elon Musk fez uma visita surpresa à China no domingo (28), conseguindo fechar um acordo que pode abrir o mercado do país para carros autônomos. Musk se encontrou com o premiê chinês, Li Qiang, com quem mantém relações amistosas desde que o chinês servia como secretário do PC em Xangai.

Após atender às exigências do governo, Musk recebeu uma certificação que atesta cumprimento a regras de privacidade e tratamento de dados em carros autônomos.

  • Antes de operarem nas ruas chinesas, os carros autônomos precisam provar que não armazenam dados biométricos de qualquer pessoa que não os passageiros no veículo;

  • Também é necessário armazenar dados em servidores locais, medida que tenta barrar o acesso de países terceiros às informações dos chineses;

O empresário Elon Musk se reúne com o primeiro-ministro Li Qiang em Pequim - Wang Ye - 28 abr.24/Xinhua

Na mesma visita, Musk fechou um acordo com a gigante Baidu para usar mapas de estradas chinesas em alta resolução. A tecnologia é crucial para o funcionamento de carros autônomos no país, já que opções ocidentais como o Google Street View não estão disponíveis.

Ainda não há prazo para que veículos da Tesla operem de forma autônoma nas ruas chinesas, mas investidores se animaram com a novidade. As ações da companhia subiram mais de 15% na segunda (29), a maior alta em três anos.

Por que importa: a China pode ser uma das poucas alternativas para a Tesla crescer nesta seara. Por lá, sistemas de direção autônoma ou assistida estão cada vez mais comuns e a legislação acerca do tópico é mais madura.

A visita de Elon Musk aconteceu apenas três dias depois da Administração Nacional de Segurança Rodoviária dos EUA divulgar um relatório apontando falhas nos softwares da Tesla que resultaram em 29 acidentes fatais nos últimos cinco anos. A agência reguladora está ponderando ordenar que a Tesla promova um custoso recall, que abrangeria todos os carros vendidos pela marca nos últimos 12 anos.

Para ir a fundo

  • A Embaixada da China no Brasil anunciou um concurso de desenhos que premiará os melhores trabalhos no tema "50 anos das relações sino-brasileiras". As inscrições vão até o fim de maio e cinco vencedores serão premiados com um laptop da Lenovo. Mais informações aqui. (gratuito, em português)
  • A Air China retomou no domingo seus voos que conectam São Paulo a Pequim. A rota, que tem uma escala em Madri, tinha sido suspensa na pandemia. Os voos serão operados por um Boeing 787-9 com capacidade para 263 passageiros e partidas às quintas e domingos. Mais informações aqui. (em inglês)
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