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STF

Direito de lembrar

No debate sobre esquecimento que se inicia no Supremo, liberdade de expressão deve prevalecer

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O plenário do Supremo Tribunal Federal, no dia da posse do novo presidente da corte, ministro Luiz Fux. - Pedro Ladeira/Folhapress

O Supremo Tribunal Federal deve iniciar nesta quarta (30) o julgamento de um recurso que estabelecerá precedente para o controverso direito ao esquecimento.

O caso escolhido é o de uma vítima de assassinato nos anos 1950 que teve sua história contada num programa exibido pela Rede Globo em 2004. Os irmãos da morta reclamam o direito de não ver a tragédia reencenada e pedem indenização por uso indevido de imagem. Perderam no Superior Tribunal de Justiça, mas recorreram ao Supremo.

Não é uma escolha muito feliz. O caso mistura direito ao esquecimento com direito de imagem, está circunscrito a uma exibição isolada de um programa que não teve reprise, e ainda traz o complicador de a Justiça ter sido acionada por parentes, não pelo próprio envolvido. É com esse processo, contudo, que o STF terá de trabalhar.

O direito ao esquecimento é polêmico porque expõe a oposição entre a liberdade de expressão e o direito à privacidade. É fácil simpatizar com o adolescente que fez ou disse uma bobagem nas redes sociais e não quer ser assombrado o resto da vida pelo erro da juventude. Também é fácil solidarizar-se com a vítima de um crime que não deseja que o acontecimento traumático reemerja cada vez que seu nome for pesquisado na internet.

É complicado, porém, dar a cada indivíduo o poder de editar seu passado. O político corrupto poderia reclamar o direito de apagar dos registros as condenações judiciais que sofreu, e pelas quais já pagou --uma informação de óbvio interesse público. O chef vaidoso poderia querer tirar do ar todas as críticas negativas que recebeu.

Não é preciso muita imaginação para perceber que um reconhecimento profuso do direito individual ao esquecimento comprometeria vários outros direitos, individuais e coletivos, como os de informar e ser informado, de escolher quem contratar ou com quem associar-se --e até o de não sofrer censura.

A discussão lembra a da norma do Código Civil que obrigava biógrafos a obter autorização dos biografados, que o Supremo teve a sabedoria de declarar inconstitucional em 2015. Espera-se que exiba agora o mesmo bom senso.

Quanto àqueles que agiram um dia com imprudência, restaria esperar que o entendimento social evolua para dar o devido peso às coisas, deixando o tempo filtrar o que é relevante e pôr de lado o que não tem maior importância, sem que o passado seja apagado.

editoriais@grupofolha.com.br

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