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Eduardo Barella

Por um Pacaembu plural e democrático

Falta de registro de arquiteta mexicana só expõe burocracia e corporativismo

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Eduardo Barella

Administrador e presidente da concessionária Allegra Pacaembu

Administrar um complexo da importância do Pacaembu é, sem dúvida, uma grande responsabilidade. Temos plena consciência do que o local significa para a cidade de São Paulo, seus habitantes e visitantes —são muitas histórias, memórias, emoções e simbolismos. Nosso projeto tem como premissas respeitar o passado, planejar o futuro e preparar o complexo para as próximas três décadas.

Nosso constante exercício de pensar o futuro considera variáveis sociais, operacionais, construtivas e comerciais, além de valores culturais muito bem alicerçados. A partir de extensa pesquisa histórica, aliada à investigação de necessidades urbanísticas e ao desejo de ter um equipamento público bastante frequentado, todos os dias.

Assim, chegamos a uma proposta que torna o Pacaembu mais democrático, plural e acessível. Queremos que o local ofereça ao público o que é seu por direito: um espaço vivo. A ideia é ressignificar e restaurar um ícone, inaugurado em 1940. Adaptações são inevitáveis, mas todas as estruturas originais serão preservadas. Ao repensar o projeto do escritório Ramos de Azevedo, Severo & Villares, uma equipe de arquitetos, engenheiros, historiadores, paisagistas e esportistas trabalhou para transformar o Pacaembu em um espaço de grande utilidade e alcance, atraindo mais frequentadores, sem onerar os cofres municipais. Esse processo segue todas as normas dos órgãos públicos e vem sendo acompanhado pelos conselhos de preservação do patrimônio histórico, seguindo as etapas de aprovações legais, em contínuos e ricos debates.

Nesse contexto, a consultoria do escritório Raddar, liderado pela arquiteta e urbanista mexicana Sol Camacho ​Dávalos, foi fundamental. Sua experiência acadêmico-profissional, reconhecida internacionalmente, aportou ideias, conceitos e referências. Tê-la nos assessorando como pesquisadora e curadora é muito valioso. O fato de Sol Camacho não ter ainda registro de arquiteta no Brasil, objeto de reportagem desta Folha (“Arquiteta do novo Pacaembu não tem registro profissional no país”; 12.jan.21), não apresenta nenhuma irregularidade. Revela apenas o quão burocrático e corporativista ainda é a regulamentação dessa prática profissional no Brasil.

A arquiteta Sol Camacho em evento no Instituto Lina Bo e P. M. Bardi - Mathilde Missioneiro - 8.dez.19/Folhapress

Vale lembrar que fatos como esse não são novidade. Relevante legado arquitetônico foi construído por profissionais que imigraram para cá e trabalharam sem registro, em parceria com arquitetos locais: a italiana Lina Bo Bardi, tão reconhecida pelo Masp, e o alemão Franz Heep, autor do projeto do Edifício Itália, são dois exemplos. Mais recentemente temos o Museu do Amanhã, no Rio, projetado pelo espanhol Santiago Calatrava, ou a Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre, do português Álvaro Siza Vieira. Há, também, renomados arquitetos brasileiros, que sequer tinham formação acadêmica completa, como Zanine Caldas e Cláudio Bernardes.

Sabíamos desde o início que o processo de concessão de um patrimônio como o Pacaembu viria acompanhado de críticas e polêmicas, ainda mais no delicado momento de polarização que vivemos. Nesse cenário, a imprensa tem oportunidades valiosas de promover debates saudáveis e construtivos. É lamentável desperdiçá-las com discussões vazias.

Como mencionado recentemente pelo fundador do Instituto Urbem, Philip Yang, “a privatização de um bem público eviscera as contradições de duas visões de mundo que a história já nos fez superar”. Para além do ultraliberalismo, de um lado, e do intervencionismo estatal, de outro, forças negativas surgem no contexto da transformação do Pacaembu, como o corporativismo profissional e o protecionismo arquitetônico do “não no meu quintal”.

Não importa. Seguiremos trabalhando para revitalizar esse patrimônio arquitetônico, cultural e esportivo, para que cada vez mais paulistanos possam assistir a jogos, nadar, caminhar, jogar, comer, consumir, escutar, aprender, se divertir ou apenas passar o tempo.

Valorizamos a empatia e o trabalho honesto; empreendemos em total legalidade, com imenso esforço e profissionalismo; e esperamos, em breve, entregar à cidade um Pacaembu ainda melhor.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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