Descrição de chapéu

Projeto perigoso

Texto que dá autonomia à PM mistura interesses da corporação e de Bolsonaro

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Carros das forças de segurança do Ceará com pneus furados durante motim da PM - Fabiane de Paula - 22.fev.20/Diário do Nordeste/Folhapress

Sob a regulação de um decreto de 1969, as Polícias Militares e os Corpos de Bombeiros carecem há décadas de uma nova legislação que substitua regras cinquentenárias adotadas na ditadura. Cumpre tornar essas forças de segurança mais democráticas, eficientes e transparentes, em conformidade com a Constituição de 1988.

Tal objetivo é colocado em risco, porém, em projeto ora em debate no Congresso Nacional —com atenção do Planalto. O texto, que merece maior escrutínio da sociedade, altera a lei orgânica da PM.

O fato de competir privativamente à União legislar sobre a organização das polícias atende aos interesses do presidente Jair Bolsonaro, que tem a oportunidade de negociar demandas de sua base de apoio entre agentes de segurança.

A proposta em tela foi elaborada com a ajuda de entidades de classe de oficiais militares, o que se traduz em seu viés corporativista. Uma das providência mais vistosas é a criação de um novo patamar hierárquico, de general, mirando a estrutura das Forças Armadas.

As mudanças implicam redução do poder dos governadores, que escolhem os comandantes-gerais das corporações —estes passariam a ter mandato fixo.

Ademais, ao criar um certo Conselho Nacional de Comandantes Gerais da Polícia Militar, com assento nos ministérios da Defesa e da Justiça, a proposta desloca o “locus” de poder das polícias do âmbito estadual para o federal.

Trata-se de uma reformulação do modelo federativo brasileiro que tornaria as Polícias Militares, hoje estaduais, em entes autônomos como os Ministérios Públicos.

Observe-se, a esse respeito, que se trata de forças com a prerrogativa do uso de armas —e que está instalado no Planalto um presidente disposto a incitar abusos. Recorde-se, por exemplo, a mal disfarçada simpatia de Bolsonaro pelo estapafúrdio motim de PMs do Ceará no ano passado.

As Polícias Militares e os Corpos de Bombeiros são, nos termos da Constituição vigente, “forças auxiliares e reserva do Exército [que] subordinam-se, juntamente com as Polícias Civis e as polícias penais estaduais e distrital, aos governadores” (artigo 144, § 6º).

Dar autonomia às corporações e expandir o número de níveis hierárquicos vão no sentido contrário a essa norma, sem explicação alguma que não a autoproteção das próprias polícias. No cenário atual, é casuísmo dos mais perigosos.

editoriais@grupofolha.com.br

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