Vai além de preferências políticas e ideológicas a constatação de que a conjuntura do país exige medidas imediatas para afastar o risco de uma nova e severa recessão econômica. É lamentável que a tarefa esteja a cargo de um governo já comprovadamente inepto, mas trata-se de uma imposição da realidade.
Nesse contexto, importa menos se o presidente da República e os recém-eleitos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado se debruçam sobre a pauta legislativa movidos por genuína convicção reformista ou mesmo humanitária. Interessa que façam avançar, ao menos, o que é urgente.
Mais precisamente, há pela frente uma complexa conciliação de dois objetivos essenciais: de um lado, proporcionar o maior amparo possível à população vulnerável, no que se anuncia como mais um ano de sacrifícios e privações; de outro, indicar compromisso mais que retórico com uma trajetória de reequilíbrio das contas públicas.
A administração Jair Bolsonaro não soube fazer nem uma coisa nem outra até aqui. Enquanto o presidente exortava a população a pôr vidas em risco com a retomada de atividades, foi o Congresso que instituiu o auxílio emergencial em vigor até dezembro passado.
A expansão vertiginosa de gastos não se fez acompanhar de nenhuma providência voltada ao ajuste futuro. No alheamento do Planalto e na inoperância do Ministério da Economia desapareceram as reformas administrativa e tributária, as privatizações, o aperfeiçoamento do teto de gastos.
O resultado é uma dívida pública equivalente a quase 90% do Produto Interno Bruto e com prazos cada vez mais apertados —a antessala de uma crise de confiança capaz de elevar juros, paralisar investimentos e ceifar mais empregos.
Nem mesmo o Orçamento deste 2021 está aprovado, tal a anomia do governo Bolsonaro. É por aí que se precisa começar, com o debate imediato de como elevar a transferência de renda às famílias sem extrapolar o limite da despesa.
Em paralelo, deve-se examinar a proposta de emenda constitucional que autoriza ajustes emergenciais, em caso de necessidade, como suspensão de concursos e reajustes salariais do funcionalismo.
Felizmente notam-se mostras de realismo nas primeiras manifestações dos dois novos chefes do Legislativo, que declararam apoio a um auxílio social dentro do teto de gastos. Também o ministro Paulo Guedes, da Economia, dá sinais de que pode esquecer por ora promessas irrealizáveis e ideias contraproducentes como a volta da CPMF.
Para Bolsonaro e aliados do centrão, está em jogo a sobrevivência política —muito menos assegurada do que fazem parecer as vitórias parlamentares. Que isso desperte algum senso de urgência e impeça nova sabotagem contra o país.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.