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Adriana Ventura

A reforma eleitoral deve incluir cota de gênero nas cadeiras do Congresso? NÃO

Desigualdade na representação política só revela a desigualdade da competição

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Adriana Ventura

Deputada federal (Novo-SP)

O Brasil é um dos piores países do mundo em termos de representação feminina na política. Apesar de as mulheres serem 51,8% da população, elas detêm, em média, apenas 15% das cadeiras dos Parlamentos. Uma corrente tem defendido a implementação de cotas de gênero para as cadeiras do Legislativo. Acredito, porém, que esse tipo de ação afirmativa seria uma resposta equivocada para a questão.

Reservar cadeiras para mulheres por lei seria negar o princípio básico da democracia: o poder emana do povo. É a escolha dos cidadãos que legitima o exercício do poder. Em outras palavras, o voto é soberano. Apenas o voto qualifica o representante a exercer um mandato eletivo.

A deputada federal Adriana Ventura (Novo-SP) - Luis Macedo - 25.fev.21/Câmara dos Deputados

No Brasil, o sistema eleitoral é o proporcional de listas abertas. Os mais bem votados em cada partido assumem o mandato —não importando a cor, a idade, a classe social ou o sexo. A representação, portanto, não espelha a demografia.

Não deve ser papel do Estado interferir nas escolhas da sociedade para aumentar a representatividade feminina. Reservar cadeiras para alguém que não obteve o voto popular seria interferir no resultado da eleição e tirar a legitimidade do eleito, ferindo os princípios democráticos. Antes de definir cotas, precisamos entender por que as mulheres não têm tanto sucesso quanto os homens na política. Por que homens e mulheres votam menos em mulheres do que em homens?

Se todos são iguais perante a lei, todos os candidatos devem ter as mesmas condições. Para uma disputa eleitoral ser justa, nenhum grupo demográfico deve ter prevalência sobre o outro. A regra do jogo deve ser a mesma para todos. Isso inclui acesso igual à disputa, aos meios de financiamento e à divulgação.

Esse é o problema central.

A estrutura partidária pode atrapalhar a eleição de mulheres. Cabe aos partidos definir quais mulheres estão aptas a participar do pleito. Para mudar o resultado das eleições é preciso uma mudança nos partidos. Os filiados devem lutar por regras que garantam que as candidatas não sejam laranjas e tenham o mesmo apoio que os homens.

O financiamento de campanha desigual é outro empecilho à participação na política e ao sucesso na disputa. Levantamento feito pela Câmara dos Deputados mostrou que, quando as mulheres recebem mais fundo eleitoral do que os homens, elas têm mais sucesso. O fundo eleitoral é dividido como os dirigentes partidários definirem, ainda que respeitados os 30% de destinação obrigatória para as mulheres.

Um partido, por exemplo, pode destinar o valor máximo para um grupo seleto de candidatos homens e dividir a cota feminina de maneira igual para as mulheres —e nenhuma terá desempenho melhor que os seus “preferidos”. A desigualdade do resultado só revela a desigualdade da competição, que não é justa.

O Novo, partido que não usa fundo eleitoral nem apoia cotas, teve o maior índice de mulheres eleitas em 2020: 38%. Enquanto nas outras legendas, em média, as mulheres eleitas são menos de 20%.

O terceiro ponto é a cultura. É preciso educar as meninas para que tenham autonomia e segurança de que qualquer posição —de dirigente partidária a presidente da República— é para elas.

Complementarmente, educar meninos para que as respeitem e admirem e tenham a mesma certeza de que são capazes em qualquer função. Devemos educar os cidadãos para que procurem representantes para as suas ideias e não para o seu gênero.

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