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Luis Carlos Gomes Mattos

Críticas, sim; ofensas, não

Código Penal Militar é cristalino sobre quando se configura conduta criminosa

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Luis Carlos Gomes Mattos

Ministro general de Exército, é presidente do Superior Tribunal Militar

Recentemente, um dos assuntos com destaque na imprensa foi o julgamento de civis pela Justiça Militar da União (JMU) —particularmente os que venham a incorrer no crime de ofensa às Forças Armadas.

O debate se deu em razão da arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) movida no Supremo Tribunal Federal pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI). O receio da ABI, conforme a divulgação, recai sobre a possibilidade de que a submissão à Justiça Militar possa inibir a publicação de notícias sobre as Forças Armadas e, ainda, coibir a divulgação de informações relacionadas a servidores públicos e candidatos a cargos eleitorais.

General Luis Carlos Gomes Mattos, em 2011, quando foi sabatinado no Senado para indicação ao STM - Alan Marques - 17.ago.11/Folhapress

Criada em 1808, logo após a chegada de dom João 6º ao Brasil, a JMU é a mais antiga do país. Atualmente, a 1ª instância é formada por 19 auditorias espalhadas pelo Brasil, e a 2ª instância, representada pelo Superior Tribunal Militar (STM). Essa estrutura existe para julgar os crimes capitulados no Código Penal Militar (CPM), definidos como crimes militares. Da leitura do citado dispositivo legal, verifica-se que a competência da JMU não se limita apenas aos integrantes das Forças Armadas, mas também aos civis, desde que pratiquem condutas ilícitas impostas pelo legislador. Desde 2019 até o momento, 771 civis estiveram envolvidos em julgamentos com a Justiça Militar.

O CPM, no artigo 219, define o crime de ofensa às Forças Armadas. Já de início, é possível entender que a inserção de servidores públicos e candidatos a cargos eleitorais no mesmo universo das Forças Armadas, como foi citado pela ABI, é equivocada. O texto é bastante claro e enquadra como crime a “ofensa às Forças Armadas”. O artigo também é explicativo quando expressa que a conduta criminosa consiste em ofender as Forças Armadas. Em nenhum momento considera a crítica como um delito.

Logo a seguir, o artigo 220 estabelece limites e afirma que opiniões desfavoráveis e apreciações críticas às instituições militares não encontram amparo para o enquadramento e, portanto, são excludentes de pena. Deve-se ter, de forma muito cristalina, que o crime é o de ofensa e não de crítica.

As Forças Armadas, como qualquer outra instituição, não estão livres de cometer erros e tomar decisões equivocadas. Quando isso ocorre, não pode ser imune a comentários contrários e críticas a essas ações. Esse é um comportamento normal, presente em qualquer nação democrática, e que está na mente dos nossos chefes militares. A crítica, que serve como alerta, que surge como uma proposta de correção de rumo, é, e sempre será, bem-vinda, desde que balizada pela verdade.

A ofensa às Forças Armadas, conforme a lei em vigor, quando existir, é uma ação criminosa e, por estar presente no Código Penal Militar, como crime militar deve ser tratada. A avaliação de que esse crime surgiu na época em que vivíamos sob a administração de um governo militar não prospera e pode dar ao leitor a falsa impressão de que naquele período não se podia ofender, mas, no momento atual, a ofensa é livre, autorizada. Não é. A ofensa não pode ser permitida, independentemente do regime de governo.

Os veículos de comunicação não só podem como devem apontar erros, equívocos e improbidades. Devem denunciar, sempre em consonância com a realidade dos fatos. Esse é um dos principais, se não o principal, papel da imprensa em uma democracia. Para que esse dever seja cumprido em sua plenitude, todos aqueles operadores da informação, os formadores de opinião, devem ter em mente que divulgar opiniões contrárias, criticar possíveis erros, denunciar improbidades é importante, necessário e salutar. Ao contrário, a ofensa não será bem-vinda e o seu autor estará sujeito a responder criminalmente por sua ação.

O respeito é fundamental nas relações humanas, independentemente da condição de ser civil ou militar, ou da atividade profissional desempenhada.

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