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Eugênia Augusta Gonzaga

Dia Internacional de Apoio às Vítimas de Tortura

Primeira condenação criminal de agente da ditadura é esperança contra impunidade

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Eugênia Augusta Gonzaga

Procuradora regional da República, é autora das primeiras iniciativas de punição a agentes da ditadura militar

Criado em 1997 pela ONU e comemorado neste sábado (26), o Dia Internacional de Apoio às Vítimas de Tortura marca a assinatura da Convenção contra a Tortura, que ocorreu em 26 de junho de 1987.

A passos de uma tartaruga do tamanho de um elefante, o Brasil vinha cumprindo o que se comprometeu naquela data. Mas, com a ascensão a chefe de Estado de uma pessoa que banaliza a morte e defende a tortura, qualquer avanço do passado nesse tema caiu por terra. O Brasil, portanto, também no quesito "punição de torturadores", piorou nos últimos anos.

Mas, antes disso, o país sempre foi uma penosa exceção em relação aos seus países, que processaram e condenaram agentes de Estado, autores de graves lesões a direitos humanos em suas ditaduras. O Brasil não fez isso graças ao pacto de impunidade celebrado em 1979/1984, por baluartes da nação, com a boa intenção de garantir a retomada da democracia.

Esse pacto não deu certo. Uma democracia forjada a partir de pactos de impunidade é muito frágil. Enquanto o Brasil e muitos outros países passam por ondas identificadas com o conservadorismo e a extrema direita, apenas no Brasil seus líderes ousam investir contra a democracia e fazer apologia à tortura.

Pior: além desse desvalor à democracia, tortura, assassinato e desaparecimento forçado continuam sendo tolerados. Fora a sua ilicitude, essa tolerância não contribui para a diminuição da criminalidade.

O pacto com a ditadura precisa ser revisto. O Supremo Tribunal Federal já poderia ter feito isso em 2010, no julgamento da ADPF (arguição de descumprimento de preceito fundamental) 153, mas perdeu a oportunidade quando decidiu que a Lei de Anistia, de 1979, aplica-se aos agentes do Estado que cometeram crimes de sangue.

Poucos meses depois, a Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou que o Brasil fizesse o contrário. Com esse revés, o caso permaneceu em aberto no STF, porém engavetado há dez anos, sob relatoria do ministro Luiz Fux. Como ele assumiu a presidência da corte, a ação foi redistribuída ao ministro Dias Toffoli.


Mesmo assim, não é possível ter expectativas positivas. O ministro Toffoli já se manifestou no sentido de que o golpe civil-militar de 1964 foi um mero "movimento". E mais: ele era o advogado-geral da União, em 2008, quando o governo Lula (PT) enfrentou a propositura da mencionada ADPF 153 e foi feita uma audiência pública no salão negro do Ministério da Justiça para decidir qual posição a União deveria adotar. Apesar dos esforços dos ministros Tarso Genro e Paulo Vanucchi, restou vencedora a posição do então ministro da Defesa, Nelson Jobim, justamente um dos principais articuladores do pacto de impunidade. E foi o advogado-geral Dias Toffoli quem representou a União na defesa dos torturadores.

O delegado Carlos Alberto Augusto diante de fotos de policiais mortos na ditadura, na sede do Deic, na zona norte de São Paulo - Apu Gomes - 21.out.2011/Folhapress

Apesar de tudo isso, nesta semana em que se comemora o Dia Internacional de Apoio às Vitimas de Tortura, o cenário brasileiro teve sensível mudança. Foi proferida a primeira condenação criminal de um agente da ditadura militar. Ela foi para Carlos Alberto Augusto, o Carlinhos Metralha, parceiro do infiltrado Cabo Anselmo. No mesmo processo eram réus Brilhante Ustra e Alcides Singillo. Eles faleceram no curso da ação. Mas, como disse uma familiar de desaparecidos políticos: “só o fato de terem dormido algumas noites sabendo que foram processados já é um avanço”.

Ainda que com passos lentíssimos, o Brasil não está paralisado no combate à tortura.

Para ler e assinar o manifesto #ReinterpretaJáSTF: acesse http://chng.it/8SWWDdNd.

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