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Gisele Cittadino e Ricardo Lodi

É legítimo banir Sergio Moro de um evento acadêmico?

A comunidade da pós-graduação em direito no país não pode admitir que um juiz declarado parcial pelo STF participe de evento acadêmico para falar sobre corrupção e integridade

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Gisele Cittadino

Professora do programa de pós-graduação em direito da PUC-Rio.Integra o Grupo Prerrogativas

Ricardo Lodi

Reitor e professor do programa de pós-graduação em direito da UERJ

Difícil encontrar alguém, especialmente entre os professores das universidades brasileiras, que discorde do fato de que há riscos à liberdade acadêmica no Brasil.

Os casos multiplicam-se a cada dia, envolvendo cientistas e pesquisadores, e, para agravar ainda mais esse risco, Jair Bolsonaro tem nomeado reitores de universidades públicas que não têm legitimidade para assumir o cargo, porque lhes falta o reconhecimento de professores e estudantes.

Igualmente difícil admitir que a democracia não sofra riscos diante da violação da liberdade acadêmica ou da liberdade de expressão. A radicalidade exigida pelas sociedades democráticas demanda exatamente a participação plural de todos os atores sociais em suas múltiplas esferas de atuação.

Como compreender, então, a manifestação contrária de um enorme conjunto de professores de programas de pós-graduação em direito no Brasil à participação do ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro no evento acadêmico organizado pelo Conpedi (Conselho Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Direito)?

Afinal, se o ex-ministro integra, como professor, um programa de pós-graduação, por que motivo não poderia participar? Se o seu Currículo Lattes (CNPq), que nos revela uma produção científica irrelevante e nenhuma experiência na formação de jovens pesquisadores, não justificaria o convite, tampouco seria um fator capaz de explicar a forte mobilização que terminou por afastar Sergio Moro do evento.

Seriam, todos os pesquisadores que assinaram o manifesto, integrantes ou simpatizantes do Partido dos Trabalhadores? Teriam apenas assumido a defesa do ex-presidente Lula? Estariam, com tal ato, procurando punir o ex-ministro como forma de demonstrar repulsa ideológica ao governo Bolsonaro?

Acreditamos que a resposta não caminha em nenhuma dessas direções. O juiz Sergio Moro integraria, como coordenador, um painel sobre “O papel do setor privado em políticas anticorrupção e de integridade”.

Considerando que o personagem se destaca muito menos por sua trajetória acadêmica do que pela sua atuação política, seria ingênuo supor que a sua indicação não tivesse sido decisivamente influenciada por esta última.

A liberdade acadêmica é fundamental em qualquer sociedade democrática. No entanto, da mesma forma como a tolerância não pode ser obrigada a abrigar os intolerantes, sob pena de ser destruída, a comunidade da pós-graduação em direito no país não pode admitir que um juiz declarado parcial pelo STF, por ter desacreditado os esforços do sistema de Justiça no combate à corrupção, participe de um evento acadêmico para falar exatamente sobre corrupção e integridade.

Quando a programação do evento foi divulgada, não foram poucos os que pensaram estar diante de uma notícia falsa. A indignação coletiva emergiu quando descobrimos que não se tratava de uma piada.

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