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Rafael Robba

Alívio para maquiar o verdadeiro problema

Redução na mensalidade dos convênios beneficia apenas uma pequena parcela

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Rafael Robba

Advogado especialista em direito à saúde

Em decisão inédita, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) divulgou reajuste de -8,19% para os planos de saúde individuais e familiares. Na prática, a mensalidade dos convênios dessa modalidade será reduzida.

Desde 2000, quando a ANS passou a regulamentar o índice máximo de reajuste aplicado aos planos individuais e familiares, nunca houve a fixação de um percentual negativo. Ao contrário, os percentuais divulgados pela agência sempre foram alvo de críticas e questionamentos judiciais por serem índices muito acima da inflação geral e sem a devida transparência. Tanto que, em dezembro de 2018, após sofrer uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), e ser alvo de uma ação civil pública, a ANS decidiu rever o método de cálculo para apuração dos índices de reajustes dos planos individuais e familiares, adotando critérios mais transparentes.

Embora seja uma boa notícia, a decisão da ANS beneficia uma pequena parcela dos consumidores de planos de saúde.

Atualmente, pouco mais de 48 milhões de brasileiros estão vinculados a planos de assistência médica e hospitalar. Desse total, aproximadamente 81,2% dos consumidores de planos de saúde pertencem a contratos coletivos, enquanto apenas 20%, que estão vinculados a contratos individuais ou familiares, terão o alívio na mensalidade com essa deliberação da ANS.

A fixação de um índice negativo se deve, em grande parte, a medidas tomadas durante a pandemia para evitar a contaminação dos beneficiários pela Covid-19, como suspensão de cirurgias eletivas e agendamento de consultas, e que geraram uma forte redução das despesas (a chamada sinistralidade) para as operadoras e, consequentemente, aumento dos lucros.

Esse cenário favorável às operadoras de planos de saúde não provocará, no entanto, redução de custos aos consumidores de planos de saúde coletivos, pois não há qualquer ingerência da ANS na fixação dos índices dos reajustes sofridos por esses beneficiários.

A frágil atividade regulatória da ANS, com relação aos planos coletivos, permite que os reajustes sejam fixados exclusivamente pelas operadoras de planos de saúde, sem que haja o controle ou a necessidade de autorização prévia da agência.

Essa liberdade para reajustar as mensalidades fez com que os planos coletivos se tornassem prioridade das operadoras, tanto que boa parte dessas empresas, há muito, já não comercializam mais planos individuais e familiares.

Ao fechar os olhos para os reajustes dos planos coletivos, a ANS parece desconsiderar que esses contratos são compostos por consumidores e que a defesa do consumidor, além de ser uma garantia fundamental, é um dos princípios da ordem econômica do nosso país, previsto na Constituição Federal.

Proteger e defender o consumidor é uma das finalidades institucionais da ANS. Suas omissões, no entanto, fizeram com que o Poder Judiciário se tornasse, aos olhos dos consumidores, a instituição capaz de combater abusos praticados pelas operadoras de planos de saúde.

Os planos coletivos não devem ficar imunes ao controle mais rigoroso do poder público. Sem esforços para sanar esse problema, o mercado suplementar permanecerá desequilibrado para grande parte dos consumidores.

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