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Michele Schultz, Giuliana Moraes e Reinaldo Santos

USP opta por retorno perigoso

Não cabe à maior universidade do país colocar a vida da sua comunidade em risco

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Michele Schultz

Presidente da Adusp (Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo)

Giuliana Moraes

Coordenadora do Diretório Central dos Estudantes da USP

Reinaldo Santos

Diretor do Sintusp (Sindicato dos Trabalhadores da USP)

A reitoria da USP está impondo aos servidores e estudantes o retorno presencial das atividades na universidade. O plano de retorno, que antes só colocava obrigatoriedade para quem estivesse com a vacinação completa, agora autoriza os diretores das faculdades a convocar estudantes, funcionários, docentes e estagiários vacinados apenas com a primeira dose. E toda a comunidade universitária só soube dos detalhes desse plano de retorno pela imprensa, antes mesmo de qualquer discussão interna.

Além da falta de diálogo para a elaboração do plano de retorno, a USP desconsidera fatores essenciais para garantir a segurança do retorno presencial. Nos comunicados sequer há menção aos protocolos caso haja contaminação de pessoas que tiverem retornado ao trabalho e aulas presenciais. A ausência de infraestrutura para garantir o retorno seguro em muitas faculdades e o uso do transporte público, que inevitavelmente gera aglomeração, deveriam estar no centro da preocupação para a elaboração do plano de retorno.

Entendemos que a situação geral da pandemia não autoriza abrir mão do isolamento. A concepção de que a vacina seria um passaporte individual de imunização é falsa; afinal, pessoas vacinadas ainda podem adoecer e transmitir o vírus. Por isso, é fundamental a articulação entre política de imunização coletiva e medidas de isolamento social, até que tenhamos um controle da pandemia.

Temos ainda um número significativo de óbitos e novos casos todos os dias. Segundo projeções feitas por pesquisadores da USP e da Unesp, a flexibilização das medidas de restrição poderá contribuir para um surto da variante delta do Sars-Cov-2 neste mês de setembro. Parece-nos que a decisão da USP não leva em consideração a própria produção científica da universidade para se adequar às diretrizes do governo do estado de São Paulo.

A reitoria faz sempre questão de lembrar que a USP não parou durante a pandemia. Só que a manutenção das atividades só foi possível graças ao esforço de toda a comunidade, com grande custo físico e emocional. A questão central não é sobre ter vontade de retornar ao trabalho presencial. Nós, inclusive, entendemos que o ensino remoto é uma ferramenta completamente inviável para o pós-pandemia por trazer prejuízos de várias ordens: desde a convivência universitária até os processos de ensino e de aprendizagem, descaracterizando o papel social da USP. No entanto, o retorno só deve ocorrer de forma segura, quando as condições da pandemia permitirem.

A pandemia mostrou a importância da ciência no combate ao obscurantismo e reforçou o papel fundamental das universidades públicas como polos de produção científica. Não cabe à maior universidade do país desafiar a ciência e colocar a vida da sua comunidade em risco.

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