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Alexandre Magno Fernandes Moreira

O Senado deve aprovar o projeto que prevê o ensino domiciliar? SIM

Registro das famílias educadoras permitirá acompanhamento adequado

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Alexandre Magno Fernandes Moreira

Advogado e professor de direito educacional, é diretor jurídico da Associação Nacional de Educação Domiciliar

Uma característica curiosa da discussão política brasileira é a tendência de varrer para debaixo do tapete todos os fatos que incomodam, que vão contra determinada ideologia ou forma de pensar. Seria como dizer "se eu não gosto, não existe".

Então, o que se faz com as dezenas de milhares de famílias brasileiras que tiraram os filhos da escola, ou mesmo nunca os matricularam, para educá-los em casa? O primeiro passo é dizer que não existem, que é apenas uma invenção de um grupo político.

Famílias favoráveis ao ensino domiciliar estiveram na Câmara dos Deputados para acompanhar aprovação de projeto de lei que prevê regulamentar o modelo - Gabriela Biló/Folhapress

Quando fica impossível esconder a existência de alguém ou de um grupo social, a estratégia é simplesmente difamar. Que tal chamar as famílias educadoras de retrógradas, obscurantistas, radicais e talvez até pedófilas e abusadoras? Naturalmente, a comprovação empírica dessas vagas afirmações é dispensada.

"É tudo pelo bem das crianças!", eles dizem ao querer impor a todas as famílias um padrão único de criação e de educação. Para eles, a diversidade e o pluralismo somente são válidos quando estão a favor da sua própria ideologia. Não adianta citar a Constituição Federal, que fala da liberdade de aprender e de ensinar e do pluralismo pedagógico: o sonho deles é a sociedade plural de pensamento único.

Outra característica peculiar de nossa discussão política é a necessidade constante de "requentar" assuntos já resolvidos, para dar a eles ares de polêmica novidade. Não adianta dizer que, em 2018, o Supremo Tribunal Federal declarou constitucional a educação domiciliar, desde que obedecidos determinados parâmetros (aliás, a lei aprovada na Câmara dos Deputados obedece rigorosamente a esses parâmetros).

Elisa Flemer, 17 anos, que estudou em casa durante todo o ensino médio; ela foi aprovada em engenharia na USP e tirou quase a nota máxima no Enem, mas não conseguiu cursar porque não tem diploma - Adriano Vizoni - 6.mai.21/Folhapress

A educação domiciliar é um fenômeno social com crescimento exponencial no Brasil desde o início dos anos 2000. E veio para ficar: nenhuma família deixou de educar os filhos em casa por medo de processo ou denúncia. Educar em casa significa, na maior parte das vezes, uma mudança radical no estilo de vida da família —para os que estão dispostos a passar por isso, a legalidade ou ilegalidade do procedimento é praticamente irrelevante.

Politicamente, há apenas uma opção responsável: o reconhecimento expresso conjugado com a regulamentação do homeschooling. Os primeiros interessados são naturalmente as famílias, que desejam educar os seus filhos com a devida segurança jurídica. Porém, há também um nítido interesse estatal nesse reconhecimento e regulamentação. Por vários motivos.

O primeiro é a possibilidade de fiscalização do fenômeno. O registro das famílias educadoras permitirá que haja um acompanhamento por parte dos conselhos tutelares e dos órgãos educacionais. O segundo motivo é a possibilidade de avaliação formal do nível de aprendizado dos estudantes que aprendem em casa. O terceiro motivo diz respeito às políticas educacionais, pois dentro de alguns anos será possível comparar objetivamente o aproveitamento dos estudantes domiciliares com os estudantes escolares.

Este último motivo incomoda profundamente determinados setores ideológicos e corporativos. Como ficarão se for demonstrado um rendimento superior dos alunos educados em casa em comparação aos educados na escola? E se também ficar estatisticamente comprovado que esses estudantes têm melhor nível de socialização e menor exposição à violência que os demais? Vão continuar dizendo que isso não existe?

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