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Stephan Wilken

A guerra, seus desafios e oportunidades

Ambiente geopolítico sob mudança faz surgir nova lógica para o livre comércio

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Stephan Wilken

CEO do Deutsche Bank no Brasil

​O mundo começa a se recuperar da pandemia, que ainda deve apresentar alguns desdobramentos. Já a guerra entre Rússia e Ucrânia continua a gerar novos impactos econômicos e sociais sem qualquer sinal de conclusão. Pela primeira vez desde a 2ª Guerra Mundial, as dores da globalização que tanto aproximou os povos e as economias estão sendo sentidas em novas escalas. As fronteiras e negociações estão sendo redefinidas. As rotas da economia global encontraram barreiras e irão se reconfigurar. Mas qual será o impacto sobre todos nós e sobre as empresas e instituições neste mundo mais complexo?

Um fato é certo: a história é cíclica. As tensões geopolíticas, seja por pandemia ou interesses econômicos, são recorrentes. E um ponto que aprendemos é que o capital sempre encontra caminhos para fluir, trazendo não apenas riscos, mas, principalmente, oportunidades. É nisso que precisamos focar e investir.

A 2ª Guerra Mundial, apesar das 85 milhões de mortes, fez o mundo entrar na era de ouro do capitalismo, que durou até o início da década de 1970. Em 2016, com a aprovação do Brexit e a saída do Reino Unido da União Europeia, Frankfurt teve a oportunidade de ser o centro financeiro da região.

Mais recentemente, com a pandemia de Covid-19, o mundo registrou milhões de mortes, mas a agilidade no desenvolvimento de diversas vacinas foi colocada à prova —e venceu. A indústria do turismo e da aviação foram duramente afetadas, enquanto a da saúde teve um crescimento exponencial. Isso sem falar da transformação digital e da adaptação de todo o setor de varejo, indústria e comércio que teve que atender seus consumidores de forma online. Segundo a Neotrust, empresa que monitora 85% do e-commerce brasileiro, o setor registrou faturamento de R$ 161 bilhões em 2021, uma alta de 27% em relação a 2020. Esta mudança foi a mais rápida na história.

A atual guerra na Ucrânia nos faz passar por isso novamente. Ela marca o ponto de partida de um ambiente geopolítico em mudança, onde surgem novas alianças e uma nova lógica para o livre comércio.

Os países, assim como as empresas, vão precisar assumir mais o controle sobre sua produção e precisarão reavaliar e reestruturar suas cadeias de suprimentos. Ambos devem dar mais peso a considerações de segurança em vez de apenas custos de produção.

Os impactos desta guerra já são sentidos mundialmente. O PIB mundial registrou, segundo um relatório do Banco Mundial, contração em 90% dos países; a inflação está presente em todos as nações, inclusive EUA e Europa; a disponibilidade de commodities, energia, grãos alimentares e materiais essenciais já foi sentida e começa a forçar a criação de novas cadeias de suprimento, novas rotas comerciais e incontáveis oportunidades. Garantir o acesso às mercadorias em tempos de conflitos geopolíticos e compromissos de descarbonização é um desafio premente, e quem ofertar soluções eficientes sairá na frente no novo redesenho da economia mundial.

Além disso, alguns setores econômicos se beneficiarão do conflito. Caso de defesa, cibersegurança, energias renováveis, petróleo e gás, commodities, metais e mineração. Dados recentes da Fundação Getulio Vargas apontam alta de até 155% nas commodities industriais, como petróleo e aço, nos últimos dois anos. Em meio a toda essa transformação, a guerra na Ucrânia acrescentou novas perspectivas para a ESG e a busca de novas formas de energia, já que 40% do gás natural e cerca de 33% do petróleo consumidos na Europa são provenientes da Rússia. Alem disso, as sanções que temos visto recentemente resultarão em maior importância de critérios sociais para investimentos.

Como em toda crise, há oportunidades a que se apegar. Para o Brasil, é o momento de assumir protagonismo e influência. O país precisa apresentar ao mundo todo o potencial que tem o mercado local e a capacidade de seguir em meio à grave crise geopolítica, seja como provedor de commodities, um dos grandes destaques, ou novo hub para investimentos.

É essencial que o governo busque acordos comerciais e de abertura com novos mercados. A posição de neutralidade também pode ser um diferencial e render vantagens diplomáticas. Por fim, o Brasil apresenta uma situação privilegiada em relação a alguns fatores como riqueza natural, soberania de alimentos e energia, além de sua posição geopolítica na América do Sul. É necessário trabalhar, e muito, para não perder a janela de oportunidades que se abriu com a nova configuração mundial.

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