Descrição de chapéu
Vários autores

Alteração em lei de improbidade terá consequências desastrosas

Ausência de normas de transição causará sérios impactos na tutela do patrimônio público

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

VÁRIOS AUTORES (nomes ao final do texto)

A Lei de Improbidade Administrativa (nº 8.429/92), um dos principais instrumentos para o combate de atos ilícitos praticados por agentes públicos contra a administração, foi recentemente alterada pela lei nº 14.230, de 2021, resultando em um retrocesso na luta contra o maltrato com a coisa pública.

Dentre as principais alterações, se encontram os requisitos exigidos para a configuração do ato de improbidade, especialmente o elemento subjetivo dolo, as regras relacionadas à prescrição e a impossibilidade de atos até então categorizados como desvio de finalidade configurarem improbidade para fins de punição.

Fachada do prédio do Ministério Publico de São Paulo - Henrique Martins/Alesp

Nesta quarta (3/8), importante julgamento sobre o tema deverá ter lugar no Supremo Tribunal Federal, que decidirá se as mudanças terão ou não o efeito de retroagir no tempo, invalidando condenações anteriores e processos em andamento.

Percebe-se que, para além da redução do espectro de proteção da coisa pública contra condutas ilícitas praticadas por agentes públicos, a lei nº 14.230/2021 padeceu de grave erro tático, consistente na ausência de normas de transição, importantes instrumentos para mitigar os impactos sociais provocados por mudanças legislativas.

A ausência de um regime de transição e a aplicação retroativa irrestrita da nova lei causarão sérios impactos na tutela do patrimônio público. Em 2021, existiam 4.768 procedimentos investigatórios em andamento no Ministério Público do Estado de São Paulo, que poderão ser atingidos pela aplicação retroativa.

Desde 2011, o Ministério Público de São Paulo ajuizou mais de 8.670 ações de improbidade administrativa, que, potencialmente, poderão ser atingidas pelas alterações promovidas no ano passado.

Com base em dados coletados a partir de 2011, existem no Tribunal de Justiça de São Paulo mais de 8.600 ações de improbidade administrativa com decisão de segundo grau, sem trânsito em julgado, que também poderão ser reexaminadas em razão das mudanças realizadas pela citada lei.

Da mesma forma, há 2.798 ações de improbidade administrativa julgadas procedentes, com trânsito em julgado, que serão potencialmente atingidas.

O erro tático em razão da ausência de normas de transição terá consequências desastrosas. Basta pensar que todos aqueles servidores e agentes públicos ímprobos, condenados a perda do cargo, buscarão a reintegração ao serviço público, o recebimento dos vencimentos relativos ao período em que estavam afastados ou, ainda, o ressarcimento dos valores recolhidos ao erário em razão de multa civil.

Condenações pela prática de ato de improbidade administrativa e transitadas em julgado, como aquelas experimentadas pelo ex-prefeito Paulo Maluf, poderão ser indulgenciadas. Condutas abusivas por parte de agentes estatais, como a "carteirada" dada por desembargador no litoral paulista no período da pandemia, terão sua ilicitude afastada.

Por outro enfoque, haverá uma enxurrada de processos e recursos com o objetivo de rediscutir condenações pretéritas, agravando a situação de congestionamento judiciário.

Portanto, a ausência de normas de transição na lei nº 14.230/2021 demanda o enfrentamento da lacuna pelo Poder Judiciário com o reconhecimento da irretroatividade da nova legislação, a fim de se conferir adequada proteção à tutela do patrimônio público e da moralidade administrativa, bem como no intuito de se resguardar a segurança jurídica.

Mario Sarrubbo, procurador-geral de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP)
Wallace Paiva Martins Junior, subprocurador-geral de Justiça do MPSP
Beatriz Lopes de Oliveira, promotora de Justiça
Alexandre Magalhães, promotor de Justiça


TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.