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Teresa Sacchet e Felipe Lauritzen

Disparidade econômica de candidatos expõe baixa representatividade política

Mais postulantes negros e mulheres dificilmente se refletirá no total de eleitos

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Teresa Sacchet

Doutora em ciência política (Universidade de Essex, Reino Unido), é professora e pesquisadora (UFBA) e pesquisadora sênior do Observatório Nacional da Mulher na Política (ONMP) da Câmara dos Deputados

Felipe Lauritzen

Mestre em desenvolvimento internacional e doutorando em economia (Instituto de Estudos Políticos de Paris - Sciences Po), é pesquisador associado do ONMP

O Brasil tem os mais baixos índices de mulheres em posições legislativas nacionais. Elas são apenas 15% dos representantes na Câmara dos Deputados. Similarmente, as pessoas negras (pretas e pardas) representam apenas 27% dos eleitos, quando compõem 56% da população brasileira. Enquanto há outros fatores que podem explicar a sub-representação desses grupos, a riqueza dos candidatos pode ser elementar.

Em 2022, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral, as mulheres representam 35% de todas as candidaturas, um tímido aumento em relação a 2018, quando foi de 32%. Já as pessoas negras quase atingiram paridade de candidatura com as brancas. O percentual é de 49,5%, em que 13,9% são pessoas pretas e 35,6%, pardas. Esse aumento nas candidaturas dificilmente se refletirá no número de eleitos, já que membros desses grupos competem nas eleições com grande disparidade de recursos financeiros.

A desigualdade financeira já tem início no patrimônio desses candidatos. Concorrentes homens são, em média, três vezes mais ricos que as mulheres. Em 2022, enquanto o patrimônio médio declarado deles é de cerca de R$ 1.590.014, o delas é de R$ 549.994. Os dados por raça/cor são ainda mais discrepantes.

Em média, candidatos homens brancos têm um patrimônio acima de R$ 2 milhões, enquanto candidatas pretas têm pouco mais de R$ 220 mil. Ou seja, candidatos brancos são 9 vezes mais ricos que as candidatas pretas. Já com relação às indígenas, os homens brancos são cerca de 11 vezes mais ricos —o patrimônio médio delas é de pouco mais que R$ 181 mil.

Alguns candidatos são tão ricos que o seu patrimônio é igual ou maior que a soma de todos os demais para o seu cargo naquele estado. Nessas eleições, esse é o caso de 85 candidatos. Destes, 65 são brancos, 18 são pardos, apenas 1 é preto e 1, não informado. Nenhuma pessoa indígena ou amarela está em tal categoria. Mulheres são apenas 8 dos 85, revelando que a concentração de patrimônio dos candidatos segue também padrões de desigualdade de gênero e raça.

Os recursos eleitorais procedem de diferentes fontes, e o acesso a algumas delas requer proeminência ou articulação política, mas o uso do recurso próprio exige apenas decisão individual. Assim, pessoas com grandes fortunas já entram na disputa em vantagem competitiva. Desde 2019, a lei eleitoral prevê um limite sobre a quantia de recursos próprios que pode ser empregada em campanhas, que varia de R$ 127 mil, para os cargos de deputado estadual e distrital, a R$ 8,89 milhões para o cargo de presidente.

Ainda que esse limite seja de 10% do teto de gastos de campanha fixado pelo TSE a cada eleição, ele ainda é elevado quando comparado à média de gastos de todos os candidatos. Isso possibilita aos mais ricos um incremento de recursos que pode ser significativo para as suas chances de sucesso, desnivelando ainda mais o campo de disputa.

Estudos já apontaram nesta direção, indicando que o patrimônio é um bom preditor dos gastos eleitorais dos candidatos, não apenas porque os mais ricos podem aportar mais dos seus próprios bolsos, mas também porque tendem a arrecadar mais de outras fontes (Lauritzen, 2021). Esses candidatos possuem um tipo de capital social —redes de relacionamento pessoal— que favorece o acesso a mais recursos de campanha (Sacchet, 2009). Ou seja, dinheiro atrai dinheiro.

Isso pode explicar o fato de os candidatos eleitos serem, em geral, mais ricos do que os não eleitos. Em 2018, o patrimônio dos eleitos foi mais de duas vezes maior do que o dos não eleitos. Um homem eleito tinha uma riqueza média de R$ 2,75 milhões, enquanto um não eleito tinha R$ 1,24 milhão. Já uma mulher eleita tinha, em média, R$ 1,28 milhão, o que é 2,4 vezes maior do que o que possuía uma não eleita, cujo patrimônio era de R$ 532 mil.

Vários estudos identificam os gastos de campanha como o principal elemento para explicar as chances de sucesso eleitoral, uma vez que recursos financeiros tornam possível evidenciar alguns candidatos em relação a outros. Mas, enquanto para alguns arrecadar fundos eleitorais é trabalhoso, outros já entram na disputa com uma quantia significativa para alicerçar suas campanhas. Nessa diferença de oportunidades, facilitada pela riqueza dos candidatos, as desigualdades de gênero e de raça/cor na disputa por cargos públicos têm se acentuado.

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