Em 2014, Vladimir Putin reagiu à derrubada do governo aliado em Kiev anexando a Crimeia, ex-província russa que fora cedida à Ucrânia em 1954, quando ambos os países integravam a União Soviética. A comunidade internacional condenou o ato de força, mas viu um fato consumado —considerando inclusive as ligações históricas no caso.
Sanções foram aplicadas e a vida seguiu, com direito a uma festiva Copa do Mundo sob Putin, em 2018. No leste da Ucrânia, seguia congelada a guerra civil na qual separatistas pró-Kremlin dominavam parte do chamado Donbass.
Em fevereiro deste ano, Putin iniciou sua invasão, ao final de um longo impasse após pedir que o Ocidente se comprometesse a não admitir Kiev em suas estruturas, como a União Europeia e a Otan.
A Rússia foi desde então submetida a um regime draconiano de restrições. Entretanto sua economia ainda se sustenta, apoiada pelas linhas abertas com a aliada China e com parceiros como a Índia.
Países como o Brasil também consideraram interesses econômicos. Seguindo a linha usual do Itamaraty, o governo de Jair Bolsonaro (PL) se mantém neutro na contenda. O rival do presidente no segundo turno, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), segue argumentação semelhante sobre a guerra.
Com efeito, Brasil, Índia e China se abstiveram na sessão que propunha a condenação da anexação no Conselho de Segurança da ONU.
Nesta quarta (5), Putin finalizou a pantomima. Sancionou leis que formalizam a anexação de quatro territórios ucranianos, feita após referendos farsescos. Em reação, a ONU afirmou que a medida exacerba a violação de direitos humanos já em curso na guerra.
As áreas, ao todo 18% da Ucrânia, apresentam em solo realidade distinta daquela apresentada com pompa no Kremlin. Em duas delas, os russos estão recuando em pontos estratégicos.
Ademais, as anexações violam o Memorando de Budapeste (1994), que entre outras coisas garantia a soberania das fronteiras ex-soviéticas da Ucrânia, Belarus e Cazaquistão. Letra morta, como a Crimeia provou, mas o momento é outro.
O Ocidente está envolvido na guerra, Putin recorre a ameaças nucleares e a economia mundial sofre com a inflação, a crise energética na Europa e a ajuda dada pela Opep a Moscou ao cortar a produção de petróleo. O contexto dificulta a aposta russa em vencer pela gravidade como em 2014.
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