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Raphael Câmara

Nota técnica sobre aborto defende a lei brasileira

Defesa da vida da mulher e da criança, desde a concepção, é sempre prioridade

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Raphael Câmara

Médico obstetra e ginecologista, é secretário nacional de Atenção Primária do Ministério da Saúde

A nota técnica sobre abortamento do Ministério da Saúde é um guia baseado em evidências científicas, feita por especialistas para apoiar serviços de saúde. Embora se diga que a nova versão surgiu após a pasta recuar diante de críticas, não é verdade.

Audiência pública para debater a versão preliminar do documento já estava prevista para, se necessário, ajustar o texto. Na audiência, o ministério discutiu o tema com especialistas de diversas correntes. Representantes da sociedade, com opiniões diversas, foram convidados —o objetivo sempre foi ouvir todos os lados, em discussão democrática. Mas três comissões legislativas com viés favorável à descriminalização do aborto optaram por não ir.

Menina de 11 anos que seguiu com a gestação após estupro, com o filho em sua casa, em Teresina - Renato Andrade-23.jun.2022/Folhapress

Após o debate, a pasta fez a versão definitiva, incluindo sugestões recebidas. Antes disso, houve pedido de liminar ao Supremo Tribunal Federal com o objetivo de proibir a publicação da nota técnica —o que foi negado. Na nova edição, o ministério optou por tirar do texto questões jurídicas por entender que essa discussão deve ficar com juristas.

A imprensa divulgou que o Ministério da Saúde minimizou os riscos da gravidez na adolescência. A afirmação falsa nos causa preocupação, já que a causa da gravidez na adolescência é pauta prioritária, com diversas ações de conscientização.

Abaixo de 14 anos, qualquer relação sexual é estupro, e o estuprador deve ser punido. Por isso, em 2020, lançamos portaria que obriga o médico a notificar o estupro em casos de aborto para se capturar o estuprador. Como sempre, a esquerda foi contra. Queriam que a vítima de estupro, oprimida por seu algoz, que fosse denunciar. Tentaram derrubá-la no Supremo, sem sucesso.

Gravidez decorrente de estupro pode ou não ser de risco. Esse fato é comprovado pelas evidências —todas publicadas na nota técnica, diferentemente do que a mídia disse que não havia. A cada 100 mil meninas entre 10 e 14 anos que engravidam, a taxa de mortalidade materna é de 72 mortes. No caso das mulheres entre 35 e 39 anos, é de 81; e, entre 45 e 49 anos, de 280. Estas também deveriam realizar o aborto?

Qualquer gravidez nessas faixas etárias é considerada de risco. No entanto, o risco obtido pela idade da mulher não é nem deve ser o único critério para a indicação de um aborto. O professor Jorge de Rezende Filho, da UFRJ, que em 2018 foi ao STF defender a descriminalização do aborto, foi entrevistado recentemente pelo O Globo. Na entrevista, sobre a gravidez de uma menina de 11 anos no Piauí, ele disse que, caso houvesse a opção por levar a gravidez adiante, a jovem não sofreria grandes riscos do ponto de vista médico. Reforço que estamos falando do ponto de vista médico, não da brutalidade que esse crime causou.

O conceito penal de aborto é qualquer morte do bebê durante a gravidez, mesmo que com nove meses. Já o conceito médico é de que aborto é até 22 semanas. Esse limite não é uma novidade e já estava estabelecido no documento desde 2012, em texto elaborado pela gestão anterior. Nada mudamos. Aborto é ato médico e deve ser norteado por preceitos éticos. O direito da mulher de interromper a gravidez pela lei não é afetado. No entanto, a idade gestacional deve ser levada em consideração do ponto de vista médico, sem que haja necessariamente a morte do bebê.

As evidências científicas não mostram nenhuma vantagem no feticídio —termo utilizado na literatura médica que a mídia criticou. Mudar o termo não apagará o ato de se matar um bebê de nove meses no ventre materno. A questão é que, após 22 semanas, o médico não deve injetar cloreto de potássio no coração do bebê pelo desejo de matá-lo. Deveria fazer a interrupção da gravidez, oferecendo ao bebê a chance de tentar sobreviver fora do útero e, se necessário, ir para a adoção.

Por fim, ouso dizer que o atual Ministério da Saúde foi o que mais fez pela saúde das mulheres e crianças na história, criando a Rede de Atenção Materna e Infantil e dobrando o orçamento para cuidar de mães e bebês. A defesa da vida da mulher e da criança, desde a concepção, sempre será nossa prioridade.

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