Descrição de chapéu
João Batista Pereira Neto e Pedro Sega Lopes de Azevedo

STF, a convenção da OIT e a demissão sem justa causa

Consequências jurídicas dependerão da modulação de efeitos a ser definida pela maioria dos ministros

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

João Batista Pereira Neto

Advogado, é mestre em direito do trabalho (PUC-SP) e sócio do escritório SA Law

Pedro Sega Lopes de Azevedo

Advogado, é pós-graduado em direito do trabalho (Universidade Mackenzie) e integrante do escritório SA Law

A recente imposição do prazo máximo de 90 dias para a suspensão de julgamentos pelo Supremo Tribunal Federal reacendeu a polêmica sobre a possível proibição de demissões sem justa causa de empregados.

Há a expectativa de que seja reincluída em pauta a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.625 (ADI 1.625), que discute se a Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) —que limita a demissão de empregados— deve valer no Brasil.

A ADI 1.625 foi proposta em 1997 e tem como objeto declarar inconstitucional decreto de 1996, editado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que denunciou e afastou a aplicação da Convenção 158 da OIT (poucos meses após a sua ratificação pelo Brasil).

Sessão plenária do STF em dezembro de 2022 - Carlos Moura/SCO/STF

Dentre outras questões, a tal convenção restringe demissões a situações em que exista uma "causa justificada".

O principal argumento da ADI é de que a denúncia de FHC deveria ter sido confirmada pelo Congresso Nacional —e, sem esse aval, a convenção 158 deveria valer no Brasil.

Além de demissões individuais, a convenção 158 da OIT faz também referência à necessidade de "consulta aos representantes dos trabalhadores" antes de dispensas coletivas.

Esse tema foi analisado em junho de 2022 e, na linha do que prevê a convenção, o Supremo decidiu que empresas têm de envolver o sindicato antes de realizar demissões em massa de trabalhadores.

Sob essa perspectiva, eventual procedência da ADI 1625 denotaria certa coerência, trazendo ao panorama nacional a aplicação de conceitos da OIT também em relação a demissões individuais.

Porém, há outros pontos a considerar.

1) A Constituição Federal de 1988 prevê como direito do trabalhador a proteção contra demissões arbitrárias ou sem justa causa, "nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória". Em 1989, ano seguinte à sua promulgação, foi instituída a indenização de 40% do FGTS, paga por empresas pela demissão sem justa causa de empregados. Assim, à primeira vista, o tema das demissões já estaria regulado no Brasil: não haveria uma proibição, mas apenas a obrigação de indenizar o empregado. Não se descarta, de todo modo, que se defenda a indenização do FGTS como uma mera compensação financeira, que poderia coexistir com uma proteção mais efetiva —tal como a da Convenção 158 da OIT. Seriam, então, mecanismos complementares (e não excludentes).

2) A convenção 158 não proíbe a demissão de empregados —apenas exige uma motivação, seja ela por questões comportamentais, de desempenho individual ou por necessidades próprias da empresa. Estivesse em vigor, seriam vedadas apenas demissões arbitrárias, "sem motivo".

3) A obrigação de justificar demissões é mesmo controversa. Basta notar que, de 180 países integrantes da OIT, apenas 35 ratificaram a convenção 158.

Está claro que a não ratificação (ou a sua denúncia) pelo Brasil não está desalinhada do que decidiu a grande maioria dos países-membros da OIT. Até agora foram proferidos 7 votos, 6 deles defendendo a necessidade de convalidação de denúncias de tratados internacionais pelo Congresso Nacional.

No entanto, as consequências jurídicas desse potencial resultado dependerão da modulação de efeitos a ser definida pela maioria dos ministros.

A esse respeito, dois deles sugerem que a decisão não afete denúncias já realizadas. Embora ainda não tenha votado, o ministro Gilmar Mendes também indicou posicionamento nesse sentido.

Prevalecendo essa modulação, a denúncia da convenção 158 permaneceria válida. Seria uma saída jurídica mais segura para a questão, sem impactar o panorama atual: possibilidade de dispensas individuais imotivadas.

De outro lado, caso a ADI 1.625 seja julgada procedente sem essa ressalva, empresas passariam a ter de justificar suas demissões. Isso se a convenção não for novamente denunciada —desta vez também pelo Congresso Nacional.

TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.