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Maiara Folly e João Cumarú

Brasil precisa reerguer parceria estratégica com a China

Agenda propositiva em clima e meio ambiente pode gerar benefícios múltiplos

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Maiara Folly

Diretora-executiva da Plataforma Cipó, instituto de pesquisa dedicado a temas de clima, governança e relações internacionais

João Cumarú

Pesquisador da Plataforma Cipó

A busca por uma postura equidistante entre EUA e China será uma das marcas da política externa brasileira, de forma a preservar autonomia e evitar que interesses nacionais sejam prejudicados caso o Brasil se veja forçado a escolher um lado na disputa entre os dois gigantes.

Em visita recente do presidente Lula (PT) a Washington, os EUA anunciaram a intenção de prover financiamento ao recém-reativado Fundo Amazônia —um voto de confiança ao compromisso do novo governo de retomar o combate ao desmatamento. Como parte da estratégia de equidistância, o gigante asiático também deveria ser incentivado a contribuir para o fundo. Afinal, a China é hoje o maior importador de produtos brasileiros associados ao desmatamento, como carne e soja.

A visita prevista de Lula a Pequim oferece uma janela de oportunidade para avançar a cooperação bilateral em clima e meio ambiente. Um bom ponto de partida seria uma declaração política sobre o tema, nos moldes do que fizeram os EUA e a China.

Apesar das disputas econômicas e geopolíticas, em dezembro de 2022 os dois países publicaram uma declaração conjunta. No texto, reafirmam a intenção de "preencher lacunas" nos esforços globais contra a crise climática, inclusive através da cooperação em energia limpas e na eliminação do desmatamento ilegal global. Apesar de suas limitações, iniciativas como essa contribuem para a construção de confiança e podem impulsionar uma agenda positiva de longo prazo. O Brasil poderia propor a Pequim uma declaração conjunta fundamentada em interesses comuns, incluindo o objetivo de promover cadeias produtivas livres do desmatamento. Além de contribuir para proteção de biomas ameaçados, um comércio pautado em cadeias bem rastreadas e livres de ilícitos ajudaria a promover a segurança alimentar, uma grande prioridade do Partido Comunista Chinês e do governo brasileiro.

Do ponto de vista do clima, a declaração pode servir não apenas para que ambos reconheçam a urgência de avançarem no enfrentamento à crise climática, mas também para firmar intenção de fortalecer a concertação política em fóruns multilaterais e na implementação das três Convenções da ONU que tiveram origem no Rio de Janeiro em 1992: sobre clima, biodiversidade e desertificação.

Brasil e China poderiam, ademais, sinalizar o intuito de engajar outros países em desenvolvimento em projetos de cooperação Sul-Sul em áreas como adaptação climática, conservação da biodiversidade, transição energética, agricultura de baixo carbono e monitoramento de florestas com uso de satélites.

Por fim, a declaração poderia incluir um apoio público da China à intenção do Brasil de sediar a 30ª Conferência da ONU para o clima, a COP30, e formalizar o interesse em elevar ainda mais a agenda de infraestrutura verde do Novo Banco de Desenvolvimento dos Brics.

Apesar das relações estremecidas nos últimos quatro anos, o Brasil se beneficia de um histórico de cooperação pragmático e amistoso com o gigante asiático. Ao buscar reerguer sua parceria estratégica com a China a partir de uma agenda propositiva em clima e meio ambiente, o Brasil poderá gerar benefícios não apenas para a população e os biomas brasileiros, mas para o planeta como um todo.

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