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Kananda Eller

Divulgação científica para todos

Podemos conversar e também romper com as estruturas formais de ensino

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Kananda Eller

Química, mestranda em ensino de ciências ambientais (USP São Carlos) e divulgadora científica nas redes sociais através do perfil “Deusa Cientista”

Que ciência é importante você já sabe. Mas quem é responsável por tornar a ciência mais próxima das pessoas no geral? Eu sou Kananda Eller, conhecida como "Deusa Cientista" nas redes sociais e vim falar para vocês sobre o meu trabalho —ou melhor, sobre o trabalho das divulgadoras científicas nas mídias digitais.

As divulgadoras científicas são responsáveis por traduzir o conhecimento especializado da comunidade científica para o público em geral. Depois do contexto pandêmico, muitas e muitos cientistas também foram requisitados e passaram a compartilhar conhecimentos —que na internet ganharam grande espaço devido ao isolamento social.

Kananda Eller, divulgadora científica
A divulgadora científica Kananda Eller - Divulgação

Para quem ainda acredita que plataformas como o TikTok são somente aplicativos para humor e dancinhas, vale mergulhar no mundo de educadores e divulgadores científicos que tem se destacado trazendo informações que rompem e, ao mesmo tempo, conversam com as estruturas formais de ensino.

Um dos fatos evidentes na divulgação científica é a disparidade de gênero —e não só gênero, mas racial. Mulheres negras e indígenas são minoria nas pesquisas científicas, corpo docente, corpo discente e até mesmo premiações que envolvem o mundo digital e a comunidade científica.

A diversidade nas ciências ainda é baixa, e na divulgação científica não é diferente. Em uma dissertação intitulada "Divulgação Científica e Gênero: O Olhar de Jovens Mulheres para a Temática Mulheres nas Ciências em Vlogs", a pesquisadora Renata Borges destacou que o selo nacional Science Vlogs Brasil (SVBr), que atesta a qualidade de canais de divulgação científica no YouTube, reúne atualmente 60 canais de divulgadores científicos, mas apenas 4 são inteiramente comandados por mulheres. Lendo esse trabalho, perguntei-me: "Onde estão as mulheres negras e indígenas?". Constatei que, das quatro divulgadoras que fazem parte da SVBr, somente uma é mulher negra (nenhuma indígena).

Nenhum desses quatro perfis de mulheres chega a 110 mil seguidores no YouTube, sendo os maiores canais de divulgação científica na plataforma comandados por homens brancos, somando mais de 1 milhão de seguidores. Nós, mulheres divulgadoras científicas, não queremos só falar, queremos ser ouvidas. Muitos trabalhos nas redes sociais têm se proposto a falar dessa diversidade, que não é discutida em instituições formais de ensino e mídias tradicionais —o que faz da divulgação científica na internet um lugar muito importante e libertador.

No meu trabalho de divulgação científica, já falei sobre a química envolvida na fermentação do pão produzido no Egito antigo, que é uma civilização negra. Esse vídeo me rendeu indicação ao TikTok Awards. Falei também sobre a química do cabelo crespo, mulheres negras que produziram wi-fi, GPS e quimioterapia, assim como alquimistas negros.

Existem muitas denúncias de criadores de conteúdo negro sobre como redes digitais interferem no alcance de suas publicações. No site criado por Tarcízio Silva, pesquisador e mestre em comunicação, ele construiu a "Linha do Tempo do Racismo Algorítmico: Casos, Dados e Reações". No material, é possível constatar inúmeros casos de racismo reproduzidos por plataformas digitais.

A implementação acelerada de tecnologias digitais emergentes, que são construídas por pessoas brancas, impacta negativamente pessoas negras, indígenas e asiáticas no mundo. Por isso, a tecnologia criada somente pelos mesmos rostos se configura uma barreira para divulgadoras científicas negras e indígenas. Entendendo todos esses desafios que mulheres negras e indígenas enfrentam, faz-se importante apoiar trabalhos que desafiam as estatísticas e aproximem a ciência do público em geral para que, assim, tenhamos desenvolvimento científico que se comprometa ainda mais com a realidade e uma comunicação científica com protagonismo plural.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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