Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criou uma armadilha para seu governo ao insuflar uma cruzada populista contra as taxas de juros e a autonomia do Banco Central: doravante, todos os movimentos relacionados à política monetária serão examinados com lupa e estarão sujeitos a reações de desconfiança.
É o que ocorre agora com as primeiras indicações de Lula para a cúpula do BC —a do servidor Ailton Aquino dos Santos, para a diretoria de Fiscalização, e, sobretudo, a do economista Gabriel Galípolo para a de Política Monetária.
Em circunstâncias normais, escolhas do gênero não despertariam maior preocupação. Trata-se, afinal, de apenas dois nomes que, se aprovados pelo Senado, comporão um colegiado de nove com direito a voto na definição dos juros.
Entretanto as atitudes de Lula, seguidas por seu partido e boa parte de seu ministério, suscitam temores justificáveis de que o Planalto queira impor seus interesses políticos na gestão do BC.
Ademais, Galípolo, com experiência no mercado financeiro e hoje o número dois da pasta da Fazenda, já defendeu teses heterodoxas no passado recente, embora venha adotando comportamento discreto desde o início do governo.
O Brasil ainda engatinha na experiência de autonomia formal do BC, instituída em 2021 com o objetivo de fortalecer o controle da inflação —que, dos males econômicos, é o mais socialmente perverso.
Gestões anteriores, porém, já haviam concedido autonomia na prática ao órgão, com bons resultados.
Entre eles destacam-se os do próprio Lula, quando os juros, aliás, se mantiveram por anos acima dos patamares atuais. Só um oportunismo rasteiro, portanto, explica a celeuma atual em torno do tema.
A definição das taxas, evidentemente, merece questionamento e debate técnico especializado, que não deve estar circunscrito à autoridade monetária. É também natural e mesmo desejável que executivos com diferentes pontos de vista participem das deliberações.
Indicados pelo governo petista serão maioria no Comitê de Política Monetária (Copom) a partir de 2025, quando também será substituído o presidente do BC, Roberto Campos Neto. Especula-se que Galípolo poderá ocupar o posto.
Até lá, é possível que o surto inflacionário herdado da pandemia de Covid-19 já esteja inteiramente superado, o que tornará a missão do órgão menos controversa.
Em qualquer hipótese, convém que os escolhidos zelem desde logo por sua credibilidade. Sinais de leniência com a inflação, de submissão a pressões políticas ou de propensão a experimentalismos temerários não raro resultam na necessidade de juros mais altos, como se viu sob Dilma Rousseff (PT).
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