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Literatura limitada

Restrições a livros aumentam no mundo, expondo preconceito ou hipersensibilidade

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Livros banidos em escolas e bibliotecas públicas da Pensilvânia (EUA) à venda numa livraria - Hannah Beier/Reuters

Conservadores radicais nos Estados Unidos vêm conseguido banir livros de bibliotecas e escolas públicas. Segundo levantamento da ONG Pen America, mais de 2.500 proibições foram emitidas por juntas escolares em 32 estados americanos no ano letivo de 2021-22.

A maioria das obras aborda questões de gênero ou raciais. Com 801 proibições, o Texas lidera a lista deplorável, seguido por Flórida (566) e Pensilvânia (457).

No Brasil, uma universidade privada de Goiás retirou o livro "Eu Receberia as Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios", de Marçal Aquino, da lista de obras indicadas para o vestibular. A decisão veio após o deputado Gustavo Gayer (PL-GO) acusar a obra de pornografia.

Mas a sanha restritiva não é exclusividade da direita. Em 2019, a escola pública Tàber, em Barcelona, retirou 200 livros destinados a alunos de até seis anos por reproduzirem padrões de comportamento tachados de sexistas por militantes. Entre as obras estavam clássicos como "Chapeuzinho Vermelho" e "A Bela Adormecida".

Outro modo de interditar a arte literária é a edição de trechos considerados ofensivos. Neste ano, no Reino Unido, livros de Roald Dahl, autor de "A Fantástica Fábrica de Chocolate", tiveram trechos alterados para atender ao público que achava sexistas e gordofóbicos alguns dos termos usados.

Aqui, "A Menina do Narizinho Arrebitado", de Monteiro Lobato, também foi reeditado para excluir expressões de fato racistas.

Tais medidas perdem de vista que a literatura é um modo de conhecer o passado e ferramenta poderosa de aprendizado emocional.

Falas preconceituosas de séculos atrás podem ser esclarecidas em notas de rodapé ou com a ajuda de pais e professores. Da mesma forma, se determinadas palavras causam desconforto, trata-se de oportunidade para que o leitor, seja criança ou não, aprenda a lidar com seus sentimentos.

Com relação ao banimento, uma decisão da Suprema Corte da Califórnia já em 1924 havia apontado a falta de sentido da medida: o mero fato de um livro constar do acervo de uma biblioteca não implica que seu conteúdo será aprovado ou adotado pelo leitor.

Passados quase cem anos, leitores à direita e à esquerda ainda precisam compreender que uma biblioteca ou um livro sempre poderá conter algo que desagrade a alguém —e que o escrutínio do debate público é preferível à exclusão.

editoriais@grupofolha.com.br

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