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Cândido Malta Campos Filho

Por uma revisão mais completa dos planos diretores urbanos

É fundamental a coordenação do sistema de transporte com o zoneamento

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Cândido Malta Campos Filho

Arquiteto e urbanista, é professor emérito da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP); ex-secretário de Planejamento da Prefeitura de São Paulo (1976-80, gestões Olavo Setubal e Reynaldo de Barros)

A revisão do chamado Plano Diretor municipal de São Paulo é mais que oportuna. Aliás, é oportuna a revisão de todos os planos diretores de cidades de porte médio e grande —especialmente as metrópoles, que sofreram as consequências das mudanças de hábitos de trabalho em razão do home office.

Sem a coordenação do plano de transporte com o zoneamento, principal tarefa dos planos diretores urbanos, não haverá a necessária convergência da geração das viagens originadas pelo perfil das atividades de determinada região, demandando transporte e sua oferta. Sem ela haverá provável congestionamento de tráfego de veículos e superlotação ou ociosidade no transporte coletivo. O único modo de obter o desejado casamento entre oferta e demanda de transporte é através do planejamento conjugado do sistema de circulação. Este irá dimensionar a oferta de capacidade de transporte e a demanda por ele definida pelo zoneamento.

O mercado, por si só, não consegue obter essa desejada convergência. Isso porque a oferta de transporte coletivo, mormente nos grandes corredores de tráfego, ocorre por saltos. Um corredor de ônibus em faixa exclusiva custa caro, especialmente quando exige desapropriações maciças para alargamento viário —ou uma linha de metrô quando impõe a construção de túneis. São obras que levam anos para serem implantadas. Se não há coordenação entre uma definição pelo zoneamento sobre onde deve ocorrer uma futura demanda por transporte e a previsão da oferta necessária para atendê-la, o sistema de transporte ficará correndo atrás do prejuízo.

A situação presente em São Paulo é ruim —de congestionamentos crescentes, porém ainda não catastróficos— porque o home office reduziu a demanda por transporte. Contudo, o retorno paulatino para o trabalho presencial nos escritórios, como alertam os que monitoram o trânsito nas grandes áreas urbanas, está eliminando ou ao menos reduzindo a vantagem que havia sido obtida com o trabalho em casa.

Ademais, as novas tecnologias estão modificando os modos de transporte alternativos, sejam os micromodos de transporte, sejam os aplicativos de chamada dos vários modos coletivos, que alteram significativamente o uso do espaço viário público. Assim, é preciso considerá-los de forma conjugada, inclusive definindo a capacidade de suporte do sistema de circulação de modo articulado com o zoneamento das atividades na cidade.

Inúmeros artigos e entrevistas apontam nessa direção, como a defesa de um verdadeiro "SUS do transporte público" pelo prefeito de Aracaju, Edvaldo Nogueira (PDT), da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), e por Luiz Carlos Mantovani Néspoli, da ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos), conforme publicado no jornal O Estado de S. Paulo. Nesta Folha, a colunista Lúcia Guimarães também tem apontado questões relacionadas desde Nova York.

Essas diretrizes de transporte, envolvendo a indústria automobilística, devem vir do governo federal. Mas será no nível local, municipal ou metropolitano, que tais diretrizes serão aplicadas no território. E pelos planos diretores!

O que se conclui é a premência da revisão das políticas municipais orientadoras dos planos diretores, como exigido pela Constituição Federal, o que inclui políticas de mobilidade urbana e dos próprios planos diretores que as aplicam. Revisões parciais devem ser evitadas, especialmente aquelas que modifiquem diretrizes de adensamento urbano sem considerar o devido cálculo da capacidade de suporte do sistema de circulação, definindo potenciais construtivos de uso residencial e uso misto adicionais aos existentes, de modo a fazer convergir a oferta de mobilidade urbana planejada para atender a demanda decorrente do zoneamento de usos ou atividades urbanas. Exigirá, por certo, nova base de dados e adequados softwares, dentro do conceito de "smart cities" ("cidades inteligentes").

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