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O padrão Aras

Após vexame do nomeado por Bolsonaro, Lula deveria usar lista tríplice para PGR

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Augusto Aras, ex-procurador-geral da República, e Jair Bolsonaro (PL) - Adriano Machado/Reuters

Terminou com as inconfundíveis notas de pusilanimidade a passagem de Augusto Aras pela Procuradoria-Geral da República.

Desde 2019 à frente de uma instituição responsável por defender os interesses da coletividade e vigiar o poder, Aras se notabilizou pelo oposto disso: em vez da independência, a fidelidade canina ao presidente da República; em vez do espírito combativo, a omissão diante dos mais variados e graves desmandos de Jair Bolsonaro (PL).

Neste ano, depois que a chefia do governo federal tinha trocado de mãos, ele resolveu agir. Criou um grupo para responsabilizar os envolvidos na intentona golpista de 8 de janeiro e abriu inquérito contra três deputados bolsonaristas recém-diplomados que teriam incentivado os atos antidemocráticos.

Assim o fez não por convicção, pois não faltaram oportunidades para demonstrá-la antes, mas por querer se aproximar do novo presidente da República e, quem sabe, ampliar suas chances de permanecer no cargo.

Atirou-se nesse mister com tal afinco que nem se preocupou em preservar algum senso do ridículo. Na segunda-feira (25), um dia antes de deixar a PGR, Aras exaltou sua atuação para manter o equilíbrio democrático no Brasil e afirmou que "um dia, adiante", essa história será detalhada.

Entabulava, com essa referência fantasiosa, uma conversa com Dias Toffoli, ministro do Supremo Tribunal Federal que, horas antes, em outra cerimônia, havia enaltecido "a paciência, a discrição e a força do silêncio" de Aras para evitar uma ruptura institucional.

Que queira se reinventar é coisa que se compreende; que Toffoli o ajude a fazê-lo escapa até à imaginação. Onde o magistrado viu paciência, discrição e força do silêncio havia, de fato, submissão, apatia e cumplicidade.

Aras nada fez quando Bolsonaro negligenciou os cuidados mais básicos no enfrentamento da Covid-19. Tampouco reagiu às reiteradas investidas contra a ordem democrática e a harmonia entre os Poderes. Se o país se manteve de pé, foi apesar do agora ex-procurador-geral, e não por causa dele.

O fim de seu mandato abre uma oportunidade para Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Primeiro presidente a nomear para a PGR alguém votado em lista tríplice pelos membros da carreira, o petista deveria retomar essa tradição e mostrar que se diferencia do antecessor no que tange a compromissos democráticos e condutas republicanas.

Infelizmente, o mandatário não deu sinais de que seguirá esse curso virtuoso. Pois, se restou um legado positivo de Aras na PGR é este: não há argumento mais eloquente a favor da lista tríplice do que a vergonha de seus dois mandatos.

editoriais@grupofolha.com.br

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