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Estefânia Maria de Queiroz Barboza e Melina Girardi Fachin

Mais mulheres no Judiciário é questão de credibilidade

Se tribunais brasileiros mostrarem o caminho, outros setores poderão segui-lo

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Estefânia Maria de Queiroz Barboza

Advogada e professora de direito da UFPR e Uninter

Melina Girardi Fachin

Advogada e professora de direito da UFPR

Esteve em pauta no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mudança na resolução 106, com o objetivo de promover a inclusão de mais mulheres nos tribunais brasileiros. A razão para essa discussão é clara: os critérios de antiguidade e merecimento, que atualmente orientam as promoções na carreira, não têm sido eficazes em eliminar as disparidades de gênero na composição das cortes.

A resolução foi aprovada nesta terça-feira (26), por maioria, para inclusão de critério de gênero na promoção por merecimento —já nas promoções por antiguidade, a proposta foi rejeitada.

A ministra Rosa Weber, presidente do Conselho Nacional de Justiça e do Supremo Tribunal Federal - Pedro Ladeira/Folhapress - Folhapress

De acordo com um levantamento do próprio CNJ, a maioria dos tribunais do país apresenta percentuais de participação feminina inferiores a 25%, ficando aquém do padrão nacional estabelecido. Vale ressaltar que em tribunais como os do Amapá e de Roraima, não há nenhuma desembargadora, refletindo uma realidade flagrantemente desigual.

Contudo, mesmo diante desse cenário incontestável, surgiram movimentos contrários à reforma da resolução e à inclusão do critério de gênero, sob a justificativa de que homens altamente qualificados poderiam ser preteridos. No entanto, o conceito de merecimento não leva em consideração as desigualdades estruturais existentes em nossa sociedade, que resultam da divisão sexual do trabalho, bem como dos modelos de socialização masculinos que promovem espaços para a discussão da ascensão profissional, muitas vezes indisponíveis para as mulheres.

Isso se torna particularmente relevante quando observamos que a promoção no Judiciário, apesar de aparentemente usar critérios neutros, se baseia em uma métrica que valoriza um padrão masculino de dedicação quase exclusiva à carreira, algo que é dificultado para muitas mulheres devido às expectativas sociais relacionadas aos seus papéis familiares e domésticos.

A teoria do impacto desproporcional, utilizada pela Suprema Corte dos Estados Unidos e em precedentes do STF, destaca como políticas aparentemente "neutras" podem, na verdade, reforçar desigualdades estruturais. Aplicada ao contexto atual, a teoria serviria para questionar a ideia de justiça e objetividade nos critérios de antiguidade e "merecimento", especialmente quando estes prejudicam de forma desproporcional um grupo já vulnerável, como o das mulheres.

O debate atual transcende a questão da promoção de magistradas. Ele reflete a necessidade de redefinir os conceitos de "igualdade" e "meritocracia". A discussão sobre a inclusão de mais mulheres nos tribunais brasileiros é um requisito incontornável para instaurar um sistema judicial que seja não apenas justo, mas também representativo da diversidade da sociedade que ele serve.

Quando negligenciamos essa diversidade, comprometemos não só o avanço profissional de inúmeras mulheres qualificadas, mas também a credibilidade, a integridade e a eficiência de todo o sistema jurídico brasileiro. Se os tribunais brasileiros mostrarem o caminho, outros setores poderão segui-lo.

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