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Luciana Saddi e Natália Vignoli

Novas drogas para emagrecer: o impacto do controle social do corpo

Abordagem psicológica é indispensável para lidar com imagem corporal

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Luciana Saddi

Psicanalista (SBPSP), mestre em psicologia clínica (PUC-SP), fundadora do Grupo Corpo e Cultura e coordenadora do ciclo de cinema e psicanálise organizado pela SBPSP, MIS e Folha de S.Paulo

Natália Vignoli

Mestre em nutrição (São Camilo), é especializada em nutrição clínica, materno-infantil e transtornos alimentares e integrante do Grupo Corpo e Cultura

A clínica psicanalítica e nutricional enfrenta, hoje, o crescimento dos problemas e transtornos alimentares dos últimos 50 anos. Cada vez mais, come-se de forma "externalizada", e delega-se às dietas o complexo trabalho que o comer exige. As dietas fazem parecer simples algo bastante intricado. Interferem e prejudicam a conexão sujeito/corpo/mundo. O resultado é a desconexão dos sinais de fome, saciedade e prazer em comer.

A questão central é a perda de autonomia alimentar. Define-se mentalidade de dieta como fenômeno cultural formado pela exposição frenética de corpos extremamente magros como padrão de beleza, circulação de informações pseudocientíficas, ideais inatingíveis, sofrimento psíquico, fobia de gordura e confusão em relação ao binômio alimentação/aspecto corporal. Sabe-se que, frequentemente, os transtornos alimentares se iniciam com restrições de alimentos, dietas e insatisfação com a imagem corporal.

A modelo Stephanie Naumoska, 1,80 m e 49 quilos, que causou polêmica no Miss Universo Austrália em 2010 por causa de sua magreza - Renato Stockler/Reuters

O modo de vida atual contribui para o consumo de alimentos industrializados e de alto valor calórico. Observa-se, também, redução no tempo gasto nas refeições e piora na qualidade de vida. A indústria alimentícia favorece o consumo de alimentos ultraprocessados, de fácil acesso, com baixo custo e sob a denominação, eventualmente verdadeira, de alimento saudável. As indústrias da saúde e estética lucram com padrões de beleza e estereótipos de magreza. Medicamentos prometem solução "fácil e sustentável" para emagrecer.

As novas drogas para perda de peso como Ozempic e Wegovy, podem ser alternativa mais segura do que as antigas, pelo que se conhece hoje, mas ainda trazem antigos desafios não resolvidos, como manutenção e reganho do peso perdido após a interrupção do tratamento. É essencial combinar essas drogas com mudança no estilo de vida e tratamento multidisciplinar, que inclua a reconexão com os sinais de fome, saciedade e prazer em comer, pois as dietas alienam os indivíduos da percepção que orienta e organiza a alimentação. É fundamental identificar os episódios em que afetos são aliviados com comida e necessidades emocionais transferidas para a relação com o alimento. Indispensável conhecer as funções de gordura e magreza na economia psíquica.

A mentalidade de dieta também causa ódio constante relacionado ao corpo, muitas vezes ligado a questões psicológicas profundas. A psicanálise oferece insights valiosos na compreensão de complexos problemas emocionais relacionados à alimentação, além de desenvolver técnicas, desde os anos 70, com o objetivo de recuperar a autonomia alimentar. A psicanalista Susie Orbach contribuiu com obra fundamental para o tratamento desses sintomas, publicado sob título contundente: "Gordura é uma questão feminista".

Em resumo, as novas drogas para emagrecer parecem oferecer alguma esperança, mas o autoconhecimento e a abordagem psicológica permanecem como ferramentas indispensáveis para lidar com os problemas alimentares, imagem corporal e peso. Psicanálise e nutrição ainda têm muito a contribuir nesse campo.

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