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Bruno Langeani

Armas de guerra do Estado são entregues de bandeja ao crime organizado

Controle mais rígido de arsenais públicos torna-se ainda mais urgente

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Bruno Langeani

Gerente de projetos do Instituto Sou da Paz

Após quatro anos de governo Jair Bolsonaro (PL), a missão do Exército em contribuir para o controle do mercado legal de armas e fiscalizar as fronteiras para interromper fluxos ilegais de armas e munições não só não foi cumprida como caminhou em sentido inverso. Foi com anuência ou apoio direto dessa Força que o então presidente liberou até 30 fuzis por pessoa, abrindo espaço para esquemas ilegais de fornecimento ao crime. No mesmo sentido, a instituição aceitou sem questionar a ordem emanada por uma rede social de Bolsonaro para revogar portarias que melhoravam o rastreio de armas.

É com essa péssima performance e no curso de uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o tema que o Brasil foi surpreendido com o mais grave desvio de armas do Exército, pelo menos desde 2009, segundo levantamento do Instituto Sou da Paz. Para além da quantidade recorde —21 metralhadoras— foram desviadas de quartel em Barueri (SP) armas automáticas que disparam centenas de projéteis por minuto e atingem com efetividade alvos a dois quilômetros.

A imagem mostra uma fileira de armas
Armas furtadas do Exército encontradas em Carapicuíba, na região metropolitana de São Paulo - Divulgação/Polícia Civil - Divulgação/Polícia Civil

A gravidade se acentua: uma semana se passou entre a descoberta do problema e a confirmação de que as armas estavam em paradeiro desconhecido. Posteriormente descobriu-se que, apesar do alerta ter sido emitido dia 10 de outubro, o arsenal havia sumido semanas antes. Isso demonstra a fragilidade do controle de artefatos perigosos em área militar, de onde se espera controle exemplar.

Felizmente, a polícia fluminense, após trabalho investigativo, conseguiu recuperar dez metralhadoras. Justamente a polícia do Rio, que mais sente na pele o risco desse armamento para a atividade policial, já que em 2009 um helicóptero blindado da polícia foi abatido no Morro dos Macacos e três agentes morreram. Outras nove armas foram encontradas em São Roque pela Polícia Civil de São Paulo, após tiroteio. Nos dois casos não houve prisões.

Há anos o Instituto Sou da Paz tem chamado atenção para a urgência da melhoria do controle de arsenais públicos. Em 2021, foi lançado relatório que demonstrou que, em cinco anos, 323 armas e 18 mil munições foram desviadas de forças federais. Mas os desvios são abundantes também em forças estaduais. Reportagem apontou que criminosos do PCC que realizaram um mega-assalto a empresa de valores em Confresa (MT) tinham fuzis novos desviados da Polícia Militar de São Paulo no ano de 2021.

Recentemente, o Conselho do Ministério Público passou a estudar uma cobrança mais firme de controle de arsenais das polícias e, durante o processo, descobriu que muitas ainda não possuem sistema informatizado de controle de suas armas.

No caso de Barueri, espera-se que as últimas metralhadoras possam rapidamente ser recuperadas, mas, sobretudo, que este e outros casos sirvam de exemplo. Que sejam revistos para identificação de todas as falhas que contribuíram para desvios que colocam armas pagas com dinheiro público para gerar medo e violência na população e fortalecer o crime organizado. Não é aceitável que 21 metralhadoras desapareçam e que nada seja feito para que novos casos não se repitam.

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