O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem desde seu início o afã de regular o trabalho de transporte por aplicativos, no que infelizmente se mostra movido por uma visão sindicalista do século passado e pelo ímpeto polarizador dos anos recentes da política nacional.
Manifestações sobre o tema foram contaminadas por hostilidade despropositada contra as empresas do setor. No ano passado, o ministro Luiz Marinho, do Trabalho, disse que a Uber poderia ser substituída pelos Correios, se deixasse o país. Nesta semana, Lula prometeu "encher tanto o saco que o IFood vai ter de negociar".
O mandatário cometeu a diatribe durante cerimônia de lançamento do projeto de lei complementar enfim apresentado sobre o tema, resultado de discussões que transcorreram nos últimos meses sem chegar a um consenso —tanto que a atividade dos entregadores ficou fora do texto, limitado ao transporte de passageiros.
A negociação teve o mérito de tirar da mesa algumas das ideias mais problemáticas, em especial a contratação de motoristas pela CLT. Pela proposta, os profissionais serão reconhecidos como autônomos. Fixam-se também contribuição ao INSS, remuneração mínima e limitação da jornada.
Está-se diante de um serviço inovador, proporcionado por vertiginosos avanços da tecnologia e cujo sucesso depende da flexibilidade para contratações, horários e tarifas. A regulação, portanto, é desafiadora em todo o mundo.
No Brasil, o IBGE calculou haver 1,5 milhão de pessoas trabalhando por meio de aplicativos e plataformas digitais ao final de 2022, o correspondente a 1,7% da população ocupada no setor privado. Desse grupo, pouco mais da metade (52,2%) transportava passageiros, 39,5% eram entregadores e 13,2% prestavam outros serviços.
Apenas 35,7% deles contribuíam para a Previdência Social, o que de fato é motivo de preocupação. A mazela da informalidade, no entanto, é muito mais ampla no mercado de trabalho brasileiro.
No cálculo político, o contingente dos motoristas é frequentemente listado como uma das bases do bolsonarismo, o que tende a aguçar as resistências ao projeto governista no Congresso.
O debate precisa avançar com mais estudos e avaliações técnicas, sem açodamento nem bandeiras ideológicas. O processo de modernização da legislação trabalhista deve prosseguir de modo a proporcionar a formalização em condições realistas.
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