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Danny Quah e Nicolai Ruge

Um novo curso para o comércio global

Com mais benefícios, atividade pode ser 'protegida' da rivalidade geopolítica

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Danny Quah

Reitor e professor de economia Li Ka Shing (Escola de Políticas Públicas Lee Kuan Yew, Universidade Nacional de Cingapura)

Nicolai Ruge

Líder de geopolítica e comércio no Fórum Econômico Mundial

Ministros do Comércio de todo o mundo estão reunidos em Abu Dhabi para a 13ª Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio.

A conferência ocorre em um momento em que a economia global está em um estado frágil. O comércio, que ajudou 1 bilhão de pessoas a sair da miséria nas últimas décadas, está enfrentando fortes ventos contrários com o aumento das forças protecionistas.

Diante desse cenário, a conferência é essencial para determinar o futuro do comércio global. À medida que os países reposicionam e fortalecem suas cadeias de valor com aliados devido a legítimas preocupações com a segurança nacional, torna-se essencial que os ministros reformulem o atual sistema global de comércio para evitar que essas tendências resultem em uma fragmentação severa, o que poderia custar à economia global até 7% do PIB, de acordo com o FMI.

A diretora-geral da Organização Mundial do Comércio, Ngozi Okonjo-Iweala, discursa na 13ª Conferência Ministerial da OMC em Abu Dhabi - Giuseppe Cacace/AFP - AFP

A diretora-geral da OMC, Ngozi Okonjo-Iweala, tem plena consciência e apelou para a necessidade de "estarmos prontos para arregaçar as mangas e trabalhar em Abu Dhabi".

Mas como deve ser esse trabalho para fazer uma diferença real?

Na agenda, estão os esforços para promover o comércio internacional e reformar a própria OMC, como a eliminação dos subsídios que incentivam a pesca predatória, a extensão da moratória sobre as tarifas do comércio eletrônico transfronteiriço e a restauração do sistema de resolução de disputas comerciais.

No entanto, por mais importantes que sejam essas questões, abordá-las individualmente —com sucesso incerto, dada a necessidade de consenso— pode ter, no máximo, um impacto marginal. A decisão necessária de admitir dois novos membros na organização, Timor Leste e Comores, também não pode ser considerada um progresso significativo se tópicos importantes forem mais uma vez deixados de lado.

Os líderes em Abu Dhabi precisarão ser ambiciosos e se concentrar em lidar com os dois fatores subjacentes que permitiram que a desglobalização se estabelecesse: primeiro, que o comércio é visto como desalinhado com as prioridades globais; segundo, que seus ganhos não foram distribuídos de forma equitativa dentro dos países e entre eles.

O fortalecimento do sistema comercial deve significar, antes de tudo, a expansão da agenda comercial para além do fornecimento de eficiências. Em vez disso, o comércio precisa promover a ação climática e a inclusão social por meio de compromissos multilaterais contra uma "corrida para o fundo do poço" em termos de padrões ambientais, trabalhistas e de consumo.

Quanto mais amplos forem os benefícios proporcionados pelo comércio, mais firmemente ele estará alinhado com as prioridades globais, como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Isso, por sua vez, permitirá que o comércio gere mais confiança nos governos e nos cidadãos. A atividade pode ser "protegida" da rivalidade geopolítica, em vez de ser interrompida para obter vitórias políticas de curto prazo.

Depois, é preciso desenvolver mecanismos comerciais mais inclusivos. Em especial, os países menos desenvolvidos e com restrições estruturais, como instituições frágeis, mercados fracos e uma base de conhecimento limitada, enfrentam dificuldades para aproveitar ao máximo as oportunidades oferecidas pela globalização. Entre 2011 e 2020, as exportações de bens e serviços dos países menos desenvolvidos se contraíram, e sua participação nas exportações globais estagnou. O pouco crescimento econômico que ocorreu, na maioria dos casos, não chegou aos mais pobres.

É provável que as medidas restritivas ao comércio baseadas em preocupações legítimas com a segurança nacional continuem sendo uma característica do comércio global. Para aumentar a transparência, a certeza e a confiança mútua, essas medidas devem ser delimitadas, ou seja, focadas, proporcionais e com prazo determinado.

Uma agenda de comércio global expandida e reequilibrada não pode ser alcançada facilmente em tempos em que a confiança está sendo corroída pela rivalidade geopolítica. No entanto, se os ministros saírem de Abu Dhabi apenas com conquistas simbólicas, uma oportunidade terá sido perdida para fortalecer um sistema de interdependência econômica que proporcionou imensos, embora imperfeitos, benefícios. A alternativa —uma economia global mais fragmentada e protecionista— deixará todos em situação pior e será uma oportunidade perdida de fortalecer a ação coletiva nas questões ambientais, econômicas e sociais com as quais a maioria dos países se preocupa.

* Este artigo se baseia no relatório do Fórum Shaping Cooperation in a Fragmenting World ("Moldando a Cooperação em um Mundo Fragmentado")

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