Descrição de chapéu
O que a Folha pensa

Milei precisa saber lidar com limites políticos

Reformas liberais são necessárias na Argentina, mas derrotas no Legislativo mostram que confronto é estratégia perigosa

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Javier Milei, presidente da Argentina - Ammar Awad/Reuters

Javier Milei completa cem dias à frente do governo argentino pouco depois de sofrer mais uma derrota legislativa que mostra seus limites políticos. Foi rejeitado pelo Senado o Decreto de Necessidade e Urgência (DNU), que declara emergência pública até o fim de 2025 e promove alterações profundas na regulação da economia do país.

A votação por 42 a 25 (quatro abstenções) contra o texto piora a já conflituosa relação entre o mandatário e o Legislativo. O placar revela dificuldades mesmo com parlamentares de centro-direita a princípio simpáticos ao novo governo, que tampouco são poupados pela retórica agressiva de Milei.

Mesmo com a rejeição, o decreto continua em vigor até que os deputados se pronunciem, o que ainda não tem data para ocorrer. Mantidas por ora, as novas regras —que eliminam subsídios à energia, removem congelamentos, cortam despesas públicas, abrem mercados e contêm o poder dos sindicatos— funcionam como pilar ainda frágil da nova política econômica.

Milei já fora obrigado a retirar do Legislativo a chamada emenda ônibus, com centenas de artigos, em razão de forte oposição de governos provinciais. A tentativa agora é negociar um pacto de dez pontos com os governadores.

Até lá, o ultraliberal depende de que apareçam resultados positivos de suas medidas. A liberação de preços antes congelados, a desvalorização do câmbio oficial e o corte dramático de gastos, necessários, agravaram de imediato a recessão e o aumento da pobreza.

De melhor, houve superávit orçamentário no primeiro bimestre e notam-se sinais incipientes de menor pressão inflacionária, embora as taxas sigam exorbitantes. Em 12 meses, são 276,2%; do pico de 25,5% em dezembro, mediu-se recuo para 13,2% em fevereiro.

Milei conta com alguma sorte também para recompor reservas em moeda forte com a alta da safra agrícola deste 2024, que reverte a quebra do ano passado e deve impulsionar exportações. É digno de nota que o peso vem se fortalecendo nas últimas semanas.

Minoritário no Parlamento, o governo por ora continua apostando no confronto, na crença de que o mandato popular lhe dá maior margem de manobra. Trata-se de estratégia obviamente perigosa.

Pesquisa de opinião indica que o eleitorado argentino está quase exatamente dividido entre a aprovação e a reprovação a Milei —que tem argumentos poderosos ao apontar o desastre econômico legado pela administração de esquerda que o precedeu.

Nada disso o exime, porém, de buscar diálogo e negociação dentro dos limites democráticos. Substituir um populismo por outro não solucionará o drama argentino.

editoriais@grupofolha.com.br

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.