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Felipe Diniz

O marco regulatório do hidrogênio verde é adequado? NÃO

Regramento ajuda, mas não destrava a indústria por completo

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Felipe Diniz

Economista, é mestre (EPGE/FGV) e doutor em economia (Universidade de Chicago) e sócio da consultoria Mirow & Co.

O projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados para regular o hidrogênio verde (H2V), significativamente reduzido antes de seguir para o Senado, atende apenas em parte às necessidades de um setor emergente em que o Brasil pode ser líder de mercado. O texto aprovado às vésperas da COP28 estabelece as regras do jogo, como a taxonomia e a governança, mas não apresenta uma política pública robusta que defina a estratégia do país para o setor.

O projeto prevê o Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (PHBC), incluindo leilões como os da Alemanha, porém com recursos limitados. Também garante suspensão de PIS/Cofins para capex [despesa de capital], mas exclui grande parte dos incentivos esperados.

Os temas tratados no PL são fundamentais para a segurança jurídica, porém insuficientes para responder às demandas para o crescimento do setor. Esperava-se do marco regulatório, seguindo o exemplo de países de referência, um conjunto de políticas que promovessem a competitividade do H2V em relação aos combustíveis fósseis. Como resultado, o Brasil poderia não só acelerar sua descarbonização, mas também se posicionar como um player global e desenvolver um mercado doméstico para o H2V, reduzindo a dependência em exportações.

Condições climáticas favoráveis à geração de energia solar e eólica colocam o Brasil no centro do debate do “combustível do futuro” - Benoit Tessier/Reuters - REUTERS

O hidrogênio verde ainda é mais caro que os combustíveis fósseis e, sem incentivos adequados, ficará restrito a nichos de mercado, com poucos compradores dispostos a pagar um prêmio pela descarbonização. Além disso, sem estímulos, o Brasil enfrentará perda de competitividade significativa neste mercado. Estudo da Mirow & Co. estima que, com a retirada dos incentivos do projeto de lei, o H2V brasileiro será 30% mais caro que o dos EUA, apesar do menor custo de produção.

Os argumentos contrários aos subsídios no PL ressaltam três preocupações principais. Primeiramente, questiona-se a viabilidade econômica do hidrogênio na matriz de descarbonização do país, que poderia considerar alternativas como biocombustíveis. Porém, uma estratégia que dependa exclusivamente de biocombustíveis pode limitar a diversificação energética e impedir o desenvolvimento de uma indústria com alto potencial.

Em segundo lugar, a preocupação com o impacto nos gastos públicos é evidente, com o argumento de que os subsídios ao H2V podem aumentar a carga sobre o Orçamento. Contudo, muitos dos incentivos pleiteados consistem em renúncias fiscais, que não representam aumento direto nos gastos do Tesouro. Estes podem ser parcialmente compensados pelas receitas tributárias geradas pela construção de novas plantas, conforme estudo da Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde (ABIHV).

Por fim, há o receio de que possam encarecer a conta de luz, devido à redução de encargos e custos de fio. É importante ressaltar que o aumento na geração renovável deve ser escalonado ao longo de vários anos e que os incentivos propostos devem ser transitórios e limitados a uma capacidade instalada específica. Dessa forma, projetos pioneiros seriam estimulados, minimizando eventuais impactos negativos.

O projeto de lei recentemente aprovado pela Câmara segue para discussão no Senado. Paralelamente, os senadores formularam um projeto alternativo, que busca reintegrar vários incentivos excluídos pelo PL original. Seja como for, o Congresso deve analisar cuidadosamente os custos e benefícios dessa nova tecnologia, considerando os impactos de longo prazo para o país. O Brasil possui um enorme potencial para liderar esse mercado e ter papel de destaque nas discussões globais sobre o clima. Entretanto, não há potencial que resista à falta de estratégia.

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