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Gustavo Bonini Guedes

A Justiça Eleitoral tem elementos para barrar a candidatura de Pablo Marçal? NÃO

Cassação deve ser a última solução; ação judicial ainda necessita de compreensão sobre essa nova ferramenta de campanha, pouco regulada

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Gustavo Bonini Guedes

Advogado, é membro da Comissão de Direito Eleitoral do Conselho Federal da OAB e da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político)

Em regra, toda candidatura registrada na Justiça Eleitoral deverá chegar ao seu destino: a urna eletrônica. Indeferimentos de registros e cassações de mandato, pois, devem ser exceção. E o são. Considerando as eleições de 2020 em 5.568 municípios, apenas 96 candidatos foram barrados (1,72%). Nas cidades com mais de 100 mil habitantes, menos ainda. Foram só 3. Neste ano, esse número deverá ser ainda menor, diante das flexibilizações ocorridas na legislação —vide a nova lei de improbidade e alterações no regramento de inelegibilidades.

Contrariando tal perspectiva, em São Paulo, no maior colégio eleitoral do país, irrompe a discussão sobre indeferimento e/ou cassação da candidatura de Pablo Marçal (PRTB). As ameaças são de duas naturezas: negativa do registro como candidato e/ou cassação da candidatura por ilícitos na campanha. O primeiro diz respeito à análise prévia realizada, avaliando se determinada pessoa pode ou não se apresentar ao eleitor como candidato. Vale lembrar que as impugnações sofridas por Marçal não decorrem dos processos enquanto coach/influenciador, mas sim de uma suposta filiação partidária com menos tempo do que determinaria o estatuto do PRTB —ainda que o prazo observado esteja adequado à lei, frise-se. Considerando a filigrana jurídica, o registro deverá ser deferido.

O candidato Pablo Marçal, durante convenção do PRTB, em São Paulo - Rafaela Araújo - 4.ago.24/Folhapress - Rafaela Araújo/Folhapress

A segunda hipótese aventada alega abuso de poder econômico, caixa 2 e contratação indevida de influenciadores. O caso ficou conhecido no país todo porque resultou na suspensão dos perfis de Marçal.

Todavia, a ação necessitará de muita instrução, provas, contraditório e compreensão sobre essa nova ferramenta de campanha, ainda pouco regulada pela legislação eleitoral. Sem dúvida o caso não estará maduro para decisão antes da eleição em primeiro turno.

Chama a atenção, portanto, que a pressão em face da Justiça Eleitoral tenha se elevado quando a política não conseguiu dar conta do seu próprio problema. E historicamente, ao menos nos últimos anos, tem sido assim. Muitos daqueles que reclamam de excessos do STF são os mesmos que, derrotados em questões políticas, buscam as saias do Judiciário.

E não é diferente no caso da eleição paulistana. Quem deseja barrar Pablo Marçal por não estar de acordo com sua estratégia de campanha, seus cortes e influenciadores, seu comportamento nos debates, o posicionamento nas redes sociais ou mesmo por desafiar um sistema estabelecido há muito, pretende repassar à Justiça o ônus de resolvê-lo. Fácil, não?

Na prática, caso a Justiça Eleitoral decida assumir mais esse papel de desgaste, Marçal poderá nem sequer chegar aos 45 minutos do segundo tempo —ou, mesmo campeão, não levantar a taça. E isso por meio de um VAR eleitoral entrando em campo já, dando um cartão vermelho àquele que arriscou jogar com uma tática mais ousada.

Espera-se, contudo, que o árbitro da partida, a Justiça Eleitoral, deixe o jogo chegar ao seu final, de forma que a decisão caiba ao eleitor preponderantemente. Que Pablo Marçal possa estar nas urnas em 6 de outubro, considerando a orientação prevalente do TSE: "Vigora, na esfera peculiar do direito eleitoral, o princípio do ‘in dubio pro sufrágio’, segundo o qual a expressão do voto popular e a máxima preservação da capacidade eleitoral passiva merecem ser prioritariamente tuteladas pelo Poder Judiciário".

E, nunca é demais lembrar, ainda há Constituição no Brasil; logo, ninguém será culpado até decisão final condenatória (art. 5º, LVII). Nunca antes disso. Preferencialmente, não antes das eleições.

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