Descrição de chapéu Eleições 2018

'Temos um psicopata violento que pode virar presidente', diz Lindbergh

Senador petista credita derrota de sua campanha à onda bolsonarista

Rio de Janeiro

"Eu votei no senhor!", anuncia a risonha garçonete de um café no aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro. Do outro lado da mesa, o senador Lindbergh Farias (PT) ri e agradece. "Obrigado, viu?"

A atendente está entre as 1,4 milhão de pessoas que votaram no petista para o Senado. Lindbergh, no entanto, não foi reeleito —amargou o quarto lugar na corrida, que teve como vitoriosos Flávio Bolsonaro (PSL) e Arolde de Oliveira (PSD).

Lindbergh Farias durante entrevista à Folha, em janeiro - Zo Guimaraes/Folhapress
 

O petista credita a derrota à exclusão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) da corrida presidencial ("Haddad não conseguiu me puxar"), a uma "boca de urna digital gigantesca com dinheiro de caixa dois" e à onda bolsonarista que tomou conta do país.

Sobre Jair Bolsonaro (PSL), Lindbergh é enfático: "é um psicopata".

 

Sua derrota na corrida ao Senado, assim como a de Dilma Rousseff em Minas Gerais e a de Eduardo Suplicy em São Paulo, é o símbolo de uma falência institucional do PT?

Não. Acho que foi fruto dessa onda do [Jair] Bolsonaro na reta final, e acho que a Dilma foi muito prejudicada pela questão de uma boca de urna digital gigantesca com dinheiro de caixa dois, que até agora o TSE não tomou nenhuma providência.
 
No Rio de Janeiro, Bolsonaro fechou com 60% dos votos válidos no primeiro turno. O que houve foi uma migração de eleitores do Lula para o Bolsonaro. A candidatura do [Fernando] Haddad aqui foi até certo ponto. Teve menos votos do que eu. Acho que faltou um discurso mais firme nosso, de demarcação, mostrando que ele votou contra os trabalhadores. O maior desafio para o segundo turno é reconquistar uma parte desse eleitorado lulista. Lula era uma coisa muito clara, o cara confiava muito que ali iria ter mudança. Quando tiraram o Lula, uma parte disse "ah, quer saber, vou votar no Bolsonaro".

A derrota surpreendeu o senhor?

Eu talvez tenha subestimado a saída do Lula. O Haddad não me puxou, teve essa migração de votos do eleitor do Lula para Bolsonaro. A saída do Lula do jogo me prejudicou muito, eu era muito identificado a Lula. O que deu a vitória ao Flávio Bolsonaro e ao Arolde de Oliveira foi o Jair Bolsonaro ter 60% dos votos. Analisando pelos resultados, seria uma vitoria impossível.
 
Na prática, quão autoritário o senhor imagina que seria o governo de Bolsonaro?
 
Tem gente que defende a ditadura militar e fala do [Ernesto] Geisel, do [Emílio] Médici. Ele fala em [Carlos Alberto] Brilhante Ustra, o torturador. No sábado, o filho dele aparece com aquela declaração, falando do STF. Depois daquilo teve um ato na avenida Paulista, no domingo. O que era de se esperar? Moderação. Até porque estava liderando as pesquisas. Ele [Bolsonaro] faz um discurso de um candidato a ditador. Por que ele fez isso? Para dizer "olha, as pessoas votaram sabendo o que eu estava falando". Para legitimar nos votos o que ele quer fazer.
 
Ele ameaça a Folha de S.Paulo. Nunca vi uma ameaça tão aberta. "Imprensa livre, parabéns. Imprensa vendida, meus pêsames". Quem decide se a imprensa é livre ou vendida? É o Bolsonaro? Qual o problema de uma declaração como essa? Quando ele fala da Folha daquele jeito, libera a turma dele de forma organizada a ameaçar jornalistas.

Eu pedi proteção à Polícia Federal. Isso é um escândalo internacional em qualquer país do mundo, a pessoa dizer que seu oponente vai ser preso. Não se fala muito em Venezuela? Nem [Nicolás] Maduro falou "vou prender um adversário".
 
Ele [Bolsonaro] só sobrevive com o discurso do inimigo interno, da eliminação do adversário. Ele é um psicopata. O que caracteriza o fascismo, em um primeiro momento, é a violência de grupos paramilitares. Vai aumentar a violência contra LGBTs, o genocídio da juventude nas favelas, a violência no campo, morte de índio, de sem-terra. Ele está dizendo tudo. Tem gente que acha que, apesar de estar dizendo, não vai fazer. Baseado em quê? Temos um psicopata violento que pode virar Presidente da República.
 
Ele tem convicção ideológica dessas loucuras. Ele acredita nisso, nessas barbaridades. É o motivo da vida dele. A gente pode dizer tudo dele, menos que está mentindo, e que não tem convicções próprias.

Será possível derrotá-lo?
 
Acho que ainda dá tempo. Na pesquisa do Ibope houve uma diminuição da rejeição. A rejeição numa eleição de segundo turno é muito importante. É possível porque a nossa turma foi para a rua com muita vontade agora, um movimento vira voto, que não é do PT, é de muita gente da sociedade. As pessoas estão entendendo que uma vitória do Bolsonaro pode significar a instalação de uma ditadura no país.
 
O PT, e a esquerda em geral, tiveram responsabilidade sobre a ascensão do Bolsonaro?
 
Acho que o papel maior não foi nosso. Eu fiz um discurso em 2015 na tribuna do plenário, em que olhava para senadores do PSDB [e dizia]: "vocês estão criando a extrema-direita no país com força, porque vocês estão indo para as passeatas contra Dilma com gente que defende intervenção militar e não estão dizendo nada". 

A criação de Bolsonaro é fruto daquela política do golpe, da covardia de certos setores que não demarcaram campo com eles, e de uma campanha de criminalização da política, feita pela Rede Globo, em especial, e setores do Judiciário.
 
As manifestações de 2013 foram a gênese dos eventos políticos posteriores?

Não tenho dúvida. A história vai ter que mostrar o que está por trás disso. Acho que tem muito financiamento internacional de extrema-direita norte-americana. 

Depois, em 2014, com a vitória da Dilma, não aceitaram o resultado, voltou o mesmo movimento das ruas e essa mesma turma está agora com Bolsonaro. A extrema-direita norte-americana está elegendo um presidente aqui. 

Vamos ter um alinhamento tao automático que nem na época da ditadura militar [houve]. Eles não sobrevivem sem o discurso de guerra interna, que somos nós, os vermelhos, e acho que vão tentar fazer movimentação na fronteira com a Venezuela.

Vão tentar criar o inimigo externo e o inimigo interno para distrair o povo e aprovar um programa econômico ultra neoliberal, que não pode ser aplicado na democracia. Ninguém consegue aprovar o que está na cabeça do Paulo Guedes pela democracia. 
 
Faltou carisma a Haddad?

O Haddad pessoalmente está se saindo muito bem, vai bem em todas as entrevistas, nos discursos. É que, de fato, houve um fenômeno social, construído há muito tempo, que acho que nós todos podemos ter subestimado. Passou principalmente pela rede orgânica dele [Bolsonaro].

Ele criou esses 10% de militantes muito aguerridos. No primeiro momento, o grande personagem foi Lula. Quando tiraram o Lula, a figura que surge é Bolsonaro.

O PT errou ao não abrir mão da cabeça de chapa?
 
Se tem um erro de todos os setores da esquerda, foi o seguinte: ninguém achava lá atrás que o Bolsonaro seria Presidente da República. A tese era o contrário, Bolsonaro era o candidato a ser derrotado por todos no segundo turno. Agora, é claro que se a gente soubesse do resultado lá na frente poderíamos ter construído outras estratégias. Acho que o problema central dessas eleições não é o antipetismo. Sempre existiu. Quando o Lula era candidato, tinha possibilidade de vencer no primeiro turno. Acho que é mais grave o antissistema.
 
Mas Ciro Gomes (PDT), por exemplo, tinha menos rejeição que Haddad.
 
Sempre fui um cara que tentei defender a unidade da esquerda total. Eu mesmo procurei várias vezes, tentei falar com o Ciro. Acho que teve uma opção do Ciro também de não colar muito com o PT. Em algum momento achou que poderia não ser bom para a candidatura dele. Espero que nessa reta final ele apareça aqui. Eu acho que ele vai aparecer pedindo voto porque é uma ajuda importante, ele tem muito voto.

Espero que dê a contribuição porque não estamos num processo eleitoral normal. Não é mais uma eleição, eu não sei se tem 2022. Acho que a gente pode estar entrando num negócio pior que 1964, legitimado pelo voto popular.

A preocupação que a gente tem também é física. Eu já sofri várias agressões, não fico falando assim... Mas uma vez fui para Porto Alegre, estou no banheiro, um cara diz "Lindbergh!", grita "Bolsonaro!", me dá um murro... Me atraquei com o cara no banheiro. Eu não tenho proteção policial, pedi agora. 

O problema do Bolsonaro é que quando ele faz esse discurso, coloca o nome de quem considera inimigos ali à vista. Tem grupos paramilitares já com o Bolsonaro. Aqui no Rio toda milícia é Bolsonaro. Quem matou Marielle [Franco]? Outros podem morrer?

Estou com medo da violência no domingo. Peço ao pessoal que não saiam das ruas, não podemos aceitar intimidação. Domingo é um dia que espero que exista algum plano por parte das forças de segurança do país. Esse cara é um inconsequente. Se fosse alguém razoável, pediria para o pessoal dele ficar em casa, mas se alimenta do discurso do ódio, da intolerância.
 
O senhor é investigado em inquérito, com base nas delações da Odebrecht, que apura se a empreiteira fez repasses por meio de caixa dois para suas campanhas de 2008 e 2010. Essa investigação preocupa o senhor neste momento?
 
Nenhuma preocupação. Todo inquérito meu foi arquivado, e vai ser novamente. Vivo super apertado, com minhas contas ali. Não é nem processo, é um inquérito inicial. Não tem nem denúncia.

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